Guia de leitura da noite eleitoral no Parlamento Europeu de Bruxelas

Seis pontos sobre o que vai acontecer na noite deste domingo.

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Eleições europeias realizam-se neste domingo REUTERS/Johanna Geron

Participação no acto eleitoral

As eleições para o Parlamento Europeu têm uma taxa de abstenção tradicionalmente elevada, mas na última votação, em 2019, essa tendência inverteu, e pela primeira vez desde 1979, verificou-se uma subida da participação face às eleições anteriores. Ainda assim, a abstenção foi de 49%.

Com vários Estados-membros, entre os quais Portugal, a introduzirem medidas no sentido de facilitar a ida às urnas (do voto antecipado, ao voto no estrangeiro e até electrónico), existe uma expectativa de um aumento da participação.

Também se espera que as experiências do voto juvenil, com cinco Estados-membros a permitir o voto a partir dos 16 anos de idade, possa atrair mais dois milhões de eleitores para o processo. Este ano, entraram para os cadernos eleitorais cerca de 26 milhões de novos eleitores.

Primeiras projecções da recomposição do hemiciclo

Ainda antes do fecho das urnas em todos os Estados-membros, o Parlamento Europeu vai divulgar projecções com base em sondagens pré-eleitorais e à boca das urnas ou, no caso dos países que dispõem dessa ferramenta, de previsões baseadas nos resultados da votação de Maio de 2019.

A primeira projecção, que fornecerá um retrato ainda muito incompleto das mudanças e diferenças da próxima legislatura, está prevista para depois das 18h de Bruxelas (17h de Lisboa), e será baseada nos dados de apenas seis Estados-membros: Alemanha, Áustria, Chipre, Grécia, Malta e Países Baixos.

Uma hora depois, serão acrescentados os dados de outros dois Estados-membros, Bulgária e Croácia, e depois das 20h (19h portuguesas) de mais três, Dinamarca, Espanha e França. Depois das 21h, quando as mesas de voto já tiverem encerrado em Portugal, Polónia, Roménia e Suécia, está prevista uma nova actualização, com os dados das sondagens à boca de urna destes países.

Depois das 23h, quando estiverem encerradas as secções de voto em Itália, o país que tem o horário mais alargado para o exercício do direito de voto, o Parlamento Europeu avançará uma nova projecção, mas desta feita já assente nos resultados apurados em 24 Estados-membros (alguns serão ainda provisórios). Até ao fim da noite, será revista duas vezes, às 24h e à 1h de segunda-feira.

Tendências políticas e votação de cada grupo parlamentar

À medida que os resultados começarem a ser reportados, será possível ver se se confirmam as tendências que se têm manifestado nas eleições nacionais, de fragmentação e radicalização da representação partidária nas assembleias e parlamentos dos Estados-membros, e de oscilação do eleitorado do centro moderado para os extremos do espectro político, especialmente o da direita.

A previsível entrada do Chega no Parlamento Europeu, com lugar marcado no grupo da Identidade e Democracia, retira a Portugal o estatuto de “excepção” no panorama da UE: o país já não é o “último reduto” imune à extrema-direita. Em Bruxelas, talvez mais do que nas capitais, as atenções vão estar concentradas no desempenho dos partidos eurocépticos, nacionalistas e de extrema-direita, para ver se a antecipada “guinada à direita” se materializa.

As primeiras indicações dos Estados-membros onde os cidadãos já foram às urnas não confirmam um sucesso retumbante das formações da extrema-direita, cujo eleitorado tem menor interesse na política europeia, e maior desconfiança nas instituições comunitárias, e por isso não está tão mobilizado para o voto.

Quando chegarem os números, começam os cálculos sobre as possíveis maiorias de trabalho, e minorias de bloqueio, na próxima legislatura. A confirmarem-se os inquéritos sobre as intenções de voto, continuará a haver uma “grande coligação” de forças moderadas de centro-esquerda e centro-direita para a aprovação de legislação.

Resta saber se, pela primeira vez, a bancada democrata-cristã poderá prescindir do apoio dos sociais-democratas e recorrer exclusivamente às bancadas à sua direita.

