Já temos a distância necessária para tirar conclusões: muito pouca coisa ficou da pandemia, mas a atenção que se dá à saúde mental não foi uma delas. E ainda bem. Hoje há cada vez mais a percepção de que é importante falar sobre saúde mental e procurar ajuda quando é precisa.

As empresas não estão alheadas. Em primeiro lugar, porque as afecta onde dói mais: no bolso. Sem saúde mental, a produtividade baixa, o absentismo aumenta. Em Portugal, estima-se que o stress custe cerca de 5,3 mil milhões de euros por ano às empresas, de acordo com um relatório de 2023 da Ordem dos Psicólogos.

Parece que isso começou a entrar no radar das empresas. Há cada vez mais empresas em todo o mundo a oferecer benefícios relacionados com a saúde mental aos seus trabalhadores. São coisas como psicoterapia gratuita, acesso a apps especializadas ou programas de bem-estar, que podem incluir coisas como meditação ou aulas de yoga.

Dos EUA (de onde mais poderia ser?), chega-nos a notícia de que há uma empresa a oferecer terapia assistida por psicadélicos (neste caso, com ketamina) aos seus trabalhadores como benefício, escreve o Financial Times. A empresa é a Dr Bronner’s, especializada em produtos de banho, e será uma das primeiras a oferecer este tipo de benefícios. A maior parte não é tão ousada – mas também não precisa.

Foquemo-nos em Portugal. Na Doutor Finanças, empresa de aconselhamento financeiro com cerca de 240 trabalhadores e escritórios em Algés, desde a pandemia que os trabalhadores têm direito a consultas de psicoterapia, online, gratuitas e "totalmente confidenciais", especifica a directora de recursos humanos, Irene Vieira Rua.

Sublinha que isso faz parte de uma estratégia mais ampla: "O que queremos criar é um ambiente onde a segurança psicológica seja inequívoca, onde as pessoas se sintam com espaço para falar e onde a sua opinião é ouvida, onde possam ser inteiras", descreve.

"Quando estamos a falar do apoio psicológico, já estamos a falar de algo correctivo. Mas o que queremos é prevenir, seja ao dar condições às pessoas para que não vejam a sua saúde mental fragilizada, seja com iniciativas que promovem a segurança psicológica, com o feedback regular."

A par das consultas, há também um programa de bem-estar para os trabalhadores a que chamam "o bloco" – "onde se operam bons momentos", remata. Não é inédito da Doutor Finanças (há empresas com programas semelhantes em todo o mundo), mas que aqui toma a forma de aulas de paddle ou de dança. Serve para "optimizar o bem-estar", seja físico, seja social – isto porque fortalecer os laços com os colegas também pode ser um elemento protector.

Estas são "tendências" na área do bem-estar que se vão "generalizando", descreve o Bastonário da Ordem dos Psicólogos, Francisco Miranda.

As consultas gratuitas, como na Doutor Finanças, estão no topo da lista. Mas há mais coisas. Por exemplo, "organizações que montaram programas para o desenvolvimento das suas lideranças, de modo a que não incorram em comportamentos que possam ser de assédio ou intromissão na vida pessoal dos trabalhadores".

Há também empresas que têm programas para desenvolver a literacia em saúde mental dos trabalhadores "para que todos entendam melhor e se consigam proteger" – a si e aos outros. E ainda boas práticas que se podem implementar associadas à organização do trabalho. Por exemplo, em locais onde se trabalha principalmente com computadores, promover, em cada turno, alguns minutos de "pausa digital".

"Há sempre duas dimensões disto, a individual e a organizacional. Nenhuma substitui a outra. Precisamos, individualmente, de estar preparados para gerir o que existe sempre no trabalho, as fontes de stress", afirma o Bastonário. "Mas também há a dimensão organizacional."

Quem está no "topo da organização" tem de entender que,"se não for acautelada", a falta de saúde mental e bem-estar "põe em causa a sustentabilidade e sobrevivência da própria organização, porque não vai conseguir captar talento, vincular as pessoas e mantê-las devidamente motivadas".

Apesar da "preocupação cada vez maior" – que cada vez mais se traduz em mudanças na prática —, há empresas que ainda não passam do "marketing, mental health washing". Falta de visão, acredita Francisco Miranda, uma vez que "o bem-estar está associado à produtividade." É "estratégico", diz-me. É essencial, acrescento.


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