Um deputado pode dizer que uma “raça ou etnia é mais burra”? Aguiar-Branco diz que “pode”

Se um deputado “disser que uma determinada raça ou etnia é mais burra ou preguiçosa também pode?”, questionou o PS, depois de um comentário do Chega sobre o povo turco. Aguiar-Branco diz que “pode”.

Foto
"Não serei eu nunca a cercear a liberdade de expressão", afirmou o presidente da Assembleia da República Daniel Rocha
Ouça este artigo
00:00
03:43

O presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco disse, esta sexta-feira, que recusa ser censor e limitar a liberdade de expressão dos deputados, uma visão que foi contestada por PS, Bloco de Esquerda e Livre e aplaudida de pé pela bancada do Chega.

O incidente no debate sectorial com o ministro das Infra-Estruturas e Habitação começou com uma intervenção do líder do Chega, André Ventura, que, ao questionar os dez anos previstos para a construção do novo aeroporto, disse o seguinte: "Podemos ser muito melhores que os turcos, que os chineses, que os albaneses, vamos ter um aeroporto em cinco anos."

"O aeroporto de Istambul foi construído e operacionalizado em cinco anos, os turcos não são propriamente conhecidos por ser o povo mais trabalhador do mundo", tinha começado por dizer Ventura, sob protestos de várias bancadas, com Aguiar-Branco a pedir para o deixarem continuar a sua intervenção porque "o deputado tem liberdade de expressão para se exprimir".

De imediato, o líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Fabian Figueiredo, pediu a palavra para defender que "atribuir características e estereótipos a um povo não deve ter espaço no debate democrático da Assembleia da República" e pediu desculpas ao embaixador da Turquia.

Na resposta, o presidente da Assembleia da República disse discordar desta visão. "Não concordo, porque o debate democrático é cada um poder exprimir-se exactamente como quer fazê-lo. Na opinião do presidente da Assembleia, os trabalhos estão a ser conduzidos assegurando a livre expressão de todos os deputados, não tem a ver com o que penso pessoalmente, não serei eu o censor de nenhum dos deputados", afirmou.

A líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, pediu também a palavra para questionar "se uma determinada bancada disser que uma determinada raça ou etnia é mais burra ou preguiçosa também pode?"

"No meu entender, pode. A liberdade de expressão está constitucionalmente consagrada. A avaliação do discurso político que seja feita aqui nesta casa será feita pelo povo em eleições", respondeu o presidente da Assembleia da República.

Aguiar-Branco propôs que "se houver alguém que acha que deve ser feita censura à intervenção dos deputados recorre da decisão do presidente da Assembleia". "E aí o plenário é que fará a censura, não serei eu", disse.

Isabel Mendes Lopes, líder parlamentar do Livre, pediu a palavra para sublinhar que "o racismo é crime" e que o que é dito no Parlamento "tem consequência directa na vida das pessoas".

"Não vou dar continuidade a este tema, a Assembleia tem inúmeros mecanismos regimentais para exprimir a sua opinião. Uma coisa pode ter a certeza, não serei eu nunca a cercear a liberdade de expressão", disse Aguiar-Branco, numa intervenção aplaudida de pé pela bancada do Chega.

Antes, Ventura já se tinha desviado do tema do debate, ao criticar que a Assembleia da República tenha tido esta noite a fachada iluminada para assinalar o Dia Nacional contra a Homofobia e a Transfobia, dizendo que "o Parlamento está sequestrado pela linguagem woke". "Queria lamentar muito que todos os partidos tenham entrado nesta lógica", criticou André Ventura, com o líder parlamentar do CDS-PP Paulo Núncio a sinalizar que o seu partido também esteve contra esta decisão do Parlamento.

Na noite de quinta para sexta-feira, a fachada do Palácio de São Bento esteve iluminada com a bandeira arco-íris, de forma a assinalar a luta contra o preconceito e a defesa dos direitos de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transgénero e intersexo (LGBTI). A 17 de Maio celebra-se o Dia Internacional de Luta contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia, que pretende valorizar a igualdade entre as pessoas, independentemente da sua orientação sexual, assim como alertar para a discriminação contra as pessoas LGBTI.

André Ventura disse que esta sexta-feira também é Dia Mundial da Hipertensão e tal não foi assinalado pelo Parlamento. "Tivemos um Dia dos Antigos Combatentes, não vi esta fachada iluminada, nem pelos profissionais de saúde ou forças de segurança", disse.

Sugerir correcção
Ler 231 comentários