Macron viaja para a Nova Caledónia para “restabelecer o diálogo”

Austrália e a Nova Zelândia decidem repatriar turistas que estavam retidos na ilha devido ao encerramento do aeroporto na semana passada.

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Os motins começaram na semana passada na Nova Caledónia em protesto contra a reforma eleitoral proposta pelo governo central Instagram @ericpaidjan / VIA REUTERS
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O Presidente francês, Emmanuel Macron, viajará para a ilha da Nova Caledónia, no Pacífico, esta terça-feira, disse o seu gabinete, pouco mais de uma semana depois do início dos motins no território ultramarino francês, nos quais morreram seis pessoas.

A Austrália e a Nova Zelândia decidiram entretanto retirar os turistas da ilha depois de a violência ter deixado um rasto de destruição, com lojas saqueadas, carros incendiados e barricadas nas estradas que restringiram o acesso a medicamentos e alimentos.

Os protestos foram desencadeados pelo descontentamento do povo indígena kanak contra a reforma constitucional aprovada em Paris que alteraria quem pode participar nas eleições. Os líderes locais temem que a mudança dilua o impacto dos votos dos kanaks.

Macron vai reunir-se com os eleitos e representantes locais na quinta-feira para um dia de conversações centradas na política e na construção da ilha, disseram os seus assessores.

O Presidente francês “vai debater com todas as forças na Nova Caledónia”, revelou o primeiro-ministro, Gabriel Attal. “O objectivo é (...) preparar e antecipar a reconstrução”, disse.

“O Presidente também está a ir para lá para restabelecer o diálogo”, acrescentou Attal.

As reacções iniciais mostraram que a renovação do diálogo não será uma tarefa fácil, tanto mais que os líderes pró-independência responsabilizam Macron por ter feito avançar a reforma eleitoral apesar da oposição local.

“Aí vem o bombeiro depois de ter ateado o fogo!”, escreveu Jimmy Naouna, da Frente de Libertação Nacional Kanak e Socialista (FLNKS) da Nova Caledónia, na rede social X em resposta às notícias sobre a visita de Macron.

A França anexou a Nova Caledónia em 1853 e conferiu à colónia o estatuto de território ultramarino em 1946. A Nova Caledónia é o terceiro maior produtor mundial de níquel, mas o sector está em crise e um em cada cinco habitantes vive abaixo do limiar da pobreza.

A ilha situa-se a cerca de 20 mil quilómetros da França continental e a cerca de 1500 quilómetros a leste da Austrália e há muito tempo que é abalada por movimentos pró-independência. A violência desencadeada na semana passada foi o pior surto dos últimos 40 anos.

A oposição em Paris, ex-primeiros-ministros franceses e dirigentes de outras ilhas do Pacífico disseram que Macron deveria descartar ou suspender a reforma eleitoral, que o Parlamento aprovou na terça-feira passada.

O ministro dos Negócios Estrangeiros de Vanuatu, Matai Seremaiah, instou a França a “fazer o que está certo, a resolver todas as questões pendentes de descolonização” e a dialogar seriamente com os líderes kanaks.

Austrália e Nova Zelândia retiram turistas

Cerca de 108 australianos e outros turistas aterraram em Brisbane em dois voos do Governo, informou a ministra dos Negócios Estrangeiros australiana, Penny Wong, na rede social X. Um avião da Força de Defesa aterrou em Auckland com cerca de 50 pessoas a bordo, informou o New Zealand Herald.

Nos próximos dias são esperados mais voos para retirar um total de cerca de 500 turistas franceses e estrangeiros, informou o Alto Comissariado francês na Nova Caledónia.

Ao chegar a Brisbane, a turista australiana Mary Hattensa disse que tinha ficado em grande parte do tempo confinada ao seu hotel. “O local estava uma confusão”, contou à estação de televisão Australian Broadcasting Corporation.

Chris Salmon, que trabalha na indústria mineira na Nova Caledónia, abraçou a sua família e disse estar aliviado por ter deixado a ilha francesa. “É uma sensação horrível, sem sentido”, revelou.

O aeroporto, encerrado desde o início dos tumultos, permanece fechado para voos comerciais.

Cerca de 3200 pessoas estavam à espera de sair ou entrar na Nova Caledónia após os voos comerciais terem sido cancelados na semana passada devido aos distúrbios, informou o governo local.

As autoridades australianas explicaram que os passageiros estavam a ter prioridade com base na necessidade. Os que não puderam embarcar ficaram frustrados, disse o australiano Benen Huntley, em lua-de-mel com a esposa, Emily.

“A minha mulher está muito perturbada, só queremos ir para casa”, revelou numa entrevista telefónica. Abrimos a porta do nosso hotel esta manhã e podia-se ver uma enorme nuvem de fumo a sair de um edifício ao longe.

Mais de mil gendarmes e polícias franceses foram colocados em patrulha e outros 600 serão ainda enviados, declarou o Alto Comissariado francês.

Três das seis pessoas mortas durante os distúrbios eram jovens kanaks baleados por civis armados, e houve confrontos entre manifestantes kanaks e grupos armados de autodefesa ou milícias civis formadas para se protegerem.

O Governo francês não sabe como controlar as pessoas aqui”, contou Viro Xulue, que faz parte de um grupo comunitário que presta assistência social a outros kanaks.

A situação no terreno estava a melhorar, mas era preciso fazer muito mais, disse a porta-voz do Governo francês, Prisca Thevenot.