O número mágico da noite é 361: o número de votos no plenário que serão necessários para alcançar a maioria absoluta de 50% mais um, obrigatória para a eleição do presidente da Comissão Europeia.

Declarações dos cabeças de lista dos vários partidos europeus

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que se candidata a um segundo mandato à frente do executivo comunitário (mas não a um lugar no Parlamento Europeu), deverá ser a primeira dos Spitzenkandidaten, ou cabeças de lista, a reagir à divulgação da primeira projecção já com resultados provisórios.

A coreografia prevê que seja o candidato do grupo com mais votos a pronunciar-se primeiro. Será importante perceber se na sua intervenção a alemã vai privilegiar as forças moderadas que a elegeram em 2019 ou se vai manter a porta aberta ao apoio da direita radical, como durante a campanha.

E quando falarem os cabeças de lista do Partido Socialista Europeu e da Aliança dos Liberais e Democratas Europeus, que se comprometeram a manter um cordão sanitário contra a direita radical e extrema, todos estarão atentos às condições que vão pôr em cima da mesa em troca do seu apoio.

Novos grupos na próxima legislatura?

O processo de constituição dos grupos parlamentares, com a associação dos vários partidos nacionais que integram as diferentes famílias políticas europeias, arranca uma semana depois das eleições e prolonga-se até ao início de Julho.

O Partido Popular Europeu (PPE), que deverá voltar a ser a maior bancada, marcou a reunião constitutiva para 18 de Junho. Os democratas-cristãos têm uma estratégia agressiva para a atracção de partidos que estejam a entrar no PE ou eurodeputados independentes para as suas fileiras.

Os outros grupos agendaram os seus encontros para os dias seguintes. Na sua reunião, marcada para 26 de Junho, o grupo Renovar a Europa decidirá o destino do Partido Popular para a Liberdade e Democracia (VVD) do ainda primeiro-ministro holandês, Mark Rutte. O mais provável é que seja expulso do grupo, depois de ter entrado no Governo de coligação dominado pelo Partido da Liberdade de Geert Wilders, rompendo o pacto de cordão sanitário contra a extrema-direita.

O grupo de extrema-direita Identidade e Democracia, a que em princípio vai pertencer o Chega, não tem pressa: será o último a reunir-se, a 3 de Julho. Durante a campanha eleitoral, muito se especulou sobre a possibilidade de as duas bancadas eurocépticas de direita soberanista e radical unirem esforços, juntando-se num único grupo.

E, nos últimos dias antes da votação, começaram a surgir notícias sobre a hipótese de se criar um terceiro grupo de extrema-direita, para agregar os eurodeputados desta ideologia que não são filiados em nenhum dos actuais grupos.

Para a formação de um grupo político no Parlamento Europeu, são precisos 23 eurodeputados que representem um quarto do Estados-membros, ou seja, tem de haver pelo menos sete nacionalidades diferentes. É através dos grupos que os eurodeputados se candidatam aos cargos internos do PE (presidente, vice-presidentes, questores, presidentes de comissões).

Dinâmicas internas dentro de cada grupo

Com base nas sondagens, são previsíveis mudanças no equilíbrio de forças das delegações partidárias e nacionais dentro de cada grupo político. A delegação alemã arrisca perder a sua posição dominante dentro do grupo do PPE; os Irmãos de Itália deverão ultrapassar os polacos do PiS como a maior delegação do ECR; e o mais provável é que os representantes do movimento do Presidente francês, Emmanuel Macron, vejam diminuir a sua autoridade dentro do grupo dos liberais.

Essas mudanças terão um reflexo na dinâmica interna dos grupos e, por arrasto, do Parlamento Europeu. Mesmo se todos comungam da mesma visão do mundo (e dos temas), as prioridades dos eurodeputados do Norte ou do Sul da Europa são muito diferentes, logo, o peso relativo de cada delegação nacional dentro do seu grupo condiciona a sua actividade política — da distribuição de cargos à atribuição de relatórios e ao “leilão” de minutos para as intervenções em plenário.

A recalibragem acrescenta um elemento adicional de incerteza nos cálculos para a eleição da presidente da Comissão Europeia, com várias delegações nacionais, como por exemplo os franceses do PPE e do S&D a prometer votar contra Ursula von der Leyen.

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