Querer dormir
O esforço para adormecer não ajudava nada, pelo contrário, servia de catalisador da insónia. Isto de adormecer não são ovelhas contadas.
Virou-se para um lado, revirou-se para o outro, repetiu o procedimento destapando-se e tapando-se, uma perna de fora dos cobertores, um braço de fora dos cobertores, dois braços de fora, e mais umas quantas combinações entre o que é possível tapar e o que é possível destapar. Contou várias vezes até cem e de cem até zero. A chuva batia na janela, os cães ladravam, os gatos miavam, as corujas gritavam, as madeiras velhas estalavam, mas não era por isso que a São não conseguia dormir, era outra coisa, uma preocupação, talvez uma intuição, sendo que o esforço para adormecer não ajudava nada, pelo contrário, servia de catalisador da insónia. Isto de adormecer não são ovelhas contadas. A São pegou num dos livros do autor francês e leu: «o conde de Clairmontel, acendendo o cachimbo de osso que fora da sua avó, disse-lhe que o tempo era muito deselegante para com os corpos», mas não conseguiu concentrar-se na leitura. Pousou o livro, voltou a pegar nele, voltou a pousá-lo. Sim, a escrita fazia lembrar o Moisés a falar, o que seria feito dele?, bolas, continuo desperta e amanhã tenho de levantar-me cedo, ir trabalhar.
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