Almério e Martins trazem a Portugal a alma das novas vozes pernambucanas

Dupla formada em 2020, Almério e Martins mostram em Portugal pela primeira vez ao vivo o trabalho que os uniu. Esta quarta-feira no Musicbox e quinta-feira na Casa da Música.

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Almério (à esquerda) e Martins em palco DR
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Já estiveram ambos em Portugal, a solo em projectos colectivos, mas é a primeira vez que os cantores e compositores pernambucanos Almério e Martins aqui se apresentam como uma dupla que tem vindo a conquistar o Brasil desde 2020 (esteve em quase todas as capitais). Gravaram um disco e um DVD a partir desse encontro a dois (Almério e Martins Ao Vivo no Parque) e é ele que servirá de base à sua estreia em palcos portugueses, primeiro no Musicbox, em Lisboa, esta quarta-feira, às 22h; depois na Casa da Música, no Porto (quinta-feira na esplanada, às 21h30), na feira do Livro de Aveiro (dia 28) e em conversa na Fnac Norte Shopping (Porto, 3 de Julho, 19h).

Depois de Almério e Martins Ao Vivo no Parque, lançado em 2022, já lançaram ambos novos discos a solo. Martins editou Interessante e Obsceno (2023, com três canções que já integravam o disco da dupla, Deixe, Interessante e obsceno e Nu) e Almério publicou Nesse Exato Momento (2024, com uma canção já presente o disco da dupla, Antes de você chegar), onde tem duetos com Maria Bethânia, Zélia Duncan, Mariana Aydar, Juliano Holanda ou Zé Manoel.

Como se conheceram, tendo Almério nascido em Altinho (no interior) e Martins em Recife (no litoral)? Através de outro músico e produtor pernambucano, Juliano Holanda. Um acaso devido aos estúdios, como recorda a dupla ao PÚBLICO: “Eu estava gravando o meu disco Desempena [2017], com o qual fui a Portugal pela primeira vez, e precisava de uma música mais solar”, diz Almério. “O Juliano juntou vários compositores no Recife, meus contemporâneos, e entre eles estava esse príncipe maravilhoso, Martins.” A canção Queria ter pra te dar, que Almério gravou nesse disco, deu início à parceria entre os dois, que mais tarde teria expressão num espectáculo, Almério e Martins, a convite de um festival que ocorre todos os anos, em Janeiro, no Recife.

Foi em 2020 e Almério diz que o encontro foi decisivo: “A gente entrou no palco e sentiu uma magia como nunca havia sentido antes”. Martins concorda: “Eu já conhecia Almério, porque ele tinha um trabalho de muita relevância. Foi Juliano Holanda, que fez a direcção musical desse nosso show, quem fez a ponte directa entre nós. Mas um artista maravilhoso de Pernambuco, Geraldo Maia, já havia falado dele pra mim, um ano antes de Juliano nos apresentar”.

Além do repertório próprio, Almério e Martins trazem para o palco canções de outros autores de que gostam ou que os influenciaram. “Há canções de artistas que servem de referência para tudo o que a gente faz”, esclarece Martins. “A gente canta músicas de Alceu Valença, de Caetano Veloso, de Lula Queiroga, enfim, é um projecto de que tenho a maior felicidade de fazer parte.”

E talvez lhes juntem, em palco, alguma canção de autores portugueses. Martins fala de Salvador Sobral, com quem já cantou no Brasil (“no dia do show parece que a gente já era amigo há dez anos”), enquanto Almério cita Carminho, Manuel Cruz, Mariza, Maria João, Pedro Abrunhosa e também nomes que já não estão entre nós, como Amália, António Variações ou Sara Tavares. Com Almério e Martins estarão em palco dois músicos brasileiros a viver actualmente em Portugal: Walter Areia, ex-integrante dos Mundo Livre SA (baixo) e Zé Victor (guitarra).

Almério e Martins fazem parte de um colectivo criado no ano 2000 e dinamizado por Juliano Holanda, a que foi dado o nome de Reverbo. Reúne cerca de três dezenas de artistas e, para quem acompanha a música de Pernambuco, dos nomes que foram fazendo história (Alceu Valença, António Nóbrega, Bezerra da Silva, Chico Science, Dominguinhos, Dona Selma do Coco, Geraldo Azevedo, Lenine, Lia de Itamaracá, Luiz Gonzaga, Lula Queiroga, etc.) a movimentos como o Mangue Beat (com Chico Science & Nação Zumbi, Fred 04 e Mundo Livre S/A, Mestre Ambrósio, Querosene Jacaré e outros), não se trata de um supergrupo nem de um movimento.

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Almério e Martins na capa do disco Ao Vivo no Parque DR

“A Reverbo foi uma vontade muito natural de a gente se encontrar”, diz Almério. “A gente está muito mais ligada à canção, de Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Geraldo Maia. O Mangue Beat fez olhar para a cultura popular como a nossa religião, mas não tinha muito espaço para a canção. A Reverbo dialoga com outros artistas do interior de Pernambuco, compositores e compositoras, intérpretes incríveis, e isso é o mais interessante.” Martins pensa o mesmo: “A Reverbo nunca teve a pretensão de ser um movimento. Até porque um movimento abrange várias linguagens, não só a canção. Isso sucedeu na Semana de Arte Moderna de São Paulo [em 1922] como no Mangue Beat [nos anos 1990]. A Reverbo tem pessoas do Alto Sertão de Pernambuco ou da zona da Mata Norte, lugares distantes mas riquíssimos. Por isso, a gente gosta de brincar dizendo que a Reverbo não é um movimento, é uma movimentação.” E isso transmite-se às actuações da dupla, assegura Almério: “A nossa voz são várias vozes ao mesmo tempo, porque carrega as vozes e as composições desses artistas contemporâneos.”

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