Rio diz que Montenegro deve demitir Lucília Gago; Costa não vê vantagem que vá à AR

Nas reacções ao manifesto que acusa Ministério Público de funcionar sem escrutínio, há quem recorde que vários dos seus signatários já governaram o país sem nada terem feito no capítulo da justiça.

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A decisão de convidar personalidades para o Conselho de Estado compete ao Presidente da República Rui Gaudêncio
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O ex-presidente do PSD Rui Rio defende que o primeiro-ministro, Luís Montenegro, deve demitir a procuradora-geral da República. Sobre Lucília Gago o antigo líder social-democrata diz ser alguém que não dá qualquer explicação, que tem um comportamento arrogante, tem até um comportamento prepotente” que “não é compaginável com aquilo que deve ser o comportamento numa democracia estabilizada e normal”. O ex-líder do PS António Costa não vê vantagem em que Lucília Gago vá ao Parlamento dar explicações sobre a Operação Influencer.

Lucília Gago está “muito, mas muito longe do perfil que se exige para aquele cargo, defendeu Rui Rio em declarações à SIC Notícias. O antigo presidente da Câmara do Porto, ex-deputado e ex-presidente do PSD afirmou que é impossível tirar do lugar um procurador-geral da República que resolva atacar um governo, com boas ou más intenções, não interessa. Como é que um governo que está a ser atacado pela Justiça pode dizer: ‘Tirem a senhora ou o senhor’? Não pode. Fica logo bloqueado aí, admitiu Rui Rio, que é um dos 50 subscritores do manifesto que pede aos órgãos de soberania uma reforma da justiça e para os quais este sector funciona “quase inteiramente à margem de qualquer escrutínio ou responsabilidade democráticos”.

Mas deixou a solução no ar: O governo que vem a seguir já o poderia fazer. Se não o faz... tem de perguntar ao Governo que está neste momento em funções porque é que não o faz. Eu não sou do Governo para lhe responder a isso.

Já o antigo presidente da Assembleia da República Ferro Rodrigues quer que o Conselho de Estado se reúna com a presença da procuradora-geral da República, Lucília Gago, para debater a “situação gravíssima” que se vive na justiça portuguesa. O também antigo secretário-geral do PS é outro dos 50 signatários do manifesto que acusam o Ministério Público de exercer “um poder sem controlo, desde logo pela assumida desresponsabilização da procuradora-geral da República pelas investigações”.

O socialista Augusto Santos Silva e o social-democrata Mota Amaral, que também presidiram ao Parlamento, estão igualmente entre o grupo de notáveis responsáveis por este “sobressalto cívico”, que reúne outros nomes como o do ex-presidente do Tribunal Constitucional João Caupers, o advogado Daniel Proença de Carvalho, o constitucionalista Vital Moreira, o ex-ministro da Educação David Justino e o investigador e cronista José Pacheco Pereira. Da lista de 50 personalidades fazem ainda parte o anterior líder do CDS Francisco Rodrigues dos Santos, e os ex-ministros Leonor Beleza, Fernando Negrão, António Vitorino, José Vieira da Silva, António Barreto, Correia de Campos, Alberto Costa, António Pinto Ribeiro, Maria de Lurdes Rodrigues.

“Há uma situação gravíssima na justiça e havia todo o interesse em que o Conselho de Estado fosse convocado com a presença da senhora procuradora-geral da República”, defendeu Ferro Rodrigues, esta sexta-feira, em entrevista à CNN. “Hoje temos uma procuradora-geral da República que se desresponsabiliza e que diz que os processos estão entregues a este ou aquele procurador e que eles é que têm de responder. Isto não pode continuar.”

“Este manifesto não é sobre o caso de António Costa, embora a queda de um governo às mãos de um comunicado da Procuradoria-Geral da República seja um caso exemplar dos riscos que nós temos de não separação de poderes”, afirmou, por seu turno, Augusto Santos Silva à RTP3.

“Hoje em dia abrem-se investigações sem indícios e que, na primeira vez que são confrontadas num tribunal, se verifica serem muito frágeis”, acrescentou, alertando para os perigos de “condenar moralmente e civicamente as pessoas nos meios de comunicação social”.

“Criou-se uma ideia segundo a qual qualquer pessoa no exercício de funções públicas é, por si só, suspeita”, lamentou também este antigo ministro socialista e ex-presidente da Assembleia da República.

Recusando-se a comentar o manifesto, em declarações à CNN Portugal o ex-primeiro-ministro António Costa mostrou-se, ainda assim, avesso a que Lucília Gago vá à Assembleia da República dar explicações sobre o caso Influencer ou outro processo concreto, dado o perigo de violação da separação de poderes. Já Rui Rio considera que essa ida ao Parlamento da procuradora-geral seria “um mal menor”, lembrando que há vários antecessores que lá foram várias vezes. O antigo líder do PSD afirma que até “deviam ir mais vezes” porque a política criminal, tal como a económica, financeira a de saúde, de educação ou a política externa são definidas “por quem o povo elege”. “O procurador-geral deve ir ao Parlamento prestar contas da forma como está a executar a política criminal democraticamente decidida por quem o povo votou [o Governo e a Assembleia].”

Sindicatos criticam manifesto fora de tempo

Do lado dos sindicatos de funcionários judiciais a reacção à iniciativa não foi a mais acolhedora. “Este abaixo-assinado parece fora de tempo e parece mais agenda política do que outra coisa, porque quando puderam contribuir para a reforma da justiça os subscritores não o fizeram”, critica o presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais António Marçal, que abre uma excepção para o ex-líder do PSD Rui Rio, o único que admite ser crítico do funcionamento do sistema de justiça há mais tempo.

De resto, observa, a posição dos subscritores do documento peca por tardia e é “também de alguma forma suspeita por surgir só agora em reacção a casos concretos, como o processo Influencer e o caso da investigação na Madeira: foi preciso haver processos contra gente poderosa para que surgisse um manifesto assinado também por gente poderosa. Já o presidente do Sindicato dos Oficiais de Justiça, Carlos Almeida, recorda que os dois órgãos que governam a magistratura têm no seu seio membros indicados pela Assembleia da República e pelo Presidente da República.

No Parlamento, o líder do Chega vê no documento subscrito pelas 50 personalidades “um pedido do sistema político central a dizerem: ‘Controlem lá a justiça, porque isto está a causar-nos problemas.’” Para acrescentar: “Já sabíamos, quando a Operação Influencer foi desencadeada, que a justiça estaria sob o ataque como nunca esteve antes, provavelmente desde o processo Casa Pia.”

Já o Bloco de Esquerda revê-se nas preocupações expressas no documento, tendo-se mostrado “muito disponível” para debater “uma reforma da justiça” que considera ser necessária. O líder parlamentar dos bloquistas, Fabian Figueiredo, referiu que o manifesto junta “muita gente que está muito distante” deste partido, com signatários “do campo da esquerda, muitos do campo da direita, da área da política, da área do direito, uns com percurso como magistrados, outros como conhecidos juristas”.

O deputado comunista António Filipe é outro dos que recordam que alguns dos subscritores do manifesto tiveram grandes responsabilidades na governação do país, designadamente na área da justiça e que nessa altura não levaram à prática aquilo que agora reivindicam. Ainda assim, “são opiniões que devem ser consideradas.

O PCP não se eximirá à reflexão que é necessário fazer sobre o funcionamento da justiça, sendo que para nós há princípios fundamentais que não devem ser lesados, designadamente a independência do poder judicial, a autonomia do Ministério Público e o respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos, avisou o parlamentar.

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