Hoje é Dia do Ambiente. Os portugueses estão preocupados?

As crianças portuguesas estão preocupadas com as alterações climáticas, os adultos também. Neste Dia Mundial do Meio Ambiente, procuramos saber o que sentem os portugueses em relação ao clima.

Foto
Participação de várias gerações nos protestos pelo clima mostra que não são só os jovens que estão preocupados com as alterações climáticas Nuno Ferreira Santos
Ouça este artigo
00:00
07:59

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

Não são só os jovens que estão preocupados com as alterações climáticas, mas é com os mais novos que, neste Dia Mundial do Ambiente, começamos por responder à questão: quão preocupados estamos com o ambiente e o clima?

As crianças portuguesas parecem saber muito sobre as consequências das alterações climáticas — e estão preocupadas com elas , mas sabem menos sobre as causas ou o próprio conceito. E há também diferenças entre o que as crianças sabem sobre as alterações climáticas e o que realmente querem saber. É uma das conclusões de um estudo do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), desenvolvido a partir de entrevistas a alunos do ensino básico, que alerta que a consciência que as crianças têm da gravidade da crise climática pode interferir na sua saúde mental.

Os questionários foram respondidos por mais de 400 alunos do ensino básico, entre os 10 e os 13 anos (5.º ao 8.º ano) participantes no Clube Ciência Viva na Escola em duas escolas do concelho de Ansião, no distrito de Leiria.

Os alunos, especialmente os do 8.º ano, dizem conhecer e parecem estar preocupados com os resultados negativos das alterações climáticas: questionados sobre o que sabem, usam palavras como “prejudicial”, “perigoso” ou “mau”. As crianças estão também cientes das consequências a longo prazo, mencionando questões como as alterações nos glaciares e usando expressões como “o nosso mundo está a ser destruído” e até mesmo “estamos a cometer suicídio”.

Um pormenor que surpreendeu os investigadores: apesar de os questionários terem sido aplicados em 2020, com um grande destaque para Greta Thunberg e as manifestações da Greve Climática Estudantil nos meios de comunicação social nos dois anos anteriores, a jovem activista sueca foi mencionada apenas duas vezes (uma delas para questionar quem ela era).

Cultivar a resiliência

Apesar de estarem conscientes sobre as consequências, as circunstâncias das alterações climáticas como, onde, quando e porquê quase não surgiram entre os tópicos sobre os quais os alunos afirmam saber alguma coisa. Uma excepção é saberem que a poluição é uma das principais causas das alterações climáticas, com respostas como “as alterações climáticas ocorrem quando o fumo das fábricas polui o ar”, menciona o estudo, publicado em Fevereiro deste ano na revista científica Environmental Education Research.

Apesar de terem dificuldade em identificar estratégias para combater as alterações climáticas, as crianças que participaram no estudo mostraram particular interesse em aprender mais sobre essas estratégias.

Para a autora principal do estudo, Zara Teixeira, investigadora do MARE, estes resultados mostram que é preciso “apoiar as crianças, disponibilizar informação adaptada às suas capacidades cognitivas e fornecer conhecimento, tendo sempre a preocupação de não exacerbar as suas dúvidas e ansiedades”. Citada num comunicado do MARE, a investigadora do Departamento de Ciências da Vida da Universidade de Coimbra refere que é preciso trazer “esperança construtiva, um conceito que está relacionado com o envolvimento ambiental positivo e que parece desempenhar um importante papel motivacional entre os mais novos”.

Em Novembro de 2023, a Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) lançou um guia sobre o papel dos psicólogos no combate às alterações climáticas. Recordando que Portugal se encontra entre os países europeus com maior vulnerabilidade aos impactos das alterações climáticas, a OPP alerta que as alterações climáticas têm impacto na saúde psicológica, podendo suscitar problemas como ansiedade, depressão, perturbação de stresse pós-traumático ou apatia, culpa, incerteza e desespero.

Impacto no dia-a-dia

Sabemos que os jovens estão preocupados com o clima, mas e a população portuguesa em geral? Também. Os estudos do Eurobarómetro têm vindo a mostrar que a esmagadora maioria dos portugueses (98%) considera que as alterações climáticas são um problema grave que o mundo enfrenta: mais precisamente, 89% considera que são um problema muito grave e 9% um problema relativamente grave, de acordo com o inquérito sobre Alterações Climáticas publicado em Julho do ano passado.

