As palavras de ordem e outros momentos que marcaram o 25 de Abril
Celeste Caeiro distribuiu cravos, os cartazes saíram à rua, um político fez sucesso nas redes sociais e na Galiza cantou-se Zeca Afonso.
Massas de gente caminharam ruas acima, avenidas abaixo, cantaram, gritaram, dançaram, o movimento nunca parou — mesmo demorando horas e horas para percorrer um trajecto de poucos minutos. Celeste Caeiro, a mulher que distribuiu os cravos naquele “dia inicial” voltou a fazê-lo na celebração do cinquentenário do 25 de Abril, acompanhada pela família. Os cartazes, sempre inventivos, mostraram-se definidores de palavras de ordem. Em Lisboa, houve um líder político que fez sucesso nas redes sociais e, na Galiza, nuestros hermanos juntaram-se para cantar a liberdade.
A Revolução só é dos Cravos porque Celeste Caeiro os deu aos militares no dia 25 de Abril de 1974. A cafetaria onde trabalhava completava um ano e o patrão tinha comprado cravos para oferecer aos clientes. Nesse dia, não houve trabalho para ninguém. Os cravos iam estragar-se no armazém, por isso pediram aos funcionários que os levassem para casa — Celeste pegou nos cravos vermelhos e brancos e saiu à rua. Rui Tavares, porta-voz do Livre, sugeriu no discurso na sessão solene do 25 de Abril, na Assembleia da República, que Celeste Caeiro fosse homenageada com uma estátua na casa da democracia. Aos 91 anos, a mulher que deu nome à Revolução foi até à Avenida da Liberdade cheia de cravos nas mãos para dar.
As frases inscritas nos cartazes
"Cara de um, focinho de outro", lê-se num cartaz que vai do Largo Soares dos Reis até à Avenida dos Aliados, no Porto. Abaixo da frase, uma fotografia com metade da cara de André Ventura e outra metade de Salazar. Ao lado, dois cravos — um desenhado, outro na mão que segura o cartaz. Em Lisboa, outro cartaz eleva um cartoon do líder do Chega. "Viva a liberdade", lê-se. São dois de muitos: o crescimento do Chega nas eleições de 10 de Março serviu de inspiração para vários cartazes que o aproximam a um regresso ao tempo do Estado Novo.
O apoio à Palestina foi outro dos temas recorrentes, viam-se pessoas enroladas em bandeiras e "solidariedade com a Palestina" escrito em vários cartazes. Um deles, usava um cravo como parte da bandeira palestiniana, ilustrando a empatia por aquele povo.
As crianças amontoavam-se nos ombros dos pais e gritavam palavras de ordem. A liderar o Sindicato dos Professores da Grande Lisboa, ouvia-se uma voz estridente que saía de um corpo pequeno: mudava o cântico quando queria e sabia todos de cor. De vez em quando era tão intenso que lhe faltava o ar, mas continuava de altifalante em riste. No Porto, uma criança com um cravo do seu tamanho dizia bem alto: "A democracia não se abate, direitos não são para debate". À volta, todos acompanhavam, mas era ele quem tinha o poder de puxar as vozes e de as manter sonantes.
25 de Abril é futuro! �� pic.twitter.com/QXgStexC0x
— Pedro Morgado (@pedromorgado) April 25, 2024
"Que força é essa, amigo?", "Não me obriguem a ir para rua gritar", "A paz, o pão, habitação, saúde, educação" eram outras das frases inscritas nos pedaços de cartão que tantos transportavam. Cantavam as músicas que citavam nos cartazes e diziam as palavras como se de um hino se tratasse — especialmente quando se ouviam as primeiras batidas de Grândola, Vila Morena.
Ao passar em frente ao hotel onde estava hospedado Umaro Sissoco Embaló, Presidente da Guiné-Bissau, alguns manifestantes pararam e mostraram as inscrições "Abaixo a ditadura. Abaixo o fascismo na Guiné-Bissau. Viva [Amílcar] Cabral". Embaló estava em Portugal a propósito das comemorações do 25 de Abril com os PALOP. Um estudo apresentado no início deste ano pela Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH) denunciava o "autoritarismo e a "apetência pela ditadura" no país. O presidente da LGDH afirmou, na mesma altura, que a democracia guineense estava em “estádio avançado de desmantelamento”.
Um político-celebridade
Os líderes de todos os partidos da esquerda parlamentar (e o do Iniciativa Liberal) marcaram presença no desfile dos 50 anos do 25 de Abril, mas Pedro Nuno Santos foi o mais requisitado por quem passava pela tarja do Partido Socialista (PS). Na rede social X, antigo Twitter, multiplicavam-se as fotografias com o secretário-geral do PS. Com ares de celebridade, ia olhando para as câmaras que lhe apontavam aqui e ali — após três horas a descer a Avenida da Liberdade, foram aparecendo os registos nas redes sociais.
— mari ou bia ⁷ (@_urcupcake19) April 25, 2024
Na Galiza, também se cantou Zeca
A Galiza era a "pátria espiritual" de José Afonso. Lá, o compositor português deu o nome a um parque e há uma associação que o celebra. Em Santiago de Compostela não podiam deixar de o lembrar — centenas de pessoas juntaram-se numa praça e, juntas, cantaram Grândola, Vila Morena, de braços dados e de um lado para o outro, como se o vento as levasse.
Desafiando a choiva neste 25 de abril para participar no canto colectivo do himno da liberdade, ’Grândola, vila morena’, no mesmo lugar en que o Zeca Afonso o cantou ao vivo por vez primeira#25deabrilsempre pic.twitter.com/55MlSQtxdN
— Concello de Santiago (@PazodeRaxoi) April 25, 2024