Neste caso, em luz
Resta-nos tentar uma redução da perfídia existencial atarraxando umas lâmpadas, sem nos esquecermos de ligar os respectivos interruptores.
— Não estamos em paz, nunca estivemos, é-nos exigido, mesmo na sua forma mais elementar, um esforço permanente: andar na vertical, procurar alimento para repor a energia que constantemente perdemos, reduzir a entropia graças a mecanismos eficientes capazes de transformar energia em trabalho, bater o coração, respirar, e, claro, defecar, suar, pois nem tudo se aproveita. E assim vamos vivendo, de incerteza em incerteza, sempre num plano inclinado até que a morte alise tudo e desapareça qualquer convulsão. Isto é como uma bateria, tem uma assimetria evidente, começa com uma certa quantidade de electrões, todos juntos dum lado, na linha de partida para uma corrida em direcção ao equilíbrio do estatismo, corrida que só será interessante se alguém tiver a inteligência de colocar uma lâmpada pelo meio, convertendo parte dessa energia em acto, neste caso, em luz. Enfim, sem assimetria não há movimento, é graças a ela que vamos caindo, tropeçando, correndo, rebolando, resistindo, tentando chegar a um final ideal, cumprir um destino que, por causa da segunda lei da termodinâmica, ficará sempre aquém do sonho. Também socialmente caminhamos para esse desfecho estático, que até poderia ser justo, mas jamais o será. Resta-nos tentar uma redução da perfídia existencial atarraxando umas lâmpadas, sem nos esquecermos de ligar os respectivos interruptores.
O contributo do PÚBLICO para a vida democrática e cívica do país reside na força da relação que estabelece com os seus leitores.Para continuar a ler este artigo assine o PÚBLICO.Ligue - nos através do 808 200 095 ou envie-nos um email para assinaturas.online@publico.pt.