Tribunal de Contas rejeita compra de medicamentos a IPO de Coimbra por falta de financiamento

Este é um problema que decorre da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, para o qual o Tribunal de Contas tem alertado desde 2018.

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Nos últimos anos, o Tribunal de Contas rejeitou vistos a vários hospitais para aquisição de medicamentos e outros serviços por falta de fundos financeiros disponíveis Daniel Rocha
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O Tribunal de Contas (TdC) recusou o visto prévio a dois contratos do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Coimbra para aquisição de medicamentos para o tratamento de cancro. O motivo, explica o TdC, deve-se “à inexistência de fundos disponíveis para suportar as despesas assumidas”. Este é um problema que decorre da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso (LCPA), introduzida durante a intervenção da troika, e para o qual o tribunal tem alertado desde 2018.

“Esta é uma matéria que tem suscitado muita preocupação do Tribunal, que apela, mais uma vez, à ponderação de uma solução legislativa adequada que resolva o problema da falta de fundos disponíveis no Serviço Nacional de Saúde (SNS), sob pena de o Tribunal de Contas ter de continuar a recusar o visto a contratos que não satisfaçam esta obrigação legal”, pede o TdC, na nota enviada nesta segunda-feira às redacções.

O PÚBLICO enviou questões ao Ministério da Saúde, mas não obteve resposta até à conclusão desta notícia.

De acordo com a Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, nenhuma despesa pode ser autorizada se o hospital não demonstrar que tem fundos disponíveis no momento em que assume o compromisso e no futuro, durante o período programado para o pagamento. No caso do IPO de Coimbra, estão em causa dois contratos para aquisição de medicamentos para tratamentos oncológicos, para os quais o TdC concluiu não haver fundos disponíveis e por isso recusou os vistos.

Um dos concursos foi celebrado a 23 de Fevereiro deste ano, para vigorar até 31 de Dezembro, para a aquisição de um medicamento para o tratamento do cancro da próstata, no valor de um milhão e duzentos mil euros (acrescido de IVA). O outro concurso em causa foi para a aquisição de um medicamento para o tratamento de cancro da mama, com o valor de 960 mil euros (acrescido de IVA), celebrado a 6 de Março e para vigorar também até ao final deste ano.

Problema “está ligado ao financiamento”

Salientando que “não se põe em causa a imprescindibilidade da aquisição” destes medicamentos, o TdC afirma que “tem vindo a ser sucessivamente confrontado com a falta de fundos disponíveis no que toca a instituições que integram o Serviço Nacional de Saúde”. E diz ficar claro “do elenco de factos provados”, nos dois acórdãos divulgados nesta segunda-feira, que o IPO de Coimbra “não dispõe de dotação orçamental suficiente que lhe permita suportar” os compromissos assumidos.

Um facto que o IPO reconhece nas respostas que enviou ao TdC. “Atendendo que o plafond atribuído tem sido insuficiente para acomodar as despesas assumidas do próprio ano, bem como as transitadas do ano anterior, denota-se que existem evidências claras de um subfinanciamento, nomeadamente para fazer face às despesas no âmbito das aquisições de medicamentos do foro oncológico, que têm vindo a crescer, nos últimos anos, e o referido plafond não tem acompanhado esse crescimento.”

Referindo que a questão não se coloca na existência de normas financeiras, o TdC afirma que “o problema é a montante e está ligado ao financiamento”. Um problema “que é do perfeito conhecimento da tutela e que, não obstante isso, se tem mantido permanente ao longo dos anos”.

“Esta situação assume especial gravidade face ao serviço essencial que é prestado pela requerente [neste caso o IPO de Coimbra], tendo a tutela governativa total consciência de que tal serviço não pode ser interrompido sem que direitos fundamentais – constitucionalmente protegidos – dos cidadãos (desde logo, o direito à saúde e mesmo o direito à vida) sejam seriamente postos em causa”, destaca o TdC, que reitera “o alerta a altos responsáveis pela gestão do Estado, directa ou indirectamente participantes no processo, para que autorizem a alteração de dotações dentro do orçamento da entidade, caso seja possível, ou então a financiem de forma suficiente com a criação das necessárias dotações que permitam realizar esta despesa essencial”.

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