Associações ambientalistas contra abertura das Selvagens à pesca de atum e gaiado

No entender da associação ambientalista, a pesca não é “compatível com o objectivo de conservação da natureza, que é o objectivo primordial das áreas marinhas protegidas”.

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"Estamos a andar para trás", considera associação Zero sobre a possibilidade de se abrir excepções como a captura de atum nas Ilhas Selvagens Carlos Lopes/ARQUIVO
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Sete organizações não-governamentais de ambiente (ONGA) manifestam esta quinta-feira a sua "profunda preocupação e desaprovação" perante a possível abertura da Reserva Natural das Ilhas Selvagens, na Madeira, à pesca do atum.

O comunicado enviado pelas organizações Associação Natureza Portugal (ANP/WWF), Geota, Liga para a Protecção da Natureza (LPN), Sciaena, SOA Ocean Devotion Madeira, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) e Zero surge depois de o Governo da Madeira ter anunciado que está a estudar se a captura de atum e gaiado coloca em causa, ou não, a protecção integral da Área Marinha Protegida (AMP) das Selvagens.

As associações consideram que a pesca do atum não deve ser permitida nas Ilhas Selvagens, a maior área marinha com protecção integral do Atlântico Norte, argumentando que "não só comprometeria a integridade ambiental da reserva, mas também colocaria em risco anos de esforços de conservação dos habitats de inúmeras espécies marinhas".

Joana Soares, gestora de projectos da Zero, explica que a pesca não é "compatível com o objectivo de conservação da natureza, que é o objectivo primordial das áreas marinhas protegidas". "Não deve haver excepções naquilo que está definido para áreas marinhas com protecção estrita. A pesca não deve ser uma actividade permitida nessas áreas, ainda que com estudos científicos", afirmou Joana Soares, em declarações à agência Lusa.

"Nós defendemos que não podemos abrir espaço a excepções, é uma área que deve ser considerada no take e, nesse sentido, nós devemos ser mesmo intransigentes e rigorosos, portanto, proteger de uma forma muito controlada as actividades que lá são desenvolvidas", reforçou.

Joana Soares salientou ainda que a associação ambientalista tem defendido junto da secretária de Estado do Mar, com quem já se reuniu, que "é de extrema prioridade" alcançar, até 2030, 30% de áreas marinhas protegidas, das quais 10% devem ter protecção integral, conforme o compromisso assumido por Portugal.

A responsável da Zero referiu que Portugal tem "pouco mais de 8% de áreas marinhas protegidas", que "não funcionam bem", insistindo que permitir excepções como a captura de atum nas Ilhas Selvagens constitui "um retrocesso".

"Estamos a andar para trás. Em vez de colocarmos as áreas protegidas a funcionar como deve ser, com mecanismos rigorosos de controlo de monitorização, estamos a abrir espaço a actividades que não são compatíveis com aquilo que nós temos vindo a reivindicar", reiterou.

Negociações regionais

Na quarta-feira, o presidente do Governo da Madeira, Miguel Albuquerque (PSD), indicou que está a ser elaborado um estudo científico para aferir se a captura de atum e gaiado nas Ilhas Selvagens coloca em causa o estatuto de protecção integral daquela reserva, referindo que a decisão de permitir a pesca naquela zona não está tomada.

Na segunda-feira, o Chega/Madeira disse que a abertura das Ilhas Selvagens à pesca do atum iria ser assumida pelo executivo insular, referindo que os detalhes da proposta legislativa que será apresentada no parlamento madeirense serão ultimados na próxima semana.

"O partido Chega está em vias de garantir junto do Governo Regional a abertura das águas marítimas em torno das Ilhas Selvagens à pesca do atum e do gaiado. A medida é uma das várias que estão a ser negociadas pelo partido no âmbito das discussões do orçamento regional, havendo já um entendimento de princípio entre o Chega e o governo de que a mesma será assumida", lia-se numa nota enviada às redacções.

Em Março de 2022, as Selvagens passaram a ser a maior área marinha com protecção integral do Atlântico Norte, depois de o executivo madeirense (PSD/CDS-PP) ter decretado o seu alargamento.

A reserva foi ampliada de 92 para 2677 quilómetros quadrados, numa área de 12 milhas náuticas em redor das ilhas, na qual é proibida a pesca e qualquer outra actividade extractiva.

O Chega entregou recentemente um diploma no parlamento regional para que seja permitida a pesca do atum naquelas ilhas, através da alteração do regime de protecção de parte da Área Marinha da Reserva Natural das Ilhas Selvagens, que na anterior legislatura contou com os votos contra de PSD, CDS-PP e PAN, a abstenção de PS, PCP e BE, e o voto a favor de Chega, JPP e IL.

As Selvagens, um subarquipélago da Madeira localizado a cerca de 300 quilómetros a sul do Funchal, constituem o território mais a sul de Portugal, tendo sido classificadas como reserva natural em 1971.