Os direitos humanos e as futuras gerações

O Conselho da Europa reafirma a importância de se explorar o potencial e os limites da recente jurisprudência sobre o clima, para desenvolver padrões ambientais menos antropocêntricos.

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O Conselho da Europa adotou uma importante resolução, que esperamos ter impacto na ação dos 46 Estados-membros. A resolução foi proposta e aprovada na sequência da apreciação de um memorando, do qual fui relator, sobre a salvaguarda dos direitos humanos para as futuras gerações. Votada na sessão de junho da Assembleia Parlamentar, em Estrasburgo, a resolução será com certeza lida pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos esperando que, pelo menos, provoque uma reflexão.

O relatório faz um balanço dos progressos e das limitações resultantes da recente jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos sobre questões climáticas. É necessário, agora mais do que nunca, continuar a refletir sobre os esforços a serem feitos para avançar nos padrões existentes, a fim de salvaguardar as gerações futuras e a sustentabilidade ambiental futura. Este documento apela aos Estados-membros para que aproveitem a dinâmica da Declaração de Reiquiavique, para avançar na salvaguarda direitos humanos para as gerações futuras. O Conselho da Europa reconheceu, nessa declaração, essa prioridade, devendo demonstrar uma liderança e um forte compromisso com este imperativo, apresentando um discurso que reafirma a importância de se respeitar os direitos das gerações futuras e de explorar o potencial e os limites da recente jurisprudência sobre o clima, para desenvolver padrões ambientais menos antropocêntricos.

Todas as decisões e ações políticas que tomamos hoje terão impacto duradouro nas gerações futuras e na possibilidade de exercício dos seus direitos humanos. O mundo enfrenta atualmente crises múltiplas e interligadas que ameaçam esses direitos. É, portanto, importante que os Estados adotem uma abordagem integrada, que tenham em consideração as preocupações ambientais, juntamente com a manutenção das oportunidades de desenvolvimento económico, social e cultural. A equidade e a solidariedade intergeracional deve ser um princípio orientador, incluindo na consideração dos direitos a usufruir pelas gerações ainda não nascidas – as que herdarão o planeta depois de nós.

O relatório mostra, neste campo, com base em trabalho já existente, a importância dos Princípios de Maastricht sobre os Direitos Humanos das Gerações Futuras. Os Princípios de Maastricht são um conjunto de diretrizes que pretendem esclarecer como o direito internacional dos direitos humanos se aplica às gerações futuras. Devem orientar os decisores na resposta a questões fundamentais, sobre como integrar eficazmente os direitos humanos das gerações futuras em leis e em declarações concretas, para que os esses direitos sejam respeitados, protegidos e defendidos com base na arquitetura jurídica desenvolvida nos últimos 70 anos.

Os Princípios afirmam que não há limitação ratione temporae aos direitos humanos, incluindo o direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável. Sendo plenamente aplicáveis às gerações futuras, já abrangidas pelo corpo de legislação existente, em matéria de direitos humanos. Consequentemente, respeitar, proteger e defender os direitos das gerações futuras é simplesmente uma questão de defender um conceito fundamental da legislação em matéria de direitos humanos: igualdade e não discriminação.

Embora vários tratados internacionais e acordos multilaterais concedam direitos às gerações atuais e futuras, no que diz respeito à sustentabilidade e aos direitos económicos, sociais e culturais, é necessário um compromisso mais forte por parte dos Estados para os cumprir. Os tribunais têm historicamente desempenhado um papel significativo na interpretação progressista dos direitos humanos e no lançamento das bases para muitos dos direitos que desfrutamos hoje. Alguns dos litígios relativos às gerações futuras já influenciaram, até certo ponto, as ações políticas a nível nacional e multilateral.

Dos pontos deliberativos da resolução destacamos o incentivo para que os Estados-membros possam promover a rápida assinatura e ratificação da Convenção-quadro do Conselho da Europa sobre Inteligência Artificial, Direitos Humanos, Democracia e Estado de Direito, incentivando-os a maximizar o potencial de reconhecer a plena aplicabilidade dos princípios e obrigações nele estabelecidos às atividades de atores privados. Este novo instrumento ainda é mais relevante no momento em que a União Europeia dá os últimos passos para a publicação de um regulamento europeu sobre o uso da inteligência artificial, dando força jurídica diretamente aplicável aos Estados, cidadãos e empresas a um instrumento com uma forte base ética.

É encorajador que o Conselho da Europa tenha reconhecido a necessidade de avançar na salvaguarda dos direitos humanos para as gerações futuras, terminando assim, da minha parte, dois anos de trabalho neste relatório e no projeto de resolução.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico