Conselho que rege tribunais contesta anulação de concurso para promover juízes

Decisão do Supremo Tribunal Administrativo padece de inconstitucionalidade, considera Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, alegando que consequências da anulação serão graves.

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Existe um segundo concurso igualmente impugnado judicialmente por alguns juízes cuja legalidade está a ser analisada pelo Supremo Tribunal Administrativo Rui Gaudêncio (arquivo)
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Condenado a refazer o concurso que lançou para promover juízes de primeira instância a desembargadores, por este enfermar de ilegalidades, o conselho que rege os tribunais administrativos e fiscais recorreu da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo.

No recurso que apresentou esta semana para o pleno da secção de contencioso administrativo deste tribunal superior, e que suspende a anulação decretada, o conselho acusa os conselheiros que o condenaram de terem adoptado uma perspectiva inconstitucional na análise do litígio que o opõe a vários concorrentes. Sendo que o relator responsável pela decisão de anular o concurso é nada mais nada menos que o ex-vice-presidente do Tribunal Constitucional, Pedro Machete.

No cerne da anulação do concurso para as secções tributárias dos tribunais administrativos está o facto de o júri ter alterado os critérios de avaliação já mais de dois meses depois de terminado o prazo para os candidatos entrarem na corrida e apresentarem os seus currículos, a pretexto de aprimorar as regras estabelecidas. “A modificação do sistema de classificação determina a invalidade da graduação final dos candidatos”, determinou o Supremo Tribunal Administrativo, “uma vez que constitui fundamento bastante da violação dos princípios da transparência e da imparcialidade da administração”.

O facto de o júri já estar na posse das candidaturas que lhe foram apresentadas na altura em que modificou os critérios, com o consequente risco de ter podido adaptar regras por forma a favorecer ou prejudicar determinados concorrentes, está na origem da anulação.

O facto de não se saber se houve efectivamente fraude ou se apenas se correu esse risco não é, para os conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo responsáveis pela condenação, determinante: basta a suspeita de que possa ter sucedido para abalar a confiança no procedimento. E é precisamente este raciocínio que o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais contesta. “A perspectiva segundo a qual a possibilidade (…) de actuação parcial do júri constitui fundamento bastante de anulação do concurso, mesmo que se comprove não ter existido um concreto risco de parcialidade, bastando a sua possibilidade de ocorrência em abstracto (…) é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade”, alega este órgão liderado pela presidente do Supremo Tribunal Administrativo, lamentando que os juízes que o condenaram não o tenham deixado mostrar que o júri só acedeu efectivamente às candidaturas depois de ter densificado os critérios do concurso, razão pela qual não beneficiou nem prejudicou nenhum candidato.

Na sua contestação, o conselho alude ainda às consequências da anulação de um concurso: “A anulação de todo o processo concursal, com os graves impactos daí advenientes para a jurisdição administrativa e fiscal, não tem justificação válida e suficientemente forte que a justifique”. No limite, essa anulação pode implicar despromover juízes que já se tinham tornado desembargadores, alguns dos quais já se encontram em funções e a quem já foram distribuídos processos.

O Supremo determinou ainda a nomeação de um novo júri, “sem preconceitos e de espírito aberto”, uma vez que o júri anterior, ao qual foram assacadas más práticas, já tem uma ideia formada sobre o valor de cada candidato.

Por fim, o conselho diz que o acórdão que o condena gera uma “gravíssima situação de insegurança jurídica”, ao limitar a margem de discricionariedade dos júris deste tipo de concursos. A este concurso concorreram cerca de seis dezenas e meia de candidatos, aos quais se juntam perto de mais seis outras dezenas de candidatos às secções de contencioso administrativo dos tribunais de segunda instância. Este segundo concurso também foi impugnado judicialmente por vários candidatos, aguardando-se que o Supremo Tribunal Administrativo também se pronuncie sobre a sua legalidade.

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