Há mais de um ano que estamos a viver num planeta que bate recordes de temperatura

Esta fase de temperaturas extremas pode terminar, diz o cientista Carlo Buontempo, mas vamos continuar a ver recordes a cair, à medida que o clima da terra se altera e aquece.

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Um homem refresca-se numa fonte num dia quente em Moscovo YURI KOCHETKOV/EPA
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Já nem parece novidade, porque foi assim nos últimos 13 meses: o Junho que passou foi o mais quente desde que se fazem registos. A temperatura média à superfície do planeta esteve 1,5 graus Celsius acima da média estimada entre 1850-1900, o período de referência pré-industrial, antes de a humanidade começar a lançar em força gases com efeito de estufa para a atmosfera.

“Isto já é mais do que uma curiosidade estatística. Mostra uma mudança grande e continuada no clima”, afirmou Carlo Buontempo, director do Serviço de Alterações Climáticas (C3S) do Copérnico, o programa de observação da Terra da União Europeia, que divulgou estes dados.

“Junho foi o 13.º mês consecutivo de temperaturas globais que batem recordes, e o 12.º seguido em que a temperatura média esteve mais do que 1,5 graus acima dos valores pré-industriais”, sintetizou Buontempo. Mais concretamente, a temperatura média esteve 1,65 graus acima da que se estimava vigorar antes da Revolução Industrial

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Mencionados especificamente pelo Acordo de Paris, estes 1,5 graus são considerados o limite de segurança, a partir dos quais as alterações climáticas podem tornar-se irreversíveis e perigosas.

“Esta fase específica de extremos pode terminar, mas vamos continuar a ver recordes a cair, à medida que o clima aquece. Isto é inevitável, a não ser que paremos de acrescentar gases com efeito de estufa à atmosfera e aos oceanos”, acrescentou Buontempo. Embora seja atípico, não é inédito este período de recordes de temperatura; em 2015/2016 houve uma fase semelhante, frisa o Copérnico.

A concentração na atmosfera de dióxido de carbono (CO2), o principal gás com efeito de estufa, era em 2023 de 419 partes por milhão. Antes da Revolução Industrial, esse valor não ultrapassaria 280 partes por milhão. Desde 2010, a concentração está a crescer ao ritmo de 2,4 partes por milhão ao ano.

Em resultado desta alteração na composição da atmosfera da Terra, o manto protector do planeta está a espessar-se e a concentrar cada vez mais o calor do Sol. Os habitantes da Terra sofrem as consequências desse aumento da temperatura, que causa alterações nos processos geofísicos do planeta, por exemplo, na meteorologia.

Segundo os dados do Copérnico, em Junho de 2024, a temperatura média à superfície do planeta foi de 16,66 graus Celsius. Isto são 0,67 graus acima da média para Junho do período 1991-2020, e 0,14 graus mais do que o recorde anterior, verificado em Junho de 2023, especifica um comunicado do C3S.

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Europa a quente e frio

A Europa é o continente que está a aquecer mais depressa – a temperatura média já subiu 2,3 graus, em relação aos valores pré-industriais. E o mês de Junho que passou foi o segundo mais quente desde que há registos. No entanto, o aumento não é homogéneo: a Europa do Sudeste e a Turquia foi onde esteve mais calor. Irlanda, Reino Unido, Finlândia e Escandinávia, o Sul de Itália e o Sudeste europeu, sobretudo em torno do Mar Negro, tiveram condições mais secas do que o habitual

No Ocidente do continente, onde está Portugal, bem como na Islândia e no Noroeste da Rússia, as temperaturas estiveram na média ou abaixo dos valores normais. Junho foi também mais húmido do que o habitual nestas regiões mais frias, com precipitações fortes, que deram origem a inundações em algumas regiões da Alemanha, Itália, França e Suíça.

Fora da Europa, as temperaturas estiveram acima do normal no Leste do Canadá, Oeste dos Estados Unidos e México, Brasil, Norte da Sibéria, Médio Oriente, Norte de África e Antárctida Ocidental. A América do Norte, várias regiões da Ásia e a maior parte da América do Sul tiveram condições mais secas, e registaram-se incêndios florestais graves no Nordeste da Rússia e no centro da América do Sul.

Uma série de tempestades marcaram também Junho de 2024, incluindo o furação Beryl, o primeiro furacão da temporada atlântica de 2024, que atingiu a categoria mais elevada da escala de cinco níveis Saffir-Simpson. É o mais precoce furacão com tamanha intensidade de que há registos, e prenuncia uma época de tempestades no Atlântico que os cientistas temem que seja muito intensa.

Intimamente relacionada com a força das tempestades, a temperatura à superfície da água do mar média em Junho atingiu 20,85% – o mais alto de sempre para este mês. Mas, no oceano Pacífico, ao nível do Equador, a água do mar arrefeceu, indicando que se está a desenvolver o padrão meteorológico La Niña.

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Na Antárctida, a extensão dos gelos reduziu-se 12%, em relação à média. Esta é a segunda mais baixa área de gelo para o mês de Junho desde que há registos de satélite. O recorde absoluto é o do ano passado, em que houve uma redução de 16%. No Árctico, onde a temperatura em terra já aumentou 3,3 graus em relação aos valores pré-industriais, a redução do gelo foi de 3%, em linha com os valores observados para Junho desde 2010.

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