Juíza volta a mandar instrução de parte da Operação Marquês para Ivo Rosa

Enquanto decorre este pingue-pongue entre juízes, alguns crimes caminham para a prescrição. Falsificação de documento por causa do alegado arrendamento fictício da casa de Paris prescreve já em Agosto

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Juiz Ivo Rosa no Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa, em 2018, pouco antes de iniciar a fase de instrução da Operação Marquês MANUEL DE ALMEIDA / LUSA
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O regresso ao trabalho do juiz Ivo Rosa fez com que a sua sucessora no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), a juíza Sofia Marinho Pires, tenha decidido devolver a instrução de uma parte do processo da Operação Marquês àquele colega, que entretanto foi promovido ao Tribunal de Relação de Lisboa. Enquanto decorre este pingue-pongue entre juízes, alguns crimes caminham para a prescrição.

Como o PÚBLICO noticiou em Abril, o crime de falsificação de documento por causa do alegado arrendamento fictício da casa de Paris, onde o ex-primeiro-ministro José Sócrates viveu entre Setembro de 2012 e Julho de 2013, prescreve no próximo mês. Tal só seria evitável se, até lá, houvesse uma condenação, o que é impossível.

A nova decisão da juíza Sofia Marinho Pires foi noticiada nesta quarta-feira pelo Expresso, tendo o PÚBLICO tido acesso ao mesmo despacho, com data do passado dia 15. "Tomei conhecimento [de] que o Exmo. Senhor Juiz Desembargador que proferiu a decisão instrutória, Dr. Ivo Rosa, regressou ao serviço no dia 4 de Julho, pelo que cessou o impedimento que levou à prolação do despacho [de final de Maio]", escreve a juíza antes de mandar remeter o processo para Ivo Rosa.

No início de Maio, Sofia Marinho Pires, que está colocada no lugar antes ocupado por Ivo Rosa no TCIC, recusou ser competente para dar uma nova decisão instrutória na parte da Operação Marquês que o colega mandara para julgamento e que a Relação de Lisboa anulara em Março passado.

A juíza considerou que teria de ser Ivo Rosa a dar a nova decisão instrutória, já que foi ele quem presidiu ao debate instrutório, uma espécie de alegações finais desta fase facultativa do processo penal em que se avalia se há indícios suficientes para um caso seguir para julgamento. No entanto, como Ivo Rosa estava de baixa já há algum tempo e sem previsão para regressar, o Conselho Superior da Magistratura mandou o processo novamente para as mãos de Sofia Marinho Pires. A juíza considerou que era necessário fazer um novo debate instrutório e chegou a notificar as partes para indicarem novas testemunhas que achassem necessário ouvir.

Este despacho foi agora considerado sem efeito, e Sofia Marinho Pires retoma os argumentos que inicialmente deu para recusar ser competente para dar a nova decisão instrutória. A juíza argumentara, no início de Maio, que o princípio do contraditório era basilar na fase de instrução, em particular no debate instrutório que antecede a decisão de instrução. “Nessa medida, tem de ser o juiz que presidiu ao debate instrutório e assistiu à argumentação dos sujeitos processuais sobre as questões, de facto e de direito, pertinentes para a decisão instrutória a proferir tal decisão”, sustentava.

A magistrada garantia que há “abundante jurisprudência” nesse sentido e destacava um acórdão da Relação de Guimarães de Outubro de 2023. A juíza realçava que não presidiu ao debate instrutório, nem elaborou a decisão instrutória declarada nula pela Relação de Lisboa. “Nessa medida, o juiz que proferiu a decisão é o juiz natural para prolatar nova decisão, uma vez que não foi anulado o debate instrutório realizado”, escreveu Sofia Marinho Pires. E, de seguida, notava: “Ademais, assim se assegurará a necessária celeridade processual atentos os prazos prescricionais em curso.” Ordenava, por isso, que os autos fossem apresentados a Ivo Rosa, que nessa altura já se encontrava de baixa médica.

Casa de Paris e contrato sobre tese de mestrado

Em causa nesta parte da Operação Marquês estão apenas 12 crimes pelos quais o juiz Ivo Rosa mandou julgar José Sócrates e o seu alegado testa-de-ferro, Carlos Santos Silva: cada um, por três crimes de falsificação de documento e outros três de branqueamento de capitais.

Tudo isto contribui para a expectável prescrição de pelo menos parte destes 12 crimes. Além do alegado arrendamento fictício da casa de Paris, há outros dois crimes de falsificação em risco de prescrição. Um é relativo aos contratos – simulados, na versão do Ministério Público – assinados entre o professor universitário Domingos Farinho e a mulher deste com uma empresa de Santos Silva, para o docente ajudar na redacção e revisão da tese de mestrado de Sócrates. Este ilícito prescreve em Abril do próximo ano.

O outro crime de falsificação dirá respeito a dois contratos fictícios assinados com a mesma firma, a RMF Consulting, um com o autor do blogue Câmara Corporativa, que prestaria serviços ao ex-primeiro-ministro, e outro com o filho deste, um ilícito que prescreve em Julho do próximo ano.

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