Parlamento polaco discute alterações à lei do aborto

Questão da interrupção voluntária da gravidez está a dividir a coligação liderada por Donald Tusk. Mas mesmo em caso de aprovação é possível um veto do Presidente.

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Donald Tusk, primeiro-ministro da Polónia Kacper Pempel/REUTERS
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O Parlamento polaco começou esta quinta-feira um debate inflamado sobre a liberalização do aborto, uma promessa central da campanha eleitoral do primeiro-ministro, Donald Tusk, que levou a uma clivagem na sua coligação pró-europeia nas últimas semanas.

Os direitos das mulheres estão no topo da agenda na Polónia, que introduziu uma proibição quase total do aborto em 2021 e onde o anterior governo nacionalista incorporou os seus valores sociais conservadores na lei durante oito anos de governo.

Desde que chegou ao poder em Dezembro, a coligação alargada de Tusk, que inclui políticos de esquerda e democratas-cristãos, já restabeleceu o financiamento público da fertilização in vitro e votou a favor da alteração das regras de acesso à contracepção de emergência.

Mas está a ter dificuldades em chegar a um acordo sobre a política de aborto, um dos principais focos da campanha de Tusk, que aproveitou a oposição geral em relação às duras restrições. Vários observadores políticos afirmam que esta foi um dos motivos por trás da afluência recorde às urnas na votação de Outubro.

O ambiente está inflamado porque é algo em que temos diferenças entre os parceiros da coligação, disse o presidente do Parlamento, Szymon Holownia, um antigo jornalista católico, aos jornalistas.

Nos termos da legislação em vigor, o aborto é legal em caso de violação, incesto ou de perigo para a saúde ou a vida da mulher, sendo proibida a interrupção voluntária da gravidez em caso de defeitos fetais.

Algumas activistas afirmam que mesmo o aborto legal é muitas vezes difícil de obter porque os médicos e os administradores dos hospitais não têm a certeza das regras ou recusam-se a interromper gravidezes por razões morais.

No ano passado, a taxa de fertilidade na Polónia caiu para o nível mais baixo desde a Segunda Guerra Mundial. Os defensores dos direitos das mulheres dizem que isso se deve, em parte, ao facto de as mulheres terem medo de ter filhos, na sequência de uma série de casos em que mulheres grávidas morreram no hospital em resultado de complicações porque os profissionais de saúde demoraram demasiado tempo a interromper a gravidez temendo consequências legais.

O Parlamento Europeu apelou aos Estados-membros da UE a despenalizarem totalmente o aborto e pediu à Polónia e a Malta a revogação das leis que o proíbem e restringem.

As sondagens mostram que na Polónia, um país predominantemente católico, um número crescente de eleitores quer mais direitos ao aborto. Um inquérito recente da Ipsos revelou que 62% dos polacos apoiam o direito ao aborto até às 12 semanas.

Esta quinta-feira, os deputados começaram a debater vários projectos de lei, dois dos quais estabeleceriam o direito a aborto legal sem limitações até às 12 semanas de gravidez. Outro restabelece o direito ao aborto em caso de anomalias fetais, voltando à situação anterior a uma decisão do Tribunal Constitucional de 2020 que proibiu interrupções de gravidez por este motivo.

“O Estado deve fazer tudo para garantir que o aborto seja seguro, acessível, legal e realizado em condições adequadas”, declarou a ministra da Igualdade, Katarzyna Kotula, segundo a agência noticiosa PAP.

A votação está programada para esta sexta-feira, mas qualquer que seja o resultado prevê-se que o Presidente Andrzej Duda, aliado conservador do partido Lei e Justiça (PiS), que esteve antes no poder, vete quaisquer alterações à legislação.