Pode um vinho valer 200, 1000 ou 3800€? Vinhos que não se repetem

Na cabeça de muitos leitores a pergunta é recorrente: pode um vinho valer 200, 1000 ou 3800 euros? A resposta é sim, se houver alguém disposto a pagar tais valores pela experiência.

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Portugal tem de posicionar-se nos mercados externos como um país de vinhos distintos e de alta qualidade MIGUEL MADEIRA
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Na maior parte dos casos, os vinhos em prova foram edições que não voltarão a ser produzidas, seja porque resultaram de uma colheita muito especial, seja porque as vinhas que lhes deram origem já não existem. Esta circunstância pode ser um problema no curto prazo, em virtude de os mercados gostarem de regularidade. Contudo, quem aprecia vinhos com este perfil percebe que os mesmos são raros e, por vezes, únicos, o que torna o negócio também interessante.

O que nos parece relevante é que Portugal tem de posicionar-se nos mercados externos como um país de vinhos distintos e de alta qualidade – e pagar na lógica do que acontece com produtores de França, Itália ou Alemanha – e não como o velho país que trabalha apenas na lógica da boa relação qualidade/preço, a negociar margens de cêntimos por garrafa. Se há quem pague fortunas por relógios, carros, roupa, hotéis ou viagens, por que razão não se aplica o mesmo princípio ao vinho quando é isso que acontece em todo o mundo?

Se continuarmos com esta cultura organizacional do “bom, bonito e barato”, nunca acrescentaremos valor à cultura do vinho e nunca pagaremos aos produtores o justo valor pelas suas uvas. Ah, pois, demora muito tempo inverter a situação. Pois demora, mas nalgum momento temos de começar a dar a volta.

Távora-Varosa
Titan Daemon 666 - 2020, 666€

Luís Leocádio conhece muito bem a região de Távora-Varosa e acha que a mesma não tem a notoriedade que merece, em virtude de dar origem a uvas com grande equilíbrio entre açúcares e ácidos (pH invejavelmente baixo, coisa que oferece grande longevidade aos vinhos). Este branco teve origem em duas parcelas de vinhas com 140 anos e maioritariamente de Cerceal que, infelizmente, já não existem (é o drama das vinhas velhas), mas o enólogo anda serra acima, serra abaixo à procura de outras vinhas velhas que possam dar as uvas que deseja para produzir brancos que vivam muitos anos em garrafa. Desta colheita única nasceu um vinho com notas de frutos cítricos e flores, sendo que a boca é rica, volumosa e com uma acidez bastante marcada. Será interessante provar este vinho daqui a 10 anos. 666€

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O Titan Anna Costa

Trás-os-Montes
Segredo 6, 600€

António Costa Boal e Costinha são amigos. O primeiro é produtor há vários anos, o segundo sempre quis ter um projecto de vinhos. Juntos descobriram uma vinha velha em Trás-os-Montes com 68 anos e 4,5 hectares. É tão produtiva que, no primeiro ano, cerca de 4,5 campos de futebol de área deram 1500 litros de vinho (vá, agora já chega aos 2000 litros...). As castas são aos molhos, e, daqui, só se lançam vinhos em magnum porque, como defende António Boal, uma vinha tão velha e tão difícil tem de produzir vinhos que devem ser apreciados em encontros especiais entre familiares e amigos. E, para isso, uma magnum dá sempre mais jeito do que duas garrafas de 0,75l (além de que se pode sempre justificar melhor o valor pedido pela garrafa). A segunda colheita deste vinho parece mais elegante do que a primeira, por via de um maior conhecimento de uma vinha cujas pedras dão para estrelar um ovo no Verão com a maior das facilidades. Notas de frutos maduros, com a boca a mostrar certas sensações vegetais e frescas da Tinta Amarela e do Bastardo. Claramente, um vinho que revela o calor da região. 600€

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O Segredo 6 dr

Dão
Casa da Passarella Vindima 2011, 260€

Paulo Nunes tem uma habilidade própria para explicar o seu mundo. Vai daí diz que este Vindima 2011 resulta do desequilíbrio das sete vinhas da quinta da Passarella, querendo com isto dizer que, quando vindima cada uma das vinhas, não conta com a maturação perfeita casta a casta (são muitas), mas a riqueza distinta que cada uma vai acrescentar ao lote. E, em matéria de vinificação, é o mais rústico que se possa imaginar: fermentação espontânea em lagares com engaço e canalização do vinho para tonéis e descanso durante dois Invernos, condição fundamental para um grande vinho feito na serra da Estrela, segundo o enólogo. O resto é o tempo em garrafa que trata do assunto. O vinho é de 2011, mas parece bem mais jovem. Tem notas que quase só o Dão dá, com destaque para a caruma à mistura com frutos vermelhos. Na boca é vinho que daqui a algum tempo ficará com aquela textura aveludada da praxe. Um tinto com muito charme. 260€

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Casa da Passarella Vindima 2011 dr

Tejo
Quinta da Alorna 1723, 300€

Se há casa que pode usar a sua história para vender vinho à laia do que acontece em França ou Itália é a Quinta da Alorna, em Almeirim. De maneira que, para celebrar os 300 anos, a enóloga Martta Reis Simões foi às vinhas de sequeiro de calhau rolado na charneca – onde há milhares de anos o Tejo corria – para apanhar uvas de Alicante Bouschet, Tinta Miúda e Castelão. Uma pessoa olha para o solo destas vinhas e para os valores de produção e percebe logo por que razão alguns vinhos não podem ser baratos, visto que as produções são ínfimas e irregulares. O vinho ora revela fruta em compota, ora mineralidade, ora folhas de tabaco. Desafiante. Na boca, grande equilíbrio entre estrutura, acidez e álcool, num perfil muito internacional. 300€

