Actividade física provoca inúmeras alterações celulares e moleculares que ajudam na saúde
É o primeiro mapa de um organismo inteiro que analisa os efeitos do exerício físico em vários órgãos. A resposta do corpo ao exercício prolongado é mais abrangente do que se pensava até aqui.
Um novo estudo realizado por cientistas norte-americanos confirma que a actividade física provoca inúmeras alterações celulares e moleculares nos órgãos com benefícios para a saúde. Os benefícios do exercício físico para a saúde já eram bem conhecidos, mas ainda não está totalmente compreendido como alteram o corpo a nível molecular.
A nova investigação, publicada em dois artigos científicos na revista Nature desta semana, foi realizada em ratos e foram estudados 19 órgãos. Os resultados demonstram que a resposta do corpo ao exercício prolongado é mais complexa e abrangente do que se pensava anteriormente.
A actividade física prolongada nesses animais causou alterações profundas no ARN, nas proteínas e nos metabolitos de quase todos os tecidos, fornecendo pistas para muitos problemas humanos.
Para chegar a estas conclusões, os cientistas utilizaram uma série de técnicas laboratoriais para analisar alterações moleculares em ratos submetidos a semanas de exercício intenso.
Os cientistas estudaram vários tecidos, como coração, cérebro e pulmões, e descobriram que cada um dos órgãos mudava com o exercício, ajudando o corpo a regular o sistema imunitário, a responder ao stress e a controlar vias relacionadas com doenças inflamatórias do fígado, doenças cardíacas e tecidos.
A investigação foi liderada pelo consórcio MoTrPAC (Consórcio de Transdutores Moleculares de Actividade Física) e a Universidade de Stanford, tendo participado cientistas do Instituto Broad (que reúne o Instituto Tecnológico do Massachusetts e a Universidade de Harvard), bem como os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos.
"Este é o primeiro mapa de um organismo inteiro que analisa os efeitos do treino em vários órgãos. Os recursos obtidos serão extremamente valiosos e já produziram muitas perspectivas biológicas potencialmente novas para exploração adicional", enfatizou Steve Carr, do Instituto Broad.
De acordo com Natalie Clark, cientista computacional do Instituto Broad, "há uma variedade de experimentações diferentes nos mesmos tecidos e isso deu uma visão global de como todas essas diferentes camadas moleculares contribuem para a resposta ao exercício".
Uma surpresa no fígado
No total, foram realizados quase dez mil testes para fazer cerca de 15 milhões de medições em sangue e 18 tecidos sólidos, explicou, em comunicado, o Instituto Broad.
Os cientistas descobriram que o exercício afectou milhares de moléculas, com as mudanças mais extremas ocorrendo na glândula adrenal, que produz hormonas que regulam muitos processos importantes, como imunidade, metabolismo e pressão arterial.
A investigação permitiu observar diferenças por sexo em diversos órgãos, principalmente em relação à resposta imunitária. A maioria das moléculas de sinalização imunitária exclusivas das mulheres mostraram alterações nos seus níveis entre uma e duas semanas de treino, enquanto as dos homens mostraram diferenças entre quatro e oito semanas.
Para sua surpresa, os cientistas encontraram um aumento na acetilação de proteínas mitocondriais, envolvidas na produção de energia, e num sinal de fosforização que regula o armazenamento de energia, tanto no fígado como no organismo, que muda durante o exercício.
Essas modificações poderiam ajudar o fígado tornar-se menos gorduroso e menos propenso a doenças através de exercícios, e poderiam oferecer um alvo para futuros tratamentos da doença hepática gordurosa não alcoólica.
"Embora o fígado não esteja directamente envolvido no exercício, ele sofre modificações que poderiam melhorar a saúde. Ninguém imaginava que essas alterações de acetilação e fosforização ocorreriam após o treino", afirmou Jean-Beltran, que resume: "O exercício é um processo muito complexo e isso é só a ponta do icebergue."
Os autores do estudo, que disponibilizaram os dados a toda a comunidade científica, esperam que as suas descobertas possam um dia ser utilizadas para adaptar o exercício ao estado de saúde de cada pessoa ou para desenvolver tratamentos que imitem os efeitos da actividade física.