Pode-se fazer asfixia erótica? Além do consentimento, é preciso aprender

Asfixia erótica pode ser prazerosa, mas requer conversa, técnica e gesto de segurança.

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A cada cinco anos, algum texto ou vídeo é publicado em algum rincão da internet vociferando o pânico moral dos perigos da asfixia erótica. Ora, há quem diga que essas matérias são de todo moralistas e o único perigo dessa prática é você se apaixonar. Não é bem assim. Se feita de forma errada, a asfixia pode machucar, provocar danos e, em casos mais extremos, a morte. Mas, do jeito certo, há quem garanta ser esse o segredo do melhor orgasmo possível. Ainda bem que existem maneiras seguras de ficar sem ar.

Por esta altura, alguns leitores dão um risinho de lado lembrando daquela vez em que sentiram as suas mãos lascivamente a envolver a goela do amado (ou não tão amado assim). Outros mal conseguem respirar de emoção ao lembrar da última vez que viram estrelas sentindo os dedos do parceiro apertarem temerosamente seu pescoço. E, claro, há os que nem sequer imaginavam que isso fosse possível, onde já se viu; os que apontam o efeito deletério da pornografia no quotidiano sexual; os que vêem nesse hábito um sinal inequívoco da opressão feminina, mesmo que o receptor seja um homem.

Eu? Francamente, quanto mais a idade chega, mais baunilha eu fico. Baunilha é aquela pessoa sem fetiche nenhum, sabe, normativa, comum e ordinária no que diz respeito a sexo. Fazer sexo de forma simples e tradicional sem performance e ter um orgasmo sem ter de fazer papel de psicóloga depois é o meu fetiche.

Por isso mesmo decidi falar com quem entende do assunto. "Para o top, quem enforca, o prazer está em ter controlo; para o bottom [quem fica por baixo] existe a excitação de ser controlado e a sensação de prazer de milésimos de segundo que vem com a privação do oxigénio. O perigo está em querer prolongar essa sensação", diz Madame Dubah, terapeuta holística e fetichista praticante há mais de 25 anos.

O dominador profissional e influencer de BDSM Gabe Spec, refere que os bottoms descrevem uma adrenalina que vem do perigo, a que se segue uma sensação de relaxamento e êxtase quando interrompidas. Aliada ao orgasmo, que também é uma tensão levada ao extremo, seguida de relaxamento e êxtase, a prática potencializa o deleite.

Algumas pessoas gostam de usar cintos, cordas e até mesmo afogamento para obter o efeito, mas tanto Gabe quanto Dubah preferem as mãos por serem mais seguras e eficientes. O lance é que a asfixia erótica não deve ser feita pela compressão da traqueia, aquele tubo duro que passa do meio da garganta. Essa região é sensível, pode machucar de forma grave e apertá-la pode suspender a passagem de ar, o que não é o objectivo. O correcto é trancar apenas o fluxo sanguíneo e diminuir a entrada de oxigénio no cérebro, o que se faz com os dedos, longe da traqueia. Não é questão de força, é de jeito.

"Todas a práticas do BDSM devem seguir o princípio do SSC: são, seguro e consensual", diz Spec. As duas (ou mais) partes devem estar conscientes e têm de conversar antes sobre os desejos e limites de cada um. Além disso, devem combinar um gesto de segurança, pois nesse caso a pessoa não consegue falar uma palavra para interromper. Gabe recomenda que o submisso mantenha o punho em volta do braço do dominador e o comprima quando desejar que ele pare. Uma amiga mais galhofeira e adepta do humor sempre que possível contou-me que aperta um pato de borracha para decretar o fim.

Eu não consigo entender porque nós, os "normativos", simplesmente não imitamos o pessoal do fetiche. Consciência, consentimento e segurança deveria ser o princípio de toda a actividade sexual, e não apenas do fetiche, certo?

Mas, alerta: se viu na pornografia que toda mulher gosta de ser enforcada, alto lá. Não faça isso com todas sem perguntar se elas querem antes. Sim, pergunte, jamais presuma. E, não, não realize a asfixia sem aprender. Quer enforcar? Vai estudar, ora.

Não esperem que eu ensine como asfixiar perfeitamente aqui. Em primeiro lugar, porque não sei. Em segundo lugar, porque isso não é coisa que se aprenda num texto. "Eu prefiro não ensinar na internet porque a malta é muito sem noção, o ideal é procurar alguém experiente que ensine", diz Dubah.

Para quem gosta da ideia de inserir elementos como asfixia erótica, chicotadas, dominação e submissão, amarrações e outros fetiches, vale a pena deixar a pornografia mainstream de lado e acompanhar o trabalho de quem sabe o que está fazendo.


Exclusivo PÚBLICO/Folha de S. Paulo

​Nota do editor: o PÚBLICO respeitou a composição do texto original, com excepção de algumas palavras ou expressões não usadas em português de Portugal.

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