Já o Eurobarómetro lançado há poucos dias (29 de Maio) sobre Atitudes dos europeus em relação ao ambiente mostrou que Portugal é um dos cinco países da UE que se mostra mais preocupado com o efeito directo que os problemas ambientais pode ter na sua saúde e no seu dia-a-dia: 90% dos inquiridos portugueses concordaram com a afirmação “Os problemas ambientais têm um efeito directo no seu dia-a-dia e na sua saúde”. Esta proporção é expressiva, quando a nível europeu foram 78% a concordar com a afirmação.

Apesar de os portugueses estarem mais conscientes dos impactos ambientais nas suas vidas do que a média europeia, estão menos dispostos a agir individualmente, por exemplo, para reduzir o desperdício, com 64% dispostos a fazer a reciclagem (média europeia: 66%), 49% dispostos a usar embalagens reutilizáveis, 33% a comprar produtos em embalagens recicláveis e 29% disponíveis para comprar maioritariamente produtos que não têm mais embalagens do que o essencial.

Uma nota para os candidatos às europeias: 94% dos inquiridos considera a legislação ambiental da UE é necessária para proteger o ambiente em Portugal, quando a nível da UE essa percentagem baixa para 84%. Estes resultados, sublinha a Comissão Europeia, são semelhantes aos do último Eurobarómetro sobre o mesmo tema, realizado em 2019, numa altura de grandes manifestações em defesa do clima, o que “destaca a relevância contínua das políticas ambientais da UE” para os cidadãos.

Muito preocupados, mas não é prioridade

Uns dias antes, a 23 de Maio, outro estudo do Eurobarómetro, desta feita dedicado às atitudes em relação à União Europeia, mostrava um ângulo um pouco diferente: os portugueses estão preocupados com o ambiente e o clima, mas não lhes atribuem prioridade política.

Quando questionados sobre quais as áreas em que a União Europeia deve tomar medidas a médio prazo (nos próximos cinco anos), os europeus em geral colocam ambiente e clima em segundo lugar, com 30%, atrás apenas da defesa e segurança (34%). Em Portugal, contudo, o ambiente surgia em 5.º lugar (prioridade para 21% das pessoas), atrás da saúde (51%), emprego (41%), igualdade social (41%) e economia (23%).

Também no curto prazo os portugueses mas também os europeus em geral não colocam as acções políticas na área da transição energética como prioritárias.

Os europeus colocam o desenvolvimento de fontes e infra-estruturas de energias renováveis no 6.º lugar (referido por 22% dos inquiridos), enquanto em Portugal é a prioridade de apenas 18h% das pessoas, estando em 8.º lugar (atrás de medidas como “criar mais oportunidades de emprego”, “garantir a paz e a estabilidade”, “reduzir as desigualdades regionais dentro da UE” ou “melhorar o acesso à habitação na UE”.

Alarmados?

Por fim, podemos encontrar pistas também num inquérito internacional realizado pelo Programa de Yale sobre Comunicação das Alterações Climáticas (YPCCC), em colaboração com o programa Data for Good, da Meta (empresa que detém o Facebook), que examinou o conhecimento, as atitudes, as preferências políticas e o comportamento do público sobre as alterações climáticas entre utilizadores do Facebook por todo o mundo. Os dados do estudo de Yale sobre Global Warming’s Six Audiences (“Seis Audiências do Aquecimento Global”) foram recolhidos em meados de 2022.​

Portugal é o país europeu onde as pessoas estão mais inquietas: 56% da população está no grupo “Alarmado” e 29% no grupo “Preocupado”. Ou seja, mais de metade da população está convencida de que as alterações climáticas estão a acontecer, são causadas pela acção humana e constituem uma ameaça urgente, e apoiam fortemente as políticas climáticas, enquanto quase um terço dos “preocupados”, apesar de partilharem a consciência sobre os riscos, acreditam que os impactes climáticos ainda estão distantes no tempo e no espaço, atribuindo uma prioridade menor à questão.

Os resultados de Portugal neste inquérito contrastam com outros países europeus, como a Noruega, onde 15% da população encaixava no grupo “Incerto/Duvidoso” (não pensam que as alterações climáticas estejam a acontecer ou acreditam que se trata apenas de um ciclo natural) e 8% era “Inconformado/Depreciativo”, convencidos de que as alterações climáticas não estão a acontecer, não são causadas pela acção humana nem constituem uma ameaça, e opõem-se à maioria das políticas climáticas.