Miradouro de Siza em Oleiros: entre a escarpa e as nuvens

Exemplos de miradouros haverá para todos os gostos. Alguns mais contidos, outros mais extravagantes, espalhados pelos cinco continentes. Em comum está o olhar deslumbrado sobre os elementos naturais.

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Miradouro do Zebro, projecto do arquitecto Álvaro Siza Vieira, na Serra do Muradal Miguel Manso
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Miradouro do Zebro, projecto do arquitecto Álvaro Siza Vieira, na Serra do Muradal Miguel Manso
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Inaugurou no passado 25 de Abril e deu que falar: uma plataforma de 15 metros de diâmetro que eleva os visitantes sobre um vale com mais de 150 metros de profundidade.

O miradouro do Zebro aparece como um círculo de betão que pousa levemente na escarpa. Correndo em baixo, a ribeira das Casas da Zebreira faz qualquer pessoa sentir-se pequena, e a imagem das nuvens no vale convida à descoberta de uma região martirizada pela distância aos grandes centros urbanos e pelos incêndios.

O desenho de Siza Vieira já antes tinha saltado para aquela região: na inauguração da torre de vigia da serra de Sarnadas, em Proença-a-Nova, vozes levantaram-se sobre a escala da estrutura, o custo da obra, e a sua integração numa paisagem que antes parecia intocada. Mas obras deste género, nos olhares que lançam no território, prometem deixar lugares esquecidos no mapa, aumentar a consciência ambiental de novas gerações e ajudar a desenvolver o interior.

À memória vêm os já famosos passadiços do Paiva, que criaram uma febre só comparável à dos baloiços e das rotundas, num país que se quer revestir do Minho ao Algarve com intervenções para todos os gostos, que seguem os mesmos pressupostos: o que esperar do miradouro de Oleiros? Haverá uma nova vaga de inaugurações?

Nas primeiras reacções, o miradouro do Zebro foi incompreendido: até mesmo nos jornais, foi apelidado de disco que ali "aterrou", num comentário que parece pejorativo. Mas a obra de Siza liga-se firmemente a projectos do modernismo, bem como miradouros há muito construídos noutros países. Nas curvas e contracurvas da guarda de betão, lembra os terraços de Le Corbusier, em Vila Savoye e na Unidade de Habitação de Marselha.

No Mirador del Río, o arquitecto César Manrique revestiu um edifício de pedras vulcânicas, confundindo-o com a paisagem agreste da ilha de Lanzarote. Noutro projecto completamente diferente, Saarschleife, na floresta negra alemã, uma rampa em caracol entrega a vista a toda a volta, ao lado e acima das copas das árvores. E em Da Nang, no Vietname, uma ponte pedonal dourada passa entre mãos gigantes, esculpidas em betão, ensaiando uma aproximação ao kitsch.

Exemplos de miradouros haverá para todos os gostos. Alguns são mais contidos, outros mais extravagantes, hoje espalhados pelos cinco continentes. Em comum está um olhar deslumbrado sobre os elementos naturais, em paisagens mais ou menos humanizadas.

A instagramização das viagens certamente deu um novo impulso a estruturas tipologicamente mais antigas, que remontam à descoberta do mundo natural, no auge do romantismo, e também à democratização das viagens, em particular do automóvel. Com a chegada do automóvel a praticamente qualquer lugar, abriram-se novas possibilidades: chegam as estradas cénicas, que deixam uma marca duradoura na paisagem, ligando miradouros em rede.

Até mesmo na actualidade, em países como a Noruega, a rede nacional de estradas constrói miradouros e equipamentos de descanso e fruição da paisagem. Só no presente ano de 2024, novas obras foram projectadas e inauguradas: resultam da estreita colaboração entre a Administração Pública das Estradas (Statens vegvesen), a Direcção do Património Cultural (Riksantikvaren), a Direcção para a Natureza (Miljødirektoratet) e o Ministério do Turismo e Comércio (Nærings- og fiskeridepartementet).

Este modelo de colaboração pode ser um exemplo para Portugal, país tão conhecido pelas estradas cénicas, do Gerês ao Douro, da Madeira ao Pico. A obra inaugurada no Zebro, em Oleiros, permanece entre a escarpa e as nuvens, num equilíbrio precário. No lado da escarpa, está o risco da obsessão pelos eventos, da eventologia, que reveste redes sociais e traz hordas de visitantes mas sem deixar marcas relevantes.

Do outro lado, nas nuvens e no céu que se abre, está a promessa de ver a arquitectura portuguesa reconhecida, de criar novas obras, de novos arquitectos, conhecidos ou emergentes, que funcionem em rede e dêem visibilidade a territórios esquecidos ou fragmentados. Só o futuro irá revelar que novas paisagens irão os miradouros alcançar.

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