Saudita activista pelos direitos das mulheres condenada a onze anos de prisão

Jovem decidira deixar de usar abaya depois de ouvir o princípe herdeiro dizer que tinha “o direito de vestir” o que quisesse “desde que seja respeitável”. Tem 29 anos e foi presa em 2022.

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Imagem de Manahel al-Otaibi divulgadas das redes sociais e no site da Amnistia Internacional
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Manahel al-Otaibi, defensora dos direitos das mulheres na Arábia Saudita, foi condenada a onze anos de prisão por “delitos terroristas”, depois de ter sido presa pela “sua escolha de indumentária e apoio aos direitos das mulheres”. A sentença, proferida numa audiência secreta a 9 de Janeiro, só foi conhecida agora, depois de um grupo de relatores do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos ter solicitado informações sobre o seu caso.

Oficialmente, a condenação baseia-se numa lei antiterrorista saudita que criminaliza a utilização de sites para "difundir ou publicar notícias, declarações, rumores falsos ou maliciosos, ou algo semelhante para cometer um crime terrorista".

De acordo com a Amnistia Internacional, Otaibi foi acusada por uso de "roupa indecente" pelos padrões sauditas e por exigir reformas nas redes sociais, nomeadamente o fim do sistema do “guardião” masculino, que obriga todas as mulheres a terem um guardião homem da sua família, normalmente o marido, pai ou um irmão. O regime já foi aligeirado e nos últimos anos as sauditas deixaram de precisar da autorização do "guardião" para sair do país, registar os filhos ou pedir o divórcio, mas ainda não podem casar, viver sozinhas ou apresentar uma queixa por violência – mesmo se o agressor for o seu “guardião” – sem essa permissão.

"Com esta sentença, as autoridades sauditas expuseram o vazio das suas muito apregoadas reformas dos direitos das mulheres e demonstraram o seu arrepiante empenho em silenciar a dissidência pacífica", afirmou Bissan Fakih, activista da Amnistia Internacional para a Arábia Saudita, num texto publicado no site da organização.

Otaibi, de 29 anos, é instrutora de fitness e gosta de ioga, de arte e de viajar, segundo as suas contas nas redes sociais. Foi presa em Novembro de 2022 e está na prisão de Malaz, em Riad. Entre Novembro de 2023 e Abril deste ano esteve incontactável e quando pôde voltar a falar com a família disse ter sido mantida em isolamento com uma perna partida e estar a sofrer maus-tratos.

A sua irmã, Fawzia, foi acusada de crimes semelhantes aos que foram usados para condenar Manahel, mas fugiu do país em 2022 para evitar a detenção.

A Amnistia e o grupo de direitos humanos ALQST, com sede no Reino Unido, sublinharam a ironia de Otaibi ter apoiado publicamente as “mudanças radicais” prometidas e, até certo ponto, promovidas, pelo príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman, incluindo a flexibilização do código do vestuário.

Numa entrevista à emissora alemã Deusche Welle, partilhada agora na rede X pelo ALQST, Otaibi afirmava que decidiu vestir-se de acordo com a sua vontade, sem usar abaya (túnica larga que cobre a mulher da cabeça aos pés), por causa “das palavras do príncipe Mohammed bin Salman, que disse claramente que eu tenho o direito de vestir o que queira desde que seja respeitável”. A entrevista é de 2019, três anos antes de ser detida.

MBS, como é conhecido o líder de facto da Arábia Saudita, chegou ao poder com muitas promessas de abertura na conservadora monarquia, tendo já dado vários passos no sentido de diminuir a segregação e as restrições enfrentadas pelas mulheres, que passaram, por exemplo, a poder conduzir. Mas os activistas dos direitos humanos defendem que MBS não é um reformista, mas um pragmático que vai oferecendo aberturas para contentar os cidadãos, ao mesmo tempo que reprime qualquer sinal de dissidência.

A condenação de Otaibi acontece depois de uma série de sentenças duríssimas para sauditas, incluindo várias mulheres, que se limitaram a partilhar as suas opiniões nas redes sociais: Salma al-Shehab (condenada a 27 anos de prisão), Fatima al-Shawarbi (30 anos), Sukaynah al-Aithan (40 anos) e Nourah al-Qahtani (45 anos), enumera a Amnistia.

*com Lusa

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