Arizona revoga lei de 1864 que proibia aborto em qualquer fase da gravidez

Lei foi revogada com o apoio de um pequeno grupo de legisladores do Partido Republicano, em mais um sinal da importância do tema para as próximas eleições nos EUA.

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Stephanie Stahl-Hamilton, congressista do Partido Democrata no Arizona e uma das defensoras da legalização do direito ao aborto Liliana Salgado / REUTERS
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Os legisladores do estado norte-americano do Arizona revogaram uma lei antiaborto que foi aprovada há 160 anos e que proibia o aborto em quase todas as situações, incluindo em casos de violação ou incesto. A decisão, que é vista como mais um sinal de que o debate sobre o direito ao aborto nos EUA pode influenciar o resultado da próxima eleição presidencial, contou com o apoio crucial de um pequeno grupo de congressistas e senadores estaduais do Partido Republicano.

A proposta para a revogação da lei foi aprovada no Senado do Arizona com 16 votos a favor e 14 votos contra, numa câmara onde os republicanos têm uma maioria de 16-14. A revogação foi aprovada porque dois senadores do Partido Republicano — Shawnna Bolick e T. J. Shope — juntaram-se aos 14 senadores do Partido Democrata no momento da votação.

Este apoio republicano já tinha sido decisivo aquando da votação na Câmara dos Representantes do Arizona, onde o Partido Republicano tem também uma curta maioria, de 31-29. Nessa ocasião, na semana passada, a proposta de revogação foi aprovada por todos os 29 congressistas do Partido Democrata e por três congressistas do Partido Republicano.

Numa reacção à votação no Senado, na quarta-feira, a governadora do Arizona, Katie Hobbs, disse que vai promulgar a revogação "rapidamente", o que deverá acontecer até ao final da semana. Hobbs, do Partido Democrata, disse num comunicado que a revogação da lei "é essencial para proteger a vida das mulheres e marca o início da luta pela protecção da saúde reprodutiva" no Arizona.

A lei em causa, que foi aprovada em 1864, durante a Guerra Civil norte-americana — e numa altura em que o Arizona não era ainda um estado de pleno direito dos EUA —, vai ser oficialmente revogada a 10 de Agosto, três meses após a interrupção dos trabalhos da assembleia legislativa do estado, com início a 10 de Maio.

Até lá, e pelo menos até às eleições de Novembro, ficará em vigor uma lei que foi aprovada em 2022 e que proíbe o aborto a partir das 15 semanas de gravidez — uma lei menos radical do que a de 1864, mas que é muito contestada pelo Partido Democrata devido à ausência de excepções para casos de violação e de incesto.

A situação pode sofrer uma nova reviravolta em Novembro, quando os eleitores do Arizona forem chamados a votar num referendo que propõe incluir uma cláusula de protecção do direito ao aborto na Constituição do estado. Se o "sim" ganhar, o direito ao aborto vai passar a ser um direito fundamental no Arizona, e os legisladores só vão poder aprovar leis que restrinjam o acesso à prática a partir do momento em que o feto for capaz de sobreviver fora do útero, o que acontece por volta das 24 semanas.

A fasquia da viabilidade fetal foi lei em todo o território dos EUA entre 1973 e 2022, quando o Supremo Tribunal do país anulou uma decisão conhecida como "Roe v. Wade". Na sequência da nova interpretação constitucional dos juízes do Supremo Tribunal, anunciada no Verão de 2022, os estados norte-americanos ficaram livres para restringir o direito ao aborto em qualquer fase da gravidez; desde então, os estados onde as assembleias legislativas são de maioria republicana aprovaram leis que proíbem o aborto desde o momento da concepção ou a partir de um limite inferior ao que esteve em vigor até 2022 (entre as seis e as 18 semanas de gravidez).

No caso do Arizona, a maioria republicana aprovou em 2022 uma lei que proíbe o aborto a partir das 15 semanas e que não inclui excepções para casos de violação ou incesto. Na altura, os legisladores republicanos deixaram explícito que a nova lei não iria revogar automaticamente a lei de 1864, deixando essa questão para o Supremo Tribunal do Arizona.

A decisão judicial foi anunciada no início de Abril, com os juízes do Supremo Tribunal do Arizona a decidirem que a lei centenária se sobrepõe à lei de 2022, o que deu origem à proposta de revogação que foi aprovada esta semana.

O apoio de alguns republicanos à revogação da lei de 1862 no Arizona volta a expor um desentendimento no seio do partido, ao nível nacional, sobre o futuro do direito ao aborto. Em sentido contrário aos defensores de fortes restrições, os eleitores de alguns estados de maioria conservadora — como o Kansas, o Kentucky, o Montana e o Ohio — aprovaram, em referendo, uma cláusula que protege o direito ao aborto nas respectivas Constituições; e outros — como o Arizona, a Florida ou o Arcansas — podem fazer o mesmo nas eleições de Novembro.

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