EUA processam Apple por alegado monopólio do mercado de smartphones

Depois da União Europeia, é nos Estados Unidos que a Apple enfrenta a justiça por alegadas práticas anti-concorrenciais lesivas para consumidores e programadores.

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Reuters/Aly Song
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O Departamento de Justiça dos Estados Unidos e 15 estados norte-americanos processaram a Apple na quinta-feira, alegando que a empresa usou a forte procura pelo seu iPhone e outros produtos para aumentar os preços dos seus serviços e prejudicar empresas rivais mais pequenas, em prática anti-concorrencial. Este é apenas a mais recente decisão no âmbito de um processo mais vasto de vigilância apertada dos EUA às chamadas Big Tech, as grandes empresas tecnológicas.

A Apple junta-se, assim, a uma lista de empresas rivais processadas pelos reguladores dos EUA, incluindo a Alphabet (Google), a Meta Platforms (detentora do Facebook, Instagram e Whatsapp) e a Amazon.com, em casos movidos durante as administrações do antigo Presidente Donald Trump e do actual chefe de Estado, Joe Biden.

"Os consumidores não devem ter de pagar preços mais elevados porque as empresas violam as leis anticoncorrenciais", afirmou o procurador-geral americano, Merrick Garland, num comunicado. "Se não tiver oposição, a Apple só vai continuar a reforçar o seu monopólio dos smartphones".

Desde o tempo em que era um interveniente marginal no mercado dos computadores pessoais que o modelo de negócio da Apple se baseia na cobrança de um valor aos utilizadores por produtos tecnológicos em que a Apple determina quase todos os pormenores de como o dispositivo funciona e pode ser utilizado. O Departamento de Justiça procura desfazer esse modelo de negócio, obrigando a Apple a oferecer aos utilizadores mais opções sobre a forma como as aplicações podem aceder ao hardware concebido pela Apple.

Depois do anúncio da acção judicial, as acções da Apple estavam a ser negociadas com uma desvalorização de 3,6%.

O Departamento de Justiça, ao qual se juntou também o Distrito de Colúmbia (o território da capital americana, Washington) na acção judicial, alega que a Apple utiliza o seu poder de mercado para obter mais dinheiro dos consumidores, programadores, criadores de conteúdos, artistas, editores, pequenas empresas e comerciantes.

A acção judicial de 88 páginas, intentada no tribunal de Newark, Nova Jérsia, afirma estar centrada em "libertar os mercados de smartphones da conduta anticoncorrencial e de exclusão da Apple e restaurar a concorrência para baixar os preços dos smartphones para os consumidores, reduzir as taxas para os programadores e preservar a inovação para o futuro".

Na acção judicial, os EUA acusam a Apple de estar a tornar os seus produtos piores para os consumidores para bloquear os concorrentes e citam cinco exemplos em que a Apple utilizou mecanismos para suprimir tecnologias que teriam aumentado a concorrência entre smartphones: as chamadas "super-aplicações", as aplicações de jogos em cloud stream, aplicações de mensagens, smartwatches e carteiras digitais.

Por exemplo, a Justiça americana alega que a Apple dificultou o bom funcionamento das aplicações de mensagens e dos smartwatches concorrentes nos seus telemóveis. Alega também que as políticas da loja de aplicações da Apple relativamente aos serviços de streaming para jogos prejudicaram a concorrência.

O Departamento de Justiça citou uma série de e-mails de Steve Jobs, o co-fundador da Apple que morreu em 2011, dizendo que "não era divertido ver" a facilidade com que os consumidores podiam mudar de iPhones para telemóveis Android e prometendo "forçar" os programadores a utilizar os seus sistemas de pagamento, num esforço para prender tanto os programadores como os consumidores ao ecossistema da empresa.

A Apple mostrou discordância numa declaração, dizendo: "Esta acção judicial ameaça quem somos e os princípios que distinguem os produtos Apple em mercados ferozmente competitivos. Se for bem-sucedida, prejudicará a nossa capacidade de criar o tipo de tecnologia que as pessoas esperam da Apple - onde hardware, software e serviços se cruzam".

Não é claro quais as alterações específicas que o Departamento de Justiça pretende. A denúncia pede ao tribunal que impeça a Apple de usar o seu controlo na distribuição de aplicações, contratos e uso de interfaces de software privado para prejudicar os rivais e que ordene qualquer outra medida necessária "para restaurar as condições competitivas no mercado afectado pela conduta ilegal da Apple".

A Apple já foi objecto de investigações e decisões anticoncorrenciais na Europa, Japão e Coreia, bem como de processos judiciais de empresas rivais como a Epic Games.

Um dos negócios mais lucrativos da Apple - a sua App Store, que cobra comissões aos programadores de até 30% - já sobreviveu a uma longa contestação legal à luz da lei norte-americana por parte da Epic. Embora a acção judicial tenha concluído que a Apple não violou as leis anticoncorrenciais, um juiz federal ordenou à Apple que permitisse ligações e botões para pagar aplicações sem utilizar a comissão de pagamento na aplicação da Apple.

Durante uma conferência de imprensa, o procurador-geral dos EUA, Merrick Garland, disse que o Departamento de Justiça acredita que pode ganhar. "Apresentamos os casos porque acreditamos que os factos os justificam e porque acreditamos que é provável que ganhemos esses casos", afirmou Garland.

A Apple há muito que argumenta que restringe o acesso a alguns dados do utilizador e a algum hardware do iPhone por parte de programadores terceiros por razões de privacidade e segurança.

O procurador-geral adjunto Jonathan Kanter, da divisão anticoncorrencial, afirmou que o Departamento de Justiça apresentará provas de que a abordagem da Apple não foi motivada apenas por essas preocupações. "A nossa queixa explica que, em muitos casos, a conduta da Apple tornou o seu ecossistema menos privado e menos seguro", afirmou Kanter.

Na Europa, o modelo de negócio da App Store da Apple foi desmantelado por uma nova legislação chamada Lei dos Mercados Digitais, que entrou em vigor no início deste mês. A Apple planeia permitir que os programadores ofereçam as suas próprias lojas de aplicações - e, mais importante, não paguem comissões - mas rivais como o Spotify e a Epic argumentam que a Apple continua a dificultar a oferta de lojas de aplicações alternativas.

As decisões sobre a App Store da Apple obrigaram o Departamento de Justiça a analisar outras práticas da Apple para fundamentar uma queixa, como a forma como a Apple permite que empresas externas acedam aos chips e sensores do iPhone.

As empresas de hardware de consumo, como a TileInc, há muito que se queixam do facto de a Apple ter restringido a forma como podem trabalhar com os sensores do iPhone, ao mesmo tempo que desenvolve produtos concorrentes. A Apple começou a vender AirTags - que podem ser fixadas a objectos como chaves de automóveis para ajudar os utilizadores a encontrá-los quando se perdem - vários anos depois de a Tile ter começado a vender um produto semelhante.

Do mesmo modo, a Apple restringiu o acesso a um chip no iPhone que permite pagamentos sem contacto. Os cartões de crédito podem ser adicionados ao iPhone utilizando o serviço Apple Pay da própria Apple. A Apple também tem sido criticada pelo seu serviço iMessages, que só funciona em dispositivos Apple.