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Quinta da Alorna 1723 dr

Alentejo
Susana Esteban Special Edition 2018, 230€

Susana Esteban conhece bem a casta Alicante Bouschet, aprecia-a, mas acha que não foi feita para vingar como vinho em modo varietal. Muito boa para lote, sim senhor, mas sozinha tem “um ar rústico, austero e mesmo selvagem”. Sucede que, na vindima de 2018, e para seu espanto, deu de caras, na serra de São Mamede, com um varietal de Alicante que a deixou boquiaberta pelo carácter elegante do vinho, de tal forma que vai já dizendo que não sabe quando vai voltar a encontrar tal vinho, não obstante continuar a vindimar a mesma vinha depois de 2018. São os tais mistérios da natureza. Se um clássico de Alicante Bouschet é muito impositivo, neste caso estamos perante um tinto delicado, perfumado, com aromas de bagas. Boca acetinada e notas de especiarias. 230€

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Susana Esteban Special Edition 2018 dr

Alentejo
Servas de Baccus 2016, 267€

É um bocado de La Palisse dizer-se que todos os produtores têm a sua mania. No caso de Luís Serrano Mira, são três: paixão pelo conceito de origem do vinho, paciência de santo e sinceridade a rodos. Veja-se isto. O produtor registou a marca Servas de Baccus em 2001 para carimbar o que ele considera o vinho premium da casa. Em 23 anos e outras tantas vindimas de uma parcela plantada em 1940 com Castelão, Trincadeira e Alicante Bouschet, só a de 2016 lhe encheu as medidas. Mira esteve 23 anos à espera deste vinho e, hoje, quando o avalia, diz que, se calhar, para a próxima – sabe-se lá quando – não vai usar a técnica da passagem do vinho duas vezes por barrica nova. Destaque para as notas fumadas e mentoladas, à mistura com frutos pretos. Tudo isso regressa na boca, com mineralidade e especiarias. Tinto envolvente e guloso. 267€

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Luís Mira e o Servas de Bacchus 2016 dr

Alentejo
Júpiter 2015, 1000€/1750€

Há uns anos, Pedro Ribeiro comprou 3,7 hectares de uma vinha velha que confinava com vinhas da Herdade do Rocim só porque fazia sentido não deixar aquele pedaço de terra desgarrado da propriedade. Mas entre a compra da vinha e a vindima, esqueceu-se da parcela, até que, em Setembro, o responsável da adega lhe perguntou o que fazer. “E eu disse: ó sr. Pedro, apanhe as uvas e encha aí umas talhas.” O resto é sabido. Uma das talhas revelou um perfil de vinho que Pedro Ribeiro nunca tinha cheirado e provado, pelo que foi isolado e acompanhado com cuidados numa talha durante quatro anos, até que Cláudio Martins apareceu lá na adega à procura de algo fora da caixa. E assim nasceu o Júpiter. Hoje, a mesma vinha dá origem ao Vinha da Micaela, o topo de gama do Rocim. Sempre que provamos este tinto vêm-nos à memória notas de uma casta francesa, mas será coisa da mistura entre Moreto, Trincadeira e Tinta Grossa a dar essa sensação. Há um belo pingue-pongue entre frutos e aromas mentolados. Na boca, harmonioso e sedoso. Inicialmente vendido a 1000€, no mercado estará hoje à venda por 1750€, informa o produtor.

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O Júpiter dr

Alentejo
Maese 2011, 3800€

Andrés Herrera é, a diferentes títulos, um personagem invulgar no mundo dos vinhos. É conhecido como o louco que colocou à venda o tinto mais caro do país, mas isso é apenas um detalhe. Na realidade, Andrés é uma espécie de alquimista, visto que, na adega, diverte-se a lançar vinhos que juntam inúmeras colheitas na mesma garrafa. Depois, a paixão que tem pelos vinhos de Jerez, com flor e oxidação, faz o resto. Este tinto Maese é da colheita de 2011 de uma vinha velha com Trincadeira, Castelão e Aragonês que já não controla, embora tenha 3% de Castelão da colheita de 1999. “Quando nasceu era imbebível”, diz o enólogo, pelo que foi ficando em barricas usadas dois, quatro, cinco... até chegar aos nove anos (108 meses em madeira). Fruta bastante madura e alcaçuz mostram o calor do ano de 2011. Na boca, notas mais doces, mas equilibradas pela acidez. Um tinto potente. 3800€

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Maese 2011 dr

Península de Setúbal
Casa Ermelinda de Freitas Moscatel Roxo 2010, 35€

Casta que esteve quase em extinção porque o ciclo curto fazia com que os pássaros apanhassem as uvas antes dos donos das vinhas, hoje, na sequência das criações de Domingos Soares Franco, a região voltou a plantar Moscatel Roxo com fartura. E o que Jaime Quendera e Leonor Freitas pretendem é valorizar a casta através de generosos com tempo de estágio nas barricas. Temos aqui aquela complexidade dos grandes moscatéis, com belo balanço entre aromas de passa, flores e especiarias. Boca com volume e equilíbrio entre a doçura clássica, amargos e a acidez que vai evoluindo com os anos. 35€

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Ermelinda de Freitas Moscatel Roxo 2010 dr
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