“Urbanismo dos pobrezinhos”: Rui Moreira contra preservação de zona rural de Noêda como está
Preocupada com implicações do TGV naquela zona da cidade, CDU sugeriu propostas alternativas e a criação de um centro de estudos de ruralidades urbanas. Ideia foi recusada.
Para Rui Moreira, a zona rural de Noêda, no Porto Oriental, “não tem futuro”. Pelo menos, tal como está agora, “encravada entre a VCI e a linha de caminho-de-ferro e a Rua do Freixo, com acessos muito precários e sem qualquer qualidade urbana”. Para o autarca, “preservar a Noêda tal como se encontra é sustentar o urbanismo dos pobrezinhos, que pode ser muito característico, mas que não garante as necessárias infra-estruturas urbanas.”
As declarações foram feitas na reunião pública do executivo desta segunda-feira, no seguimento de uma proposta de recomendação da CDU sobre a preservação daquela zona de Campanhã. A moção foi rejeitada, com votos favoráveis do PS e abstenção do BE.
Ilda Figueiredo deu voz a “preocupações” de moradores de Noêda, no seguimento da apresentação do plano de requalificação de Campanhã à boleia da alta velocidade. Por ali habitam ainda 30 famílias e sobrevivem duas associações: a Soalheira e a Terra Solta. Para a vereadora comunista, aquela zona da cidade é um dos últimos exemplos da preservação da ruralidade urbana – e isso deve ser mantido. Na proposta, enumera algum património, como “ruínas castrejas”, “um núcleo habitacional, uma escola e lavadouros” e também restos de um núcleo rural onde são visíveis “as eiras, as hortas, as levadas de água, as minas, os poços e os muros de pedra local revestidos com uma massa ancestral entre as pedras que as une ainda hoje”.
Rui Moreira preparou uma declaração de voto para sublinhar que nada do que a vereadora descreveu está em risco. “Estes elementos vão-se manter com a proposta do PUC [Plano de Urbanização de Campanhã] em elaboração”, garantiu.
Também as hortas urbanas, que Ilda Figueiredo sublinhou como elemento importante a preservar, não estarão em risco, garantiu o presidente da Câmara da Porto, avançando mesmo que está prevista uma “área verde, de características lúdico-produtivas, onde as hortas existentes são valorizadas e reforçadas”.
Quem não irá resistir às mudanças no território é a moagem Ceres. “Vai ter de ser deslocada, uma vez que este tipo de indústria, que implica, já neste momento, grandes movimentos de pesados pela frágil estrutura urbana existente, não é compatível com o preconizado para a zona”, apontou, garantindo que o assunto está a ser articulado com os proprietários da empresa.
Expropriações previstas
A CDU considera que, no estudo apresentado sobre o TGV, a nova Rua do Freixo cruza Noêda sem respeitar a ruralidade desta zona. Mas o executivo contesta, dizendo que esta artéria estava já contemplada no PDM de 2006 e mantém-se no de 2021 sem alterações. O que é inegável são as expropriações que serão necessárias. Quantas? “Ainda não estão contabilizadas, atendendo a que ainda não foi iniciado o projecto de execução da rua”, revelou Moreira.
Para os comunistas, a preservação dos núcleos rurais dentro da cidade é essencial e isso devia inspirar a criação de um “centro de estudos de ruralidades urbanas, em colaboração com as universidades”.
O Bloco de Esquerda, que esta segunda-feira foi representado por Pedro Figueiredo, aplaudiu a ideia de preservar a ruralidade, sublinhando, no entanto, a importância do TGV. Depois, pôs o dedo em feridas abertas naquele território, denunciando “alguma destruição de património a ocidente da Rua do Freixo”. Também pelas mãos do próprio município.
O lavadouro do Agra, ainda a uso pelas populações, foi “demolido incompreensivelmente ao abrigo do programa municipal Rua Direita”, os cerca de 400 apartamentos de luxo para o grupo previstos para a Central do Freixo, “que poderia muito bem, em teoria, ter um aproveitamento público e social”, e ainda as “zonas agrícolas e plátanos destruídos para apartamentos da Mota-Engil na chamada Quinta da China”, enumerou o vereador. Do executivo, ninguém quis comentar.
Rosário Gambôa, do PS, votou a favor da proposta da CDU, elogiando o “texto” que chama a atenção para aquela zona da cidade e a “pertinência” do centro de estudos das ruralidades. Já Alberto Machado, do PSD, apontou as “dores” de crescimento das freguesias mais periféricas, mas recusou alimentar mais análises e apelou à prática: “O tempo dos estudos está a concluir-se e o TGV é necessário.”