Ora vamos lá fingir que está tudo bem com a fonética…
De 2020 para 2024, de 38 palavras escritas com o Acordo de 1990, o Word já acertou em 29 ao “lê-las” em voz alta. Mas ainda errou em nove.
No jargão comercial de outrora, costumava dizer-se isto, com a altivez das verdade inabaláveis: “O cliente tem sempre razão.” Mesmo quando não tem. Porque é preciso agradar-lhe, agarrá-lo, evitar que vá bater a outra porta. Até os jornais podiam adoptar tal máxima. Sem pensar nela, mas ciente de que o leitor pode ter razão, encarei como um desafio este comentário à minha crónica “Foi você que pediu uma tradução em brasileiro? Vai ter”: “Se ouvir o seu artigo através do leitor automático que o PÚBLICO disponibiliza, vai verificar que ele lê da mesma maneira recepção e receção, concepção e conceção, espectadores e espetadores. Até a máquina consegue...” O meu argumento era que, na escrita do Brasil, certas palavras mantinham consoantes que em Portugal foram decepadas a eito, alterando-lhes a fonética. Fui ouvir. Resultado? A máquina lê do mesmo modo quase todas as palavras (abrindo o segundo “e” em receção, como faríamos lendo recepção), excepto uma: lê “dec’ção” (elidindo o “e”) e não “decèção” em deceção. O argumento “até a máquina consegue” é, como se vê, muito relativo. Tão relativo quanto, no caso, a razão do leitor.
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