Ericeira: vegetais, curiosidade e boa Onda com vista para o mar
Nuno Matos veio do Six Senses Douro Valley para o Onda, no Hotel Aethos. Os vegetais brilham no trabalho de um chef que, felizmente, ainda não deixou a “idade dos porquês”.
“A minha fase dos porquês estende-se até à vida adulta. Quando não sei, pergunto.” Nuno Matos, o novo chef do restaurante Onda, no hotel de cinco estrelas Aethos Ericeira, vem até à nossa mesa para conversar um pouco e é quando falamos de sobremesas e das experiências que faz, mesmo não sendo pasteleiro, que explica como a curiosidade é um grande motor na sua vida e como a cozinha é uma forma de continuar a fazer perguntas.
Antes de se lançar neste mundo, Nuno, que é de Coimbra, estudou música, e fez a licenciatura em Física naquela cidade. Só depois, aos 21 anos, rumou ao Estoril para fazer o curso de Produção Alimentar e Cozinha, após o que teve uma série de experiências internacionais, entre as quais passagens pelo Fat Duck (3 estrelas Michelin), no Reino Unido, onde fez o seu primeiro estágio, e pelo Relae (uma estrela Michelin), em Copenhaga.
Talvez este percurso variado ajude a entender a forma como encara a sua cozinha, que já tinha mostrado durante os quatro anos em que trabalhou no Six Senses Douro Valley (de 2020 a Janeiro de 2024), antes da recente mudança para a Ericeira.
“Para mim, qualquer ingrediente tem o mesmo valor gastronómico”, afirma. Aqui, perto do mar, dá, naturalmente, grande importância ao peixe e ao marisco, mas é na forma de pensar os vegetais – tem um favorito, os brócolos – que acredita que se pode fazer maior diferença. “O mundo vegetal deixa-se explorar muito mais. Os brócolos, por exemplo, têm sabores muito diferentes conforme a maneira de os confeccionar.”
Não se surpreendeu, portanto, quando as pessoas reunidas à volta da mesa elegeram uma preferida, entre as várias entradas que tinham provado: a couve coração assada com molho de manteiga e estragão (14€), em que o sabor envolvente da manteiga jogava muito bem com a textura crocante da couve. Outra entrada muito bem conseguida é a salada de cebola assada e alho francês com um puré de verduras assadas, miso e sementes de abóbora (14€). Mais uma vez, um prato vegetariano – por acaso, ou talvez não.
A ideia é que no Onda a oferta gastronómica (assim como o serviço) seja simples, descontraída, mas com personalidade. E os pratos de Nuno Matos têm isso – sem nos atirar muito para fora de pé, vão sempre surpreendendo, aqui e ali. As outras entradas que provámos – acompanhadas por um Rosé Vulcânico, dos Açores – foram um tártaro de lombinho de vaca com trigo-sarraceno, alcaparras e manjericão (18€), um cru de robalo selvagem com maçã e trevos (16€) e um polvo com molho de noz, uvas e salsa (18€).
Vieram depois os pratos de peixe e de carne, e em todos notava-se o cuidado no tratamento dos vegetais, mesmo quando remetidos para a categoria de acompanhamento. Houve uma garoupa selvagem com couve-flor e couve pak choi (34€), um arroz cremoso de funcho e espinafres com robalo e lula (28€) e um peito de pato com batata-doce e nabos (34€).
E, novamente, o prato que mais surpreendeu foi o vegetariano, uma raiz de aipo com miso de cogumelos e um vinho tinto (integrando vários elementos que lhe davam uma complexidade interessante), com uma doçura caramelizada (mas não em excesso) a revelar lados diferentes daquele vegetal, acompanhado por broccolini grelhados e couve kale (28€).
Com um Porto Vallado 10 anos vieram as sobremesas e, com elas, Nuno Matos a confessar que não é pasteleiro mas que procura encontrar soluções que lhe parecem interessantes. O resultado são sobremesas decididamente diferentes das que se encontram em muitos sítios e que, pelos ingredientes e forma como são pensadas, mostram que por trás delas está um chef de cozinha.
O posset (natas fervidas com açúcar e sumo de limão e, neste caso, também vinagre de estragão) de limão e framboesa (14€) é a mais fresca e, eventualmente, a mais consensual. Há um arroz-doce com leite de coco, tangerina e algas (12€), a lembrar as versões mais asiáticas deste doce, e, por fim, um creme de milho com pipoca caramelizada, gelado de pipoca e manjericão (12€), a fazer-nos pensar numa sobremesa de uma festa de crianças, com um lado divertido e aquela doçura amável do milho que dificilmente podemos descrever de outra forma que não seja a já gasta expressão “comida de conforto”.
Conforto, vontade de fazer diferente na dose certa, e, sobretudo, boa onda é o que Nuno Matos traz para este restaurante à beira-mar.
A Fugas foi convidada para experimentar o Onda