Na sexta-feira, 12 de Abril, 2000 polícias alemães cercaram o Congresso Palestina, em Berlim, organizado maioritariamente por activistas judeus.
As imagens de polícias a deter judeus que estão a denunciar um genocídio, e da ministra do interior da Alemanha a declarar que apoia a intervenção da polícia, é uma referência para tempos passados. Ghassan Abu-Sittah, reitor da universidade de Glasgow, que esteve a dar apoio a hospitais na Faixa de Gaza, foi proibido de entrar na Alemanha quando se deslocava para o congresso como convidado. De igual forma, Yanis Varoufakis, antigo ministro das Finanças da Grécia, também convidado, foi proibido de entrar na Alemanha e de falar por conferência de vídeo para território alemão. A liberdade de expressão está em causa, e a favor de quem?
Nos últimos meses, Israel lançou mais explosivos em Gaza do que duas bombas atómicas, como a que foi utilizada em Hiroshima, em 1945. Israel destruiu ou danificou mais de metade dos edifícios, matou mais de 34 mil pessoas e feriu mais de 76.000, estando actualmente mais de 8000 pessoas desaparecidas. Ao mesmo tempo, Israel tem bloqueado a entrada de ajuda humanitária em Gaza. De acordo com a Cruz Vermelha, cerca de 2,22 milhões de pessoas enfrentam uma insegurança alimentar extrema. Este é o número mais elevado de uma população que enfrenta uma insegurança alimentar alguma vez registada no mundo.
No contexto político e cultural alemão, denunciar as acções desumanas do estado de Israel em Gaza e na Cisjordânia tem resultado em acusações de anti-semitismo. O facto é que a luta contra o genocídio nada tem de anti-semita. Quem desde o início demonstrou uma intenção clara de eliminar uma população inteira, tendo em conta a sua pertença a um grupo, foi o estado de Israel, que não representa os judeus, mas um projecto sionista.
Por exemplo, Yoav Gallant, Ministro da Defesa de Israel, declarou: “Ordenei um cerco total à Faixa de Gaza. Não haverá electricidade, nem comida, nem combustível, está tudo fechado. […] Estamos a lutar contra animais humanos e estamos a agir em conformidade”. Outro exemplo, pelo Ministro do Património de Israel: “Uma das opções é lançar uma bomba atómica sobre Gaza.” Ou ainda a declaração do Ministro da Educação de Israel: “São animais, não têm o direito de existir. Não irei discutir como isso vai acontecer, mas eles precisam de ser exterminados.”
A lista continua, no entanto, o governo alemão decidiu desde Outubro prestar o seu apoio incondicional ao estado de Israel, mesmo que isso signifique apoiar um genocídio em Gaza. Aliás, a Alemanha é o segundo maior fornecedor de armas a Israel. Como o chanceler alemão, Olaf Scholz, declarou num comunicado em Outubro: “A nossa própria história, a nossa responsabilidade decorrente do Holocausto, faz com que seja nosso dever permanente defender a existência e a segurança do Estado de Israel. Esta responsabilidade guia-nos.”
O resultado tem variado entre congelar a conta bancária da Jüdische Stimme, uma organização de judeus pela paz, e cooperar com a destruição de Gaza. De dia para dia, as autoridades alemãs fazem com que seja mais difícil e até mesmo ilegal denunciar o que está a acontecer. Há quem argumente que a história se está a repetir. E não será óbvio? Como a activista judia, Rachael Shapiro, escreveu: “A concepção rígida e intrinsecamente anti-semita dos judeus como um povo indiferenciado 'nativo' de uma terra, caracterizada pelo movimento sionista nacionalista colonial, serviu apenas como uma continuação da obra de Hitler. Apagou o judaísmo secular na Europa. Erradicou o iídiche, o ladino, o judaico-árabe, o judaico-persa e outras línguas hebraicas. Oitenta anos após o Holocausto, conseguiu manter a visão dos judeus como um monólito, um incómodo estrangeiro separado da sociedade alemã, cuja tentativa de aniquilação pode agora ser explorada para justificar a aniquilação de outro grupo.”
Depois do Congresso Palestina ter sido banido em Berlim, manifestações de solidariedade com os organizadores do congresso e de solidariedade com a Palestina encheram as ruas da cidade. Ainda que pacíficos, foram alvos de violência policial. Às vezes perguntamos o que faríamos se vivêssemos durante o colonialismo ou o que faríamos se vivêssemos durante o regime nazi na Alemanha. A resposta a esta pergunta é fácil de responder, pois vivemos hoje em semelhantes circunstâncias. No ocidente, quem se opõe ao genocídio em Gaza tende a ser cada vez mais perseguido. Lutar contra direitos humanos básicos não pode ser motivo para repressão policial.