Há décadas que o pescador croata Marko Kristic lança as suas redes nas águas cintilantes do mar Adriático. Agora, uma invasão de peixe-papagaio do Mediterrâneo está a pôr em perigo a sua captura tradicional e o seu próprio sustento, afirma.
Devido às alterações climáticas e ao aumento do tráfego marítimo, o peixe-papagaio, juntamente com cerca de 50 novas espécies, espalhou-se pelo Adriático, ameaçando a população de peixes nativos.
Kristic disse que o peixe-papagaio foi avistado pela primeira vez no sul do Adriático há cerca de 15 anos, mas desde então tornou-se uma captura acessória (não desejada) comum nas suas redes.
Embora seja apreciado como uma iguaria nas regiões de onde é nativo, o peixe-papagaio não é do agrado dos habitantes da sua aldeia de Molunat, no sul da Croácia.
"Não o posso vender a ninguém. A população local não vai comer este novo peixe", disse Kristic.
"O Adriático está a mudar"
Nenad Antolovic, investigador do Instituto de Investigação Marinha e Costeira de Dubrovnik, afirma que as populações de peixes no Adriático, o braço mais a norte do Mediterrâneo, sofreram uma redução devido à sobrepesca, às alterações climáticas e à invasão de novas espécies.
"O Adriático está a mudar, está a ficar mais quente. Por esse motivo, surgem novos organismos. Refiro-me a peixes, plânctones e algas", explicou Antolovic.
De acordo com os dados de 2023 da Agência Nacional Italiana para as Novas Tecnologias, Energia e Desenvolvimento Económico Sustentável (ENEA), o Mediterrâneo está a tornar-se o mar que mais rapidamente aquece no planeta.
Novas espécies de peixes chegaram ao Mediterrâneo e ao Adriático a partir do mar Vermelho, através do canal de Suez, devido ao aquecimento das águas ou transportadas nos tanques de lastro dos navios, pondo em perigo a sobrevivência de cerca de 460 espécies de peixes nativos, disse Antolovic.
Alguns dos novos peixes são perigosos para os seres humanos, como o venenoso peixe-leão ou o peixe-pedra.
No mês passado, um pescador da zona de Dubrovnik apanhou um peixe Tetragonurus cuvieri, um habitante das profundezas do mar, pouco comum no Adriático.
No vizinho Montenegro, os cientistas do Instituto de Biologia Marinha da cidade costeira de Kotor apontaram o caranguejo-azul como um exemplo de espécie invasora.
"Chegou há cerca de 20 anos e é uma das piores espécies invasoras do Mediterrâneo", disse o cientista Olivera Markovic.
Os pescadores e os cientistas afirmam que as unidades populacionais de crustáceos, como o caranguejo-verde, foram reduzidas e, nalguns locais, totalmente dizimadas.
"A população de caranguejo-verde foi drasticamente reduzida desde o aparecimento do caranguejo-azul", disse Markovic.
O peixe-coelho, o peixe-balão e o peixe-leão estão a prosperar nas águas mais quentes do Adriático, ao longo da costa montenegrina, disse Ilija Cetkovic, investigador do instituto.
A maior preocupação é o peixe-leão. "(O peixe-leão) é actualmente o problema mais premente... é predador e causa danos consideráveis aos ecossistemas", disse Cetkovic.