Qualidade do ar na Europa melhorou nas últimas duas décadas (mas continua a exceder limites)
Poluição atmosférica na Europa diminuiu nos últimos 20 anos, mas europeus continuam a respirar um ar pouco saudável, diz estudo. Portugueses expostos a excesso de poluentes mais de sete dias por ano.
A qualidade do ar que os europeus respiram tem vindo a melhorar ao longo dos últimos 20 anos. Se, por um lado, os níveis de partículas finas e dióxido de azoto decresceram entre 2003 e 2019, os de ozono aumentaram no Sul da Europa, incluindo Portugal, sugere um estudo publicado esta quarta-feira na revista científica Nature Communications.
“A nossa investigação revela boas e más notícias. A boa é que a qualidade do ar em toda a Europa melhorou consideravelmente nas últimas duas décadas. A má notícia é que, apesar dos progressos, a maioria dos europeus continua a respirar um ar pouco saudável. Isto é especialmente verdade no caso das PM2,5 e do ozono de superfície, que ainda se encontram acima dos limites recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS)”, explica ao PÚBLICO Zhao-Yue Chen, primeiro autor do estudo.
As PM2,5 consistem nas partículas finas com tamanho igual ou menor a 2,5 micrómetros que ficam suspensas no ar. Há ainda as PM10, cerca de quatro vezes maiores, que também são nocivas para a saúde. Além destes dois parâmetros, foram ainda analisados poluentes atmosféricos como o ozono e o dióxido de azoto (NO2).
Os cientistas analisaram concentrações diárias de PM2,5, PM10, dióxido de azoto e ozono no ambiente no período entre 2003 e 2019 em 1426 regiões de 35 países europeus, incluindo Portugal. A área considerada no estudo representa territórios onde circulam 543 milhões de pessoas. Para estimar e processar um volume de dados tão grande, a equipa teve de recorrer à utilização de machine learning.
Os cientistas verificaram que os níveis de PM10 diminuíram 2,72% anualmente nos países europeus. Já os de NO2 e PM2,5 caíram 2,45% e 1,72% respectivamente. Em contrapartida, os de ozono subiram 0,58% no Sul da Europa, levando a um aumento do número de dias por ano nos quais se respira “ar não limpo”.
O caso português
Em Portugal, o número de dias por ano em que o nível médio de poluentes excedeu os limites máximos estabelecidos pela OMS foi inferior a dez. No período entre 2003 e 2019, a exposição média a curto prazo para cada português foi de 9,6 dias para as PM2,5, 8,1 dias para o NO2, 7,2 dias para as PM10 e, por fim, 7 dias para o ozono. São valores baixos comparativamente com países como a Polónia ou a Sérvia.
Os polacos e os sérvios enfrentam 232,3 e 326,3 dias por ano nos quais os limites máximos de PM2,5 são excedidos, respectivamente. Já a Bélgica e Espanha ficam pelos 115,4 e 23,7 dias por ano no que toca àquele poluente atmosférico. Estas partículas, que têm origem na queima de combustíveis fósseis, estão associadas a mortes causadas por doenças cardíacas ou pulmonares.
“O nosso estudo revelou que mais de 90,16% e 82,55% da população europeia vivia em áreas com pelo menos quatro dias que excediam as orientações diárias da OMS para PM2,5 e ozono em 2019, respectivamente. Isso mostra a necessidade de regras mais rígidas”, defende Zhao-Yue Chen, investigador do Instituto de Saúde Global de Barcelona, numa resposta por email.
O ozono e a questão climática
Zhao-Yue Chen defende que é urgente “trabalhar para reduzir estes poluentes nocivos, em especial as PM2,5 e o ozono”, que têm um impacto comprovado na saúde humana. E recorda os desafios que as alterações climáticas colocam no que toca ao ozono.
“A mitigação das alterações climáticas não é uma questão separada da qualidade do ar. O aumento da radiação solar e das temperaturas pode impulsionar a formação de ozono. O ozono na baixa atmosfera actua como um gás com efeito de estufa, retendo o calor e contribuindo para o aquecimento global. A redução dos níveis de ozono pode ajudar a atenuar a sua influência neste ciclo”, refere o cientista. Apesar de o ozono na camada do ozono nos proteger da radiação ultravioleta solar, este ozono de superfície é poluente e pode ser letal para os humanos.
“Esta interacção complexa cria um ciclo nocivo, o que torna urgente a necessidade de abordar simultaneamente as alterações climáticas e a poluição atmosférica”, acrescenta o co-autor Ballester Claramunt, professor Instituto de Saúde Global de Barcelona, citado numa nota de imprensa da entidade.
Combinação de poluentes
O estudo também analisou o número de dias em que os limites para dois ou mais poluentes foram excedidos concomitantemente. Estima-se que 86,3% da população europeia tenha vivido pelo menos um dia por ano de ar impuro com dois ou mais poluentes. As combinações mais comuns no período estudado foram PM2,5 e NO2, além de PM2,5 e ozono.
“Surpreende-nos que ainda existam tantas populações ou regiões na Europa expostas a níveis de PM2,5 ou de ozono que excedem as directrizes diárias ou anuais da OMS, apesar de terem sido feitos progressos na qualidade do ar em geral. Pior ainda, a exposição da população aos níveis de ozono no Sul da Europa está mesmo a aumentar”, lamenta Zhao-Yue Chen.