Cuba enfrenta uma “economia de guerra” com controlo férreo de despesas e preços

Governo de Díaz-Canel lança pacote de medidas que passam pela centralização de decisões e a “maior contenção possível”. Presidente está preocupado com impacto social da crise económica.

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O Governo de Havana quer evitar novos protestos como os de Julho de 2021 MARIA ALEJANDRA CARDONA / REUTERS
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O Governo de Cuba declarou que o país se encontra numa situação de “economia de guerra” e anunciou um pacote de medidas que incluem uma política única de preços no sector público e privado, “a maior contenção possível de todas as despesas correntes”, a paralisação de investimentos não urgentes, cortes nas provisões orçamentais, a centralização de decisões sobre despesa, tudo com vista a “corrigir distorções e relançar a economia durante 2024”.

A decisão do Conselho de Ministros de domingo passado foi noticiada pelo jornal oficial Granma, que cita o primeiro-ministro Manuel Marrero Cruz para descrever a situação em Cuba como uma “economia de guerra” e sublinhar que neste cenário “é quando o planeamento é mais necessário e o controlo é mais necessário”.

A viver uma crise económica profunda desde a pandemia e que se agravou após a invasão da Ucrânia pela Rússia (o seu principal aliado económico), o país terminou 2023 com uma inflação de 30%, uma economia contraída em 2%, uma desvalorização da moeda de mais de 50% face ao dólar e ao euro e um défice previsto para 2024 equivalente a 18,5% do PIB.

Segundo o Granma, o ministro da Economia e Planeamento, Joaquín Alonso Vázquez, falou "sobre o comportamento da economia no final de 2023, que mostra uma diminuição em relação ao ano anterior, e a estimativa para o primeiro semestre de 2024", mas sem avançar qualquer número ou calendário de aplicação das medidas.

O Presidente Miguel Díaz-Canel descreveu as medidas como "muito importantes", não só a nível económico mas também social, referindo-se ao impacto das dificuldades económicas como os atrasos na entrega da cesta familiar regulamentada, a instabilidade no sistema eléctrico nacional que leva a frequentes apagões ou ao aumento excessivo dos preços, considerando “uma questão totalmente especulativa”.

“Todos nós estamos aqui para salvar a Revolução (cubana) e salvar o socialismo”, disse Díaz-Canel na reunião. Em diversos meios de comunicação têm surgido notícias que dão conta de que produtos como frango, azeite, salsicha, leite em pó, massas e detergentes terão preços máximos de venda nas chamadas MPME (micro, pequenas e médias empresas), o que aliviaria o descontentamento com os altos e mutáveis preços destes produtos no sector privado.

O descontentamento social é um dos maiores receios do Governo de Díaz-Canel, que ainda tem na memória os levantamentos de 2021, que começaram a 11 de Julho e levaram para as ruas milhares de pessoas em protesto. No mesmo dia do Conselho de Ministros onde o novo pacote foi aprovado, o site de notícias Cuballama escrevia que “o contexto actual em Cuba é de extrema tensão, onde as acções do Governo reflectem um medo crescente da possibilidade real de uma insurreição”.

“Recentemente, o regime cubano elevou o nível de risco e estabeleceu guardas armadas em estruturas-chave das Forças Armadas Revolucionárias (FAR), o que demonstra uma estratégia para reforçar as suas capacidades de controlo e repressão em caso de possíveis motins ou protestos, escrevia o Cuballama Notícias, referindo a “compra milionária de armas e equipamentos de protecção para as forças militares do regime, semelhantes aos utilizados pelas forças repressivas de outros países, com escudos feitos de material de última geração e lançadores de spray de pimenta a 40 metros”.

Em causa está uma decisão do Conselho de Defesa Nacional de 15 de Abril deste ano, que reforça as estruturas militares de segurança por todo o país, dando-lhes relativa autonomia ao mesmo tempo que afina a coordenação entre elas, de forma a assegurar a paz e responder a situações excepcionais. Antes de declarar a economia de guerra, o Governo já se armava contra a incerteza.

“Todas estas medidas surgem num contexto de crescente descontentamento popular e crise geral no país, que tem aumentado roubos, crimes e assassinatos; com relatos crescentes de pessoas vagueando pelas ruas armadas com facas e facões, que inclusive se posicionaram, bastante contrariadas, diante de órgãos estatais”, escrevia o Cuballama.

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