Rui Moreira pede extinção da AIMA e condena “ataque inaceitável” a imigrantes no Porto

Suspeitos de ataques têm ligações a grupo neonazi 1143 que há um mês se manifestou no Porto. Autarca nega ter responsabilidades em matéria de segurança. AIMA diz estar a acompanhar imigrantes.

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Na madrugada de sexta-feira, encapuzados forçaram a entrada em casa de imigrantes no Porto e agrediram-nos com paus Paulo Pimenta (arquivo)
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O presidente da Câmara do Porto considera que a autarquia “não é o Estado” e, por isso, “não tem responsabilidades sobre a segurança”. No início da reunião do executivo desta segunda-feira, Rui Moreira leu uma declaração para condenar o “ataque inaceitável” a imigrantes na madrugada de sexta-feira. Classificando o ocorrido como “crime odioso”, disse confiar nas autoridades policiais e criticou o que considera ser a inoperância da Agência para Integração de Migrantes e Asilo (AIMA).

A conversa, estendida à vereação, acabaria por se transformar num debate sobre a imigração, com Rui Moreira a atacar o Bloco de Esquerda, que se opôs à ideia de que o município nada tem a fazer em relação a esta matéria. “Fiquei surpreendida quando disse que não tinha nada a fazer”, apontou Maria Manuel Rola, recordando que o movimento de Rui Moreira reprovou um plano de integração de pessoas migrantes em 2022 e a criação de um conselho municipal para as comunidades migrantes. “A câmara pode e deve fazer mais do que faz na integração e no apoio de quem trabalha nesta cidade e a quem vive em quartos sobrelotados em situações inaceitáveis.”

Rui Moreira considerou o argumento “populista e demagógico”, recordando que a Câmara do Porto tem um projecto de mediação intercultural, um serviço municipal de atendimento para pessoas migrantes e um programa de empregabilidade para essas pessoas. “Temos um Estado exíguo que leva a que pessoas em situação de carência e aflição tomem estas atitudes. Não sabemos se foi isso que sucedeu no Bonfim.”

Em complemento, e respondendo a perguntas do PÚBLICO, o gabinete de comunicação especificou que o município promove o projecto Porto_4_All, de integração de migrantes no mercado profissional, desde 2021. As pessoas que mais procuram o programa vêm da Ucrânia, do Brasil, da Colômbia e do Bangladesh.

Tiago Barbosa Ribeiro, vereador socialista, lamentou o “jogo do empurra” de responsabilizações e pediu que o debate se centrasse na condenação ao “acto violentíssimo” ocorrido na freguesia do Bonfim. “Não consigo sequer perceber o debate que parece gerar-se que não tem que ver com o acto em si.”

Antes, a vereadora social-democrata Mariana Ferreira Macedo havia sublinhado o “aumento gradual da criminalidade e sentimento de insegurança” na cidade e comentado a possibilidade de este acto ter sido um “ajuste de contas”. "Significa que as pessoas deixam de acreditar na justiça e fazem justiça com as próprias mãos.”

A vereadora recusou a ideia de Portugal ser um país racista e disse haver “uma ausência de estratégia e de políticas de imigração” que conduziu a uma “sensação de que tudo é possível e de que as nossas fronteiras estão escancaradas”.

Também Rui Moreira criticou a política de imigração, dizendo que “desmontar o SEF foi um erro”. “Há dezenas de milhares de imigrantes que não conseguem ver regularizada a sua situação. Isto é uma competência desta agência [AIMA].”

Na sua declaração, o autarca disse que a Câmara do Porto tinha sido contactada pela AIMA, que quis saber o que poderia o município fazer no seguimento deste acontecimento. Moreira considerou a pergunta abusiva e deixou uma sugestão ao Governo: “Começaria por extinguir a AIMA e utilizar os recursos de que dispõe para habilitar os municípios a darem uma resposta, mas também a reforçar as forças policiais dos recursos de que hoje não dispõem para combater a criminalidade.”

AIMA está a acompanhar

Ao PÚBLICO, a AIMA explicou, através do seu gabinete de comunicação, que o contacto com a Câmara do Porto foi feito “com a perspectiva de obter mais informação e promover actuações concertadas”. Sem comentar as declarações de Rui Moreira, a agência repetiu que “condena e repudia os actos de violência” em causa e manifesta “total solidariedade com as vítimas”.

Desde sexta-feira, acrescentou, está a “acompanhar os acontecimentos”, em contacto com todas as entidades envolvidas, de forma a “prestar todo o apoio necessário no âmbito das atribuições da agência”. Esta entidade recorda, por fim, o “contributo essencial das pessoas migrantes para a robustez da nossa sociedade, da nossa cultura, da nossa demografia e da nossa economia”.

Em Dezembro de 2023, um relatório do Observatório das Migrações dava conta de que, "sem os imigrantes, alguns sectores económicos entrariam em colapso” em Portugal. Além disso, os imigrantes foram responsáveis por um saldo positivo de 1604,2 milhões de euros da Segurança Social e contribuíram com 1861 milhões de euros para a Segurança Social. No total, os estrangeiros representaram 13,5% dos contribuintes do sistema.

Na reunião privada, sem espaço para perguntas dos jornalistas, Rui Moreira, que considerou que o sistema de videovigilância da cidade foi útil neste caso, voltou a referir a existência de um “clima de insegurança”, não só na zona onde aconteceram os ataques, mas em toda a cidade. O PÚBLICO solicitou ao gabinete de comunicação dados concretos sobre a segurança na cidade, e a sua relação com a imigração, mas ainda aguarda resposta.

Ilda Figueiredo, da CDU, sublinhou também os “focos” de insegurança da cidade, não circunscritos à freguesia do Bonfim, e pediu uma intervenção “de todos, câmara incluída”, para que acontecimentos como o da passada sexta-feira não se repitam. A vereadora comunista sublinhou ainda a acção indirecta necessária, nomeadamente em matéria de acção social e habitação, para que problemas destes não repitam.

Tal como o PÚBLICO adiantou nesta segunda-feira, os seis homens já detidos no seguimento dos ataques referidos são conotados pelas autoridades como pertencentes ao grupo 1143, de ideologia nacionalista e neonazi e liderado pelo condenado Mário Machado. Esse mesmo grupo organizou há um mês uma manifestação no Porto, com o lema “Menos Imigração, Mais Habitação”, autorizada pelas autoridades e pela Câmara do Porto.

O PÚBLICO questionou o gabinete se considera, à luz dos novos desenvolvimentos, ter tomado a opção certa ao autorizar, sem sequer tentar opor-se, a referida manifestação. Na altura, a autarquia alegou não ter margem para recusar o evento. Agora prefere não responder, afirmando que “entende como uma provocação” as perguntas – tanto em relação à manifestação como em relação a dados concretos sobre a segurança na cidade.

Alguns constitucionalistas têm corroborado essa posição, argumentando que o direito à manifestação é absoluto. Outros, porém, têm defendido exactamente o contrário, sustentando que, se a manifestação atentar contra direitos constitucionais, pode ser impedida.

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