Mais de sete mil pessoas assinam petição contra a contenção física dos idosos
Petição lançada pela enfermeira Carmen Garcia defende que “prática arcaica” se generalizou nos lares e hospitais, dada a falta de pessoal nas instituições e meios técnicos adequados.
Lançada a 20 de Junho, a petição “Proibição da prática de contenção física a idosos” já conta com mais de 7100 assinaturas. O objectivo é levar a matéria à Assembleia da República e acabar com a “prática arcaica”, como se lê no texto da petição, de amarrar os membros superiores e inferiores de idosos que estão internados em lares ou hospitais.
Criada pela enfermeira e autora do blogue A Mãe Imperfeita, Carmen Garcia, a petição visa “a proibição da prática de contenção física a idosos excepto em situações extremas e depois de esgotadas todas as alternativas que devem ficar devidamente registadas”.
Ao PÚBLICO, Carmen Garcia nota que “não há números” sobre esta prática, porque as “pessoas perderam o sentido crítico, é generalizada”. Apontando à “falta de recursos humanos e materiais”, a enfermeira insiste que “não podemos continuar a pagar com a dignidade dos idosos a falta de pessoas”.
Carmen Garcia refere ainda que existe uma recomendação da Direcção-Geral da Saúde para que a contenção física seja reportada, mas “ninguém faz isso”. “A DGS tem de tornar o reporte obrigatório”, frisa.
Lembrando que a ONU defende que esta prática atenta contra os direitos dos idosos, a enfermeira sustenta que “a contenção química, não sendo ideal, é preferível à física”. A contenção física pode ser ponderada quando a pessoa “ponha a própria vida em risco ou quando tudo o resto falhou”, mas, mesmo nessas ocasiões, Carmen Garcia defende que “não é necessária”. Prova disso são os países que a criminalizam e as instituições que funcionam sem a utilizar, sustenta.
Carmen Garcia, também cronista do PÚBLICO, escreve no seu artigo deste domingo que o argumento de que os idosos são amarrados para seu próprio bem é “falacioso”.
“O idoso está amarrado porque não temos pessoal suficiente nas nossas instituições para garantir a vigilância e a proximidade devidas. Está amarrado porque a medicação não está bem ajustada. Está amarrado porque não dispomos de espaços físicos e meios técnicos que nos permitam garantir a sua segurança. Está amarrado porque está a pagar, com a sua dignidade, a nossa falta de recursos”, lê-se.
Nesse sentido, defende a petição, a contenção dos membros superiores e inferiores dos idosos deve ser “proibida, em qualquer circunstância”.
Na mesma crónica, intitulada “Cuidar sem amarras”, a enfermeira refere que em países como o Reino Unido, os Países Baixos e a Suécia, a contenção física é crime, sem que exista um aumento do número de quedas. Também Espanha quer fazer de 2025 o “ano da contenção zero”. Em Portugal, lamenta a autora, “o uso da contenção física foi banalizado até se tornar aceitável”.
“Prender um cão com uma corrente de 20 cm? Crime (e ainda bem!). Amarrar os braços de um idoso às grades de uma maca ou aos braços de uma cadeira? Normal”, ironiza.
A petição sublinha a importância de “todas as unidades de prestação de cuidados a idosos, sejam de saúde ou residenciais, disporem de pelo menos uma cama cota 0 para evitar quedas, de um colete de contenção adequado a cadeira/cadeirão e de uma faixa de contenção no leito que permita ao idoso mobilizar-se e alternar entre decúbitos”.
"Os raros casos em que a contenção física seja a única solução" devem implicar a “prescrição por profissional de saúde, avaliações frequentes, registos horários de evolução e jamais” ultrapassar “um período de doze horas. Da mesma forma, todos os dispositivos de contenção utilizados devem ser homologados.” Acrescenta-se ainda que “todo e qualquer tipo de contenção realizado com técnicas e materiais desadequados (ex: lençóis)” deve ser proibida.
“Temos de parar com o flagelo dentro do flagelo que é conter idosos com lençóis e outras invenções caseiras que aumentam exponencialmente o risco de incidentes”, vinca, no seu texto, Carmen Garcia.
A partir das 7500 assinaturas, qualquer petição é apreciada em plenário na Assembleia da Republica. Com menos do que isso e mais do que 2500 signatários, são discutidas apenas na comissão parlamentar competente.