Selectiva Moda: instrumental para a indústria, o “negócio de uma vida” para Serrão

Empresário entrou na associação que coordena a promoção externa do têxtil por um convite de franceses e acabou a liderar de facto uma entidade que, no Portugal 2020, obteve quase 39 milhões de euros.

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A Associação Selectiva Moda coordena a presença em feiras e a promoção internacional e realiza o salão Modtissimo, em Portugal Manuel Roberto (arquivo)
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A Associação Selectiva Moda (ASM), dirigida por Manuel Serrão, foi criada em 1992, numa parceria entre portugueses e franceses. Na altura, a Federação Francesa de Malhas (Fedemaille) tinha uma parceria com a Associação Portuguesa das Indústrias de Malha (a antiga APIM, que desapareceu por fusão na actual ATP), uma ligação que nascera do contacto que havia entre empresários de ambos os países, com os portugueses a tentarem capitalizar a maior experiência francesa na organização de eventos.

A indústria portuguesa tinha entrado nos seus anos mais difíceis. Sem experiência de organização e, sobretudo, sem orçamentos para eventos, os industriais ainda hoje agradecem o papel inicial da ASM, que passaria a ser gerida sozinha pela Fedemaille. A entrada de Serrão nesta equação, que tinha assumido funções na Portex em 1988 (grande feira nacional que também desapareceu) foi recordada pelo próprio, numa entrevista publicada em 2007.

"A associação dirigiu-me um convite para ficar à frente dos negócios em Portugal e eu disse que ficava, mas como prestador de serviços de uma empresa que eu criasse", contaria ao Diário de Notícias, a quem confessou que a ASM tinha sido o negócio da sua vida, segundo escreveu o jornalista que redigiu o artigo, no qual se detalha como Serrão chegou àquele mundo, depois de um curso de Direito e de uma passagem pelo jornalismo, que exerceu no antigo O Comércio do Porto.

"Já tinha vocação de empreendedor mesmo quando trabalhava por conta de outrem e senti que estava na idade de arriscar e criar uma empresa. É que não tenho jeito para funcionário público."

É neste contexto que nasce a associação e que ocorre a entrada de Serrão que, para a indústria, dá impulso e projecta internacionalmente produtores nacionais de matéria-prima, vestuário e moda, como o salão Modtissimo. A Associação Têxtil de Portugal e a Associação Nacional dos Industriais de Lanifícios acabam por ficar com a ASM, cujo presidente actual, João Costa, também é referido nos autos de indiciação, tendo sido presidente na ATP. Porém, segundo o Ministério Público, é Serrão quem gere de facto a ASM. E com impacto positivo para alguns dos industriais do sector, ouvidos pelo PÚBLICO, que agora temem as repercussões negativas deste caso em que Serrão é um dos principais suspeitos de fraude na obtenção de subsídios e outros crimes.

A partir de 2004, a ASM organiza acções colectivas em dezenas de feiras internacionais. Para tal, assume a responsabilidade de liderar as candidaturas aos fundos europeus destinados a ajudar na internacionalização das empresas. É nesse ponto que incide a actual investigação, designadamente nos seis anos do quadro Portugal 2020 (2014-2020), para o qual houve excepcionalmente três anos adicionais de execução de despesa.

Ao longo desse período, a ASM conseguiu aprovar 14 projectos co-financiados. Todos estão descritos no documento público de mais de 1200 páginas que elenca todas as operações aprovadas ao abrigo do Compete 2020, o programa de apoio mais virado para as empresas. São as mesmas 14 descritas no auto de indiciação, e que geraram pagamentos, a título de reembolsos ou adiantamentos, de 38,9 milhões de euros, entre 2015 e 2023.

A primeira teve um apoio de 7,2 milhões, data de 2015, e abrangia iniciativas de marketing e promoção internacional, tanto presencial como online, nesse ano e em 2016. A despesa considerada elegível era de 13 milhões de euros, o apoio ficou um pouco mais de metade.

Em 2016, receberia mais 1,8 milhões para apoiar o Portuguese Fashion News (PFN), durante três anos. Consistia, segundo a candidatura aprovada, em numerosos eventos, no Norte, no Centro, e "em menor grau" no Alentejo, para divulgar diferentes aspectos da indústria e também colecções. Foi aí que nasceu o Fashion Film Festival, que este ano tem a sua 10.ª edição em Guimarães.

São basicamente estas iniciativas, a promoção e presença externa sob a marca From Portugal e o evento que, todos os anos desde então, voltam a merecer apoios de fundos europeus. Para feiras e marketing, iam mais de 6,5 milhões de euros por ano – mesmo para 2020, ano de pandemia – com excepção de 2021/2022, em que a comparticipação baixa para cerca de metade. Para o PFN, havia cerca de um milhão por ano.

Finalmente, para a realização de fóruns, mas ao abrigo de outras linhas de financiamento europeu, surgem listados apoios em torno dos 100 mil, 200 mil, 400 mil e 500 mil euros, aprovados em 2016, 2018 e 2019.

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