Morreu o psicólogo Daniel Kahneman, Nobel da Economia que redesenhou o pensamento
Kahneman pintou um novo retrato do pensamento humano: influenciável, falacioso, falível, inconsciente. O “pai da economia comportamental” morreu aos 90 anos.
Morreu esta quarta-feira Daniel Kahneman, psicólogo galardoado com o Nobel da Economia pelas suas investigações sobre a forma como tomamos decisões e ignoramos, mais vezes do que nos apercebemos, a lógica. Kahneman tinha 90 anos.
Sem formação em Economia, usou o que sabia sobre psicologia para consolidar um novo campo de estudo: a economia comportamental, que permitiu interpretar as decisões humanas tendo em conta as crenças, memórias e inclinações que nos toldam o raciocínio e conduzem a conclusões contraditórias.
Desde Adam Smith (século XVIII) que a economia tradicional via o humano como ser racional, guiado pelo que é mais benéfico para si quando confrontado com um cenário de incerteza — falamos do chamado homo economicus.
Daniel Kahneman redesenhou o retrato do pensamento: influenciável, falacioso, falível, maioritariamente inconsciente. As boas decisões não podiam partir de uma racionalidade inerente ao ser humano — essa objectividade não existia.
Em 2002, altura em que estava associado à Universidade de Princeton, foi distinguido com o Nobel da Economia "por ter integrado conhecimentos da investigação em psicologia nas ciências económicas, sobretudo no que diz respeito ao discernimento humano e à tomada de decisões". O prémio foi partilhado com Vernon L. Smith, pioneiro na utilização de experiências laboratoriais em economia.
"Muitas pessoas são demasiado confiantes e tendem a depositar demasiada fé nas suas intuições", defendeu Kahneman no livro Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar, publicado em 2011. "Consideram o esforço cognitivo, no mínimo, ligeiramente desagradável e evitam-no tanto quanto possível."
Nessa obra, separa o pensamento rápido: intuitivo, guiado por emoções e experiências passadas, maioritariamente inconsciente; do pensamento lento, mais racional e analítico.
No seu entendimento, o "optimismo delirante" — que caracteriza muitos empreendedores e negócios — é uma das forças motoras essenciais da economia e do capitalismo. Apesar de reconhecer o valor do optimismo, foi, durante toda a vida, um pessimista cauteloso.
Os estudos de Kahneman, muitos escritos a quatro mãos, com o psicólogo Amos Tversky, mudaram a nossa perspectiva sobre a tomada de decisões em termos económicos, mas não só. Influenciaram o pensamento estatístico no desporto, a forma como os governantes elaboram políticas públicas, como os médicos fazem diagnósticos e como os juízes avaliam sentenças.
Numa das experiências conduzidas por ambos, demonstraram que era muito mais provável alguém aceitar fazer um desvio de 20 minutos para poupar cinco euros num gasto total de 15 euros, do que numa despesa total de 125 euros.
A dupla desenvolveu também a teoria de aversão à perda, que mostra que o indivíduo é mais influenciado pelos prejuízos do que pelos ganhos. Por exemplo: perder 100 euros provocará uma sensação de desilusão muito mais intensa, quando comparada com a felicidade de encontrar uma nota de 100.
Daniel Kahneman nasceu em 1934 em Telavive, na Palestina sob mandato britânico (actual território israelita), mas cresceu em Paris. Escapou à perseguição nazi durante a Segunda Guerra Mundial e regressou à terra onde nasceu e onde nascia, então, o Estado de Israel. Licenciou-se em Psicologia e Matemática na Universidade Hebraica de Jerusalém e partiu para os Estados Unidos, onde esteve associado às universidades de Berkeley, Michigan, Harvard, Stanford e Princeton.