Esquerda francesa descarta Mélenchon e escolherá um líder “consensual” para primeiro-ministro
Entre todos os nomes que se lançam para liderar um possível Governo da Nova Frente Popular, se esta ganhar as eleições, só um parece completamente posto de lado, o do líder da França Insubmissa.
Um casamento de conveniência não é uma história de amor. A coligação partidária da esquerda francesa, a denominada Nova Frente Popular (NFP), composta pela França Insubmissa (LFI), Os Ecologistas, o Partido Comunista (PCF) e o Partido Socialista e apoiada por outras pequenas formações políticas, está longe de ser uma aliança entre mútuos admiradores (por exemplo, um mar separa a França Insubmissa dos Socialistas, que foram poder durante anos e hoje são um pequeno partido: Anne Hidalgo teve 1,75% nas presidenciais de 2022).
A França Insubmissa é o seu trunfo e o seu calcanhar de Aquiles, com Jean-Luc Mélenchon, o líder de 73 anos, como principal alvo das críticas da extrema-direita e de Emmanuel Macron, tendo emergido mais uma vez a acusação de anti-semita nesta campanha. A dubiedade das intervenções de Mélenchon não ajudam no afastar do foco das críticas do líder d’A Frente Insubmissa, nomeadamente no que diz respeito a quem será o primeiro-ministro em caso de vitória da coligação de esquerda.
Não sendo Mélenchon, que de salvador da esquerda passou a ser visto como um lastro negativo da coligação de esquerda, poderá ser outro dos dirigentes do seu partido, como Manuel Bompard, Mathilde Panot, Clémence Guetté, Éric Coquerel ou Younous Omarjee? Será alguém das outras três principais formações? Ou de um partido mais pequeno de esquerda ou mesmo sem ligação partidária?
O que se sabe é que quando, no calor do debate, Mélenchon deixa escapar que tem “intenção de governar”, todos os outros partidos são obrigados a vir a público afirmar que isso não é assim, que o primeiro-ministro sairá de um consenso, e o próprio líder da LFI surge depois a garantir que se trata apenas de “um mal-entendido completo desde o princípio”. Na segunda-feira, na France 2, garantia: “Não sou candidato a nada.”
"Queremos uma maioria o mais alargada possível, o que significa que temos de chegar a um consenso. Vamos dialogar até chegarmos a uma solução que agrade aos quatro partidos", afirmou Marine Tondelier no princípio desta semana, citada pelo diário Sud Ouest. A líder dos Ecologistas falou em escolher uma “personalidade apaziguadora", algo que logo à partida exclui Mélenchon, que não parece contar com a capacidade de serenar ânimos entre as suas qualidades políticas.
"Não é nada contra Jean-Luc Mélenchon, mas os nossos adversários políticos estão a usar esse espantalho para minar a nossa credibilidade", acrescentou. Para que não houvesse dúvidas, Marine Tondelier disse à AFP: “[Mélenchon] não é o líder da NFP e não será primeiro-ministro.”
Na quinta-feira, aos microfones da Europe 1, Léon Deffontaines, porta-voz dos comunistas, também fez questão de garantir que a escolha da esquerda não recairá em Mélenchon: “Penso que todos os líderes dos partidos da NFP foram bastante claros: a pessoa que será primeiro-ministro, se a Frente Popular obtiver a maioria, será uma pessoa mais consensual.”
Deffontaines mencionou o nome do deputado comunista Fabien Roussel como alguém que poderia suscitar esse consenso nos quatro partidos. O nome de Lauren Berger, antigo líder da central sindical Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT), também foi sugerido, algo que o próprio já descartou: “Não é isso que eu quero. A minha vida, tal como está, mesmo a nível profissional, é uma vida que me satisfaz. Aquilo que quero é não viver num país governado pela União Nacional.”
Outro nome falado é o de François Ruffin, que em 2017 criou um pequeno partido de esquerda chamado Picardie debout! integrado na LFI, mas é um crítico de Mélenchon e enfrenta uma difícil batalha para conseguir eleger-se deputado em Soma, círculo eleitoral do Norte de França onde a RN conseguiu 44% dos votos nas europeias de 9 de Junho. Ruffin espera um “milagre”, mesmo que não seja os 61% com que foi eleito em 2022, pelo menos que dê para vencer na segunda volta.
Ruffin, que uma sondagem do Les Echos colocava como mais popular do que Mélenchon entre os eleitores de esquerda, rompeu com a direcção da LFI e com o seu líder, a quem classificou, em declarações ao canal TF1, como “um obstáculo à vitória da Frente Popular”.
No entanto, a julgar pelas mesmas sondagens, os quatro partidos terão pouco para discutir porque as intenções de voto na NFP parecem ter chegado a um planalto que não dá para alcançar a União Nacional (RN). O partido de extrema-direita de Marine Le Pen mantinha-se destacado na liderança da sondagem do Les Echos na sexta-feira e a da Franceinfo de quinta.
No barómetro do Les Echos, a RN aparecia com 37%, mais dois pontos percentuais do que há uma semana, enquanto a NFP tinha 28% das intenções de voto, exactamente o mesmo que tinha sete dias antes, e a maioria presidencial perde dois pontos percentuais e surge com 20%. Na sondagem da Franceinfo, a RN, com o apoio da franja dos Republicanos aliados a Éric Ciotti, surgia com 36%, contra 29% da LFI, seguido do campo presidencial com 19,5% e dos Republicanos com 8%.