É rosa, mas não é cocaína rosa

A pink cocaine é uma mistura de várias substâncias, constitui um cocktail de consequências desconhecidas e imprevisíveis e o consumidor não sabe o que está a ingerir.

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A cocaína rosa é mistura de cetamina, MDMA e cafeína em várias concentrações, com outras substâncias de quando vez, como é o caso da 2CB Guarda Civil de Espanha
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Chamam-lhe cocaína rosa, mas não contém cocaína. Esta nova substância tem vários nomes: pink cocaine (cocaína rosa), tucibi, tusi, pó rosa, etc. Se há droga que corresponde às tendências de produção e de consumo actuais na União Europeia (UE) é esta: é uma mistura de várias substâncias, constitui um cocktail de consequências desconhecidas e imprevisíveis e o consumidor não sabe o que está a ingerir.

A cocaína rosa não é nada do que aparenta ou dizem ser. Trata-se de uma mistura de cetamina, MDMA e cafeína em várias concentrações, com outras substâncias de quando vez, como é o caso da 2CB ou de catinonas sintéticas, como a 4-CMC. O seu consumo não está generalizado, está mesmo mais localizado em Espanha, onde foi registada uma eventual morte associada à sua ingestão.

Katarzyna Berkowicz e Joanna de Morais, especialistas do Observatório Europeu das Drogas e da Toxicodependência (OEDT), confirmaram ao PÚBLICO que aquele pó cor-de-rosa foi detectado, em pequenas quantidades, na República Checa, Estónia, França, Hungria, Irlanda, Países Baixos, Noruega, Polónia, Roménia, Eslovénia e Suécia, e que não há registo da sua venda e utilização em Portugal. Em suma, é sobretudo uma especificidade espanhola.

Em Espanha, a pink cocaine é um consumo de moda, com aroma a morango, vendida a 100 euros o grama. O caricato é que esta mistura, que tenta passar-se como sendo cocaína, é ainda mais cara do que esta última. Relatórios do Observatório Espanhol sobre Drogas e Dependências referem que a maioria desta droga analisada era uma mistura de outras substâncias mais baratas e que 44% das amostras continham cetamina, MDMA e cafeína.

O relatório anual do OEDT, apresentado nesta terça-feira, menciona esta substância, pela primeira vez e elege-a como um exemplo de novas drogas sintéticas que circulam no mercado clandestino da UE. O que ali é dito é que a “cocaína rosa é um exemplo do ‘marketing’ mais sofisticado de substâncias sintéticas para consumidores, que provavelmente têm muito pouco entendimento sobre quais os produtos químicos que estão realmente a consumir”.

Alexis Goosdeel, director da agência europeia das drogas, é de opinião que produtos como a cocaína rosa colocam novos desafios às autoridades policiais locais e aos serviços de redução de riscos. Goosdeel entende que chegou a altura de rever as políticas de prevenção, muito marcadas pela figura e problema do heroinómano, defendendo uma actualização deste tipo de campanhas, para impedir que substâncias como estas possam criar uma pandemia. A mesma preocupação foi sublinhada pela comissária europeia para os Assuntos Internos, Ylva Johansson.

O perigo da sua utilização depende da proporção das substâncias empregues na mistura, por um lado, e de outros consumos complementares, por outro. A inalação de cocaína rosa com uma elevada concentração de cetamina, acompanhada da ingestão de álcool, por exemplo, aumentará os efeitos depressivos de ambas e poderá ter como consequência a perda de coordenação ou de consciência.

O que acontece com a cocaína rosa é um acto de "marketing", semelhante ao que acontece com o Captagon, no Médio Oriente, falsamente vendido como tal.

O Captagon era uma droga de prescrição médica, também utilizada recreativamente por quem pretendia passar vários dias sem dormir. Popular na década de 80, seria recuperada, já no início deste século, como droga ilícita na Europa de Leste e no Médio Oriente. O nome, pelo menos.

Porque o que é produzido na Síria e no Líbano e enviado através da Europa para a Península Arábica, particularmente para a Arábia Saudita, não é Captagon. Trata-se apenas de aproveitar a sua popularidade para obter ganhos comerciais.

A fenetilina, o seu princípio activo, e a anfetamina fazem parte da mesma família, e os seus efeitos são semelhantes. O “falso Captagonem circulação não contém qualquer percentagem de fenetilina, mas sim anfetamina e cafeína, como se depreende das análises efectuadas à droga apreendida na União Europeia.

As Nações Unidas classificaram-na como ilegal na sua tabela de substâncias psicotrópicas, devido à dependência que provocava, em 1986, decisão seguida também por Portugal.

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