Cães e gatos poderão transmitir “superbactérias” resistentes a antibióticos aos donos

A Organização Mundial da Saúde classifica a resistência aos antibióticos como uma das maiores ameaças à saúde pública que a humanidade enfrenta.

Foto
Gato paulo ricca/arquivo
Ouça este artigo
00:00
03:33

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

Um estudo realizado em Portugal e no Reino Unido sugere que cães e gatos de estimação desempenham um papel importante na propagação de bactérias resistentes a antibióticos.

A Sociedade Europeia de Microbiologia Clínica e Doenças Infecciosas (ESCMID, na sigla em inglês) adianta, em comunicado, que a investigação vai ser apresentada no seu Congresso Global a decorrer em Barcelona (Espanha) entre 27 e 30 de Abril.

Tendo encontrado "indícios da transmissão de bactérias multirresistentes entre cães e gatos doentes e os seus donos saudáveis em Portugal e no Reino Unido", o trabalho levanta preocupações "de que os animais de estimação possam actuar como reservatórios de resistência e, assim, ajudar na propagação da resistência a medicamentos essenciais".

Neste sentido, chama a atenção para a importância de incluir famílias com animais de estimação em programas de vigilância da resistência aos antibióticos, indica o comunicado.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica a resistência aos antibióticos como uma das maiores ameaças à saúde pública que a humanidade enfrenta. As infecções resistentes aos medicamentos matam anualmente em todo o mundo mais de 1,2 milhões de pessoas e prevê-se que em 2050 sejam 10 milhões, se não forem tomadas medidas.

"Estudos recentes indicam que a transmissão de bactérias de resistência antimicrobiana (RAM) entre humanos e animais, incluindo animais de estimação, é crucial na manutenção dos níveis de resistência, desafiando a crença tradicional de que os humanos são os principais portadores de bactérias RAM na comunidade", afirma, citada no comunicado, a estudante de doutoramento Juliana Menezes.

"Analisar e compreender a transmissão de bactérias RAM de animais de estimação para humanos é essencial para combater eficazmente a resistência antimicrobiana" em pessoas e animais, acrescenta a estudante de doutoramento, do Laboratório de Resistência aos Antibióticos do Centro de Investigação Interdisciplinar em Saúde Animal, da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa. O laboratório tem a coordenação de Constança Pomba.

Em Portugal e no Reino Unido

O estudo envolveu cinco gatos, 38 cães e 78 pessoas em 43 casas em Portugal e 22 cães e 56 indivíduos em 22 habitações no Reino Unido. Todos os humanos eram saudáveis e todos os animais de estimação tinham infecções da pele e tecidos moles ou infecções do sistema urinário.

Os cientistas testaram amostras de fezes e urina e esfregaços de pele dos animais e dos seus donos para detectar enterobactérias (família de bactérias que inclui a Escherichia coli e a Klebsiella pneumoniae) resistentes a antibióticos comuns.

O foco foram as bactérias resistentes "às cefalosporinas de terceira geração" (dos mais importantes antibióticos, segundo a OMS) e "às carbapenemas (parte da última linha de defesa quando outros antibióticos falham)".

Segundo o comunicado, "não foi possível comprovar a direcção da transmissão", mas "em três dos lares de Portugal, o timing dos testes positivos para a bactéria produtora [das enzimas] ESBL/AmpC sugere fortemente que, pelo menos nestes casos, a bactéria tinha passado do animal de estimação para o humano".

Juliana Menezes considera que "aprender mais sobre a resistência nos animais de estimação ajudaria no desenvolvimento de intervenções fundamentadas e direccionadas, para defender a saúde animal e humana".

Carícias, toques ou beijos e tocar nas fezes do animal permitem a passagem das bactérias entre os cães e os gatos e os seus donos, pelo que os investigadores pedem atenção à lavagem das mãos após fazer festas aos animais ou tratar dos seus dejectos.

"Quando o seu animal de estimação não estiver bem, analise a possibilidade de o isolar num quarto para evitar a propagação de bactérias pela casa e limpe bem o resto da habitação", aconselha a investigadora.

Todos os cães e gatos ficaram sem infecções depois de terem sido tratados.