Em grande parte esquecida nos sets de filmagem, a questão do bem-estar animal é lembrada por um estudo realizado em França, que insta a sétima arte a "trabalhar de forma diferente".
Apesar de os créditos finais indicarem frequentemente que "nenhum animal foi maltratado nesta filmagem", a realidade descrita por 56 profissionais de cinema (realizadores, encenadores ou argumentistas) neste estudo encomendado pela ARA, um sindicato de realizadores francês, é menos lisonjeira.
"Não temos nada para os animais em termos de enquadramento jurídico, nenhuma regulamentação e nenhuma verificação", lamentou na quarta-feira, 26 de Junho, Corinne Lesaine, veterinária responsável pelo estudo, à agência France-Presse (AFP).
A investigação foi realizada entre Outubro e Fevereiro de 2024, através de um questionário enviado a profissionais do mundo do cinema (onde se inclui também o audiovisual e da publicidade) e depoimentos sobre 56 filmes rodados em França com 506 animais. Em mais de metade dos depoimentos recolhidos, o animal foi colocado em situação de medo ou angústia e, num terço, as filmagens ocorreram sob coação.
Um quinto das testemunhas denuncia também o confinamento de um animal numa jaula inadequada à espécie, e menos frequentemente a sua fixação por laços numa posição dolorosa, ou o uso de tranquilizantes ou anestésicos para simular, por exemplo, que está morto.
Alguns, ao contrário, colocam o bem-estar animal no centro do filme, como a comédia francesa O Julgamento do Cão (Le Procès du chien, no título original), que estreia nos cinemas no dia 11 de Setembro.
A realizadora, Laetitia Dosch, apresenta uma advogada pronta para fazer qualquer coisa para salvar o seu cliente de quatro patas, condenado à eutanásia após uma dentada. O papel é interpretado pelo cão Kodi e, segundo a mesma, o argumento foi reescrito "de acordo com ele".
"Quando as pessoas me disseram que ele não poderia fazer uma acção, eu alterei-a. Assim que ele não se estava a sentir bem, parámos", garantiu.
Em 2018, o realizador Nicolas Vanier foi alvo de uma denúncia da associação France Nature Environnement após a destruição de 500 ovos de flamingo cor-de-rosa durante a filmagem do seu filme Donne-moi des ailes (Dá-me asas, em tradução livre), que arrecadou 1,5 milhões de bilhetes vendidos.
Nos Estados Unidos, A Vida de Pi, lançado em 2012, foi fortemente criticado após revelações do Hollywood Reporter que apontavam que o tigre-de-bengala, utilizado para determinadas cenas, "quase se afogou".
Uma lei de 2021 sobre abuso de animais planeia proibir a manutenção e exibição de animais selvagens em circos itinerantes em França até 2028. De momento, as filmagens não são afectadas.
Entre as áreas de melhoria consideradas, o uso de efeitos especiais pode ajudar a colocar os animais no elenco sem perigo para estes. Em 2019, o remake do filme O Rei Leão utilizou imagens geradas por computador muito realistas dos animais da savana.