Da Grécia com precisão, o Curtas revela-nos Yorgos Zois

O festival de Vila do Conde inicia nesta quarta-feira quatro dias de destaque a este jovem cineasta grego, com a apresentação quase integral das suas curtas e longas.

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Arcadia, filme de Yorgos Zois de 2024 cortesia curtas vila do conde
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Third Kind, filme de 2018 cortesia curtas vila do conde
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Por conveniência — a mesma que leva à invenção de gavetas, etiquetas e classificações — todos os jovens cineastas gregos que têm sido revelados nos últimos anos são identificados com uma nova vaga de cinema singular de terras helénicas a que os anglófilos chamam de "Greek weird wave". Culpa de Yorgos Lanthimos e do seu Canino, ponto zero da descoberta de um grupo de cineastas cujos pontos comuns pareciam ser o formalismo visual e a bizarria narrativa, criadores de uma obra resolutamente contemporânea por oposição ao academismo que identificávamos até então com Theo Angelopoulos ou Michael Cacoyannis.

Com o tempo, percebemos que a "Greek weird wave" não era forçosamente monolítica — se Lanthimos nunca cedeu nas suas alegorias entomológicas, mesmo quando subiu ao patamar de elencos internacionais e filmagens em Hollywood, outros cineastas seguiram caminhos mais ou menos próprios ao abrigo dessa busca de uma nova maneira de fazer cinema num dos países mais afectados pelas crises económicas do início do século XXI. Athina Rachel Tsangari (Attenberg, Chevalier) ou Jacqueline Lentzou (Perguntem à Lua) "furaram" a distribuição portuguesa, mas Maria Exarchou, Syllas Tzoumerkas ou Babis Makridis ficaram-se por passagens por festivais.

O Curtas Vila do Conde tem, no entanto, estado atento. Para lá de Jacqueline Lentzou, uma das novas vozes que defendeu nos últimos anos, o festival revelou também entre nós Konstantina Kotzamani (que venceu em 2016 por Limbo) e, agora, destaca o cinema de Yorgos Zois, com um programa na secção New Voices que apresenta a quase totalidade da obra filmada do grego. Começa esta quarta-feira (sempre Teatro Municipal, 19h30) com as quatro curtas que fizeram o seu nome — Casus Belli (2010), Out of Frame (2012), Eighth Continent (2017) e Third Kind (2018), seguindo para as suas duas longas — Interruption (2015, sexta-feira, às 19h30), cuja ideia de uma produção teatral interrompida por uma acção terrorista parecia antecipar de alguns anos a premissa de Yannick, de Quentin Dupieux, e Arcadia (2024, quinta-feira, às 21h15), uma das melhores surpresas da edição 2024 de Berlim.

Não por acaso, Zois e Konstantina Kotzamani cruzam os seus caminhos enquanto conterrâneos e contemporâneos: exemplo, ela é co-argumentista de Arcadia, ele produziu a curta dela Washingtonia (2013), incluída na "carta branca" que o festival lhe propõe (sábado, às 21h15) — um filme que co-produziu "enquanto jovem cineasta, sem auto-censura, cheio de solidariedade, com um orçamento mínimo, que celebra a criatividade da realizadora e o espírito de equipa", como aponta o realizador num depoimento para o catálogo do festival. Ao lado de Washingtonia, serão exibidos Le Saboteur (2022), de Ansii Kasitonni, Cherries (2022), de Vytautas Katkus, e Aqueronte (2023), de Manuel Muñoz Rivas, filmes que reflectem a sua sensibilidade enquanto alguém que procura ainda acreditar que o cinema pode abrir novas portas.

Curioso, no mínimo, para quem começou por estudar engenharia aplicada e depois cursou cinema na Alemanha: quem olhar para as parábolas que Zois desenha reconhecerá algo de precisão de construção (que também pode vir dos estudos berlinenses, ou não fosse a Academia de Cinema e Televisão a base da "escola de Berlim") a par da gravidade conceptual que perpassa na nova geração grega. Mas há mais alguma coisa a trabalhar no cinema do grego, e quem vir Arcadia descobrirá como todas estas parábolas mais ou menos distantes são apenas maneiras de explorar o que é sentir num mundo cada vez mais povoado de fantasmas.

Ajudado por dois actores que nos habituámos a ver no cinema de autor helénico, a divina Angeliki Papoulia e o sólido Vangelis Mourikis, Zois procura a ponte entre passado e presente, história e modernidade, através da humanidade que é a única coisa que nos parece restar num mundo tão conturbado e tão exigente como o nosso. Se nisso não é diferente do questionamento permanente do novo cinema grego sobre o choque entre as expectativas da sociedade e a identidade individual, é o modo como o faz que o distingue, tornando esta segunda longa numa súmula e cristalização do seu olhar sobre o nosso mundo, menos escarninho e mais compassivo. Sente-se, efectivamente, uma evolução no olhar do cineasta grego ao longo dos filmes, e é raro podermos observar isso de uma só assentada como o Curtas nos propõe este ano; e nem é sequer preciso gostar de Yorgos Lanthimos para nos deixarmos embalar por Yorgos Zois.

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