Europa aprova plano para abandonar Tratado da Carta da Energia. E agora?

Europa sai do Tratado da Carta da Energia, um acordo internacional que protege os investimentos energéticos. Portugal rompeu com acordo, visto como um obstáculo ao combate à crise climática, em 2023.

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O Tratado da Carta da Energia de 1998 permite que as empresas do sector da energia processem os governos por políticas que prejudiquem os seus investimentoshe German-Durch border in Emlichheim, Germany, 22 March 2022. The Russian invasion of Ukraine has led many governments besides Germany aiming at becoming less dependent on Russian oil and gas imports. EPA/SASCHA STEINBACH\r\n SASCHA STEINBACH / EPA
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O Parlamento Europeu aprovou a saída da União Europeia do Tratado da Carta da Energia, um acordo internacional (assinado em Lisboa, em 1994) em que protege os investimentos energéticos, por considerar que prejudica os esforços de combate às alterações climáticas.

Portugal já abandonou o Tratado da Carta da Energia, alinhando-se assim com a posição da Comissão Europeia sobre esta convenção multilateral. A conclusão do processo de denúncia foi anunciada em Setembro de 2023na página da Assembleia da República.

Porque que é que é importante?

O Tratado da Carta da Energia de 1998 permite que as empresas do sector da energia processem os governos por políticas que prejudiquem os seus investimentos. Nos últimos anos, as empresas utilizaram-no para pedir indemnizações por medidas que exigem o encerramento de centrais de combustíveis fósseis.

A União Europeia quer abandonar o tratado, que considera ser um obstáculo à luta contra as alterações climáticas e à transição para energias limpas.

Bruxelas propôs uma saída conjunta, depois de membros da UE como a Dinamarca, a França, a Alemanha, o Luxemburgo, a Polónia, a Espanha e os Países Baixos terem anunciado os seus próprios planos de saída, sobretudo devido a preocupações com o clima.

A perda da UE reduziria para cerca de metade os actuais 50 signatários do Tratado, que incluem também o Azerbaijão, o Japão e a Turquia.

O que se tem dito sobre o abandono?

O secretariado do Tratado da Carta da Energia não respondeu a um pedido de comentário.

A eurodeputada Anna Cavazzini (Grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia), que liderou os trabalhos do Parlamento Europeu na passada quarta-feira sobre a saída do tratado, afirmou que "este tratado absurdo atrasou a protecção do clima e custou aos cidadãos milhares de milhões de euros em dinheiro dos contribuintes, sob a forma de custos legais perante tribunais de arbitragem privados e pagamentos de compensações a empresas multinacionais".

E agora?

A aprovação do Parlamento Europeu significa que os países da UE podem tomar a decisão de sair do Tratado, o que se espera que aconteça em Maio, afirmaram os funcionários da UE. Os ministros deram o seu apoio inicial no mês passado.

Chipre e a Hungria quiseram ficar, enquanto os outros países receavam que os esforços de modernização do tratado fossem desperdiçados com a sua saída. Para acalmar estas preocupações, espera-se que os países da UE concordem em permitir que as reformas para modernizar o tratado sejam aprovadas antes de saírem.

Os signatários do tratado chegaram a acordo sobre as reformas no ano passado, mas estas tinham poucas hipóteses de entrar em vigor sem o apoio da UE.

Uma das reformas reduziria para metade o tempo durante o qual as empresas de energia de países terceiros continuariam a beneficiar das protecções do pacto para os seus investimentos na UE, após a saída do bloco.

Quais os principais problemas deste tratado?

Uma investigação realizada pela Investigate Europe em 2021 revelou vários aspectos problemáticos da convenção então subscrita por 55 países. Entre as fragilidades do acordo está o facto de ser unilateral e estar redigido de forma pouco clara. Um exemplo: segundo o documento, as empresas podem processar os Estados sempre que estas sentirem que estão a ser tratadas “injustamente”.

Sob o título O tratado, assinado em Lisboa, que incentiva o aquecimento global, o trabalho jornalístico mostra como investidores usaram o acordo para intimidar Estados-membros da União Europeia, exigindo indemnizações da ordem dos milhares de milhões. E revela ainda como a convenção multilateral protege, só na Europa, infra-estruturas energéticas no valor de 344,6 mil milhões de euros.