Ventura ameaça chumbar OE. PSD desdramatiza e atira responsabilidades para o Chega
Presidente do Chega exigiu, em entrevista, ser ouvido na formação do Governo e no OE. Paulo Rangel, vice-presidente do PSD, sacode pressão e diz que o Chega “é livre de fazer o que entender”
Perante eventuais ameaças de um chumbo do próximo Orçamento do Estado por parte do Chega, o PSD está a colocar o ónus da decisão no partido de André Ventura. É a estratégia que a Aliança Democrática (AD) está a desenhar para lidar com as adversidades de um futuro Governo de maioria relativa.
A posição foi assumida esta segunda-feira à noite por Paulo Rangel, primeiro vice-presidente do PSD. “O Chega tem o mandato do povo para fazer o que entende. É livre. Pode apoiar ou não”, afirmou ontem à noite na CNN, depois de questionado sobre a intenção de André Ventura de votar contra um Orçamento de Estado caso não concorde com o teor da proposta ou até com a composição do Governo.
“A AD ganhou eleições e tem responsabilidades. O país não pode ficar sem Governo. Os diferentes partidos têm de assumir a sua responsabilidade”, disse, lembrando que, no Parlamento, “mesmo quando os partidos não têm um projecto comum não quer dizer que a propósito da lei A, da lei B, não possa haver uma convergência objectiva”.
Desdramatizando os futuros sentidos de voto no Parlamento, Paulo Rangel referiu ter ouvido André Ventura, numa entrevista à CNN na noite desta segunda-feira, ter assumido que, sem qualquer acordo com o PSD, votaria a favor de propostas da AD como a taxa máxima de IRS jovem ou a reposição do tempo de serviço dos professores.
O dirigente social-democrata reiterou a posição de princípio de não fazer coligação ou negociar apoio parlamentar com o Chega, o que foi reafirmado na noite de de domingo pelo líder da AD, Luís Montenegro.
Ventura quer decidir composição do Governo
Em entrevista à CNN, André Ventura afirmou primeiro que só iria decidir se apresenta uma moção de rejeição a um Governo liderado pelo PSD depois de ver o programa apresentado por Luís Montenegro. Mas no final da entrevista já dizia que não irá apresentar uma moção de rejeição, antecipando que “o ponto mais crítico desta negociação será por altura do orçamento”, seja rectificativo ou Orçamento do Estado para 2025.
Ventura assinalou o fim do "domínio de dois partidos", com "três grandes blocos", não deixando de sublinhar "uma grande maioria" à direita. Para o líder do Chega, o partido será inevitavelmente o "pilar" de um Governo liderado pelos sociais-democratas.
Questionado sobre se irá apresentar uma moção de rejeição ― que não deverá ter os votos de qualquer outra bancada parlamentar ―Ventura não se comprometeu com uma resposta clara, admitindo não apresentar qualquer moção. “Pode não ser apresentada. Depende do programa de Governo”. O líder do Chega prefere colocar os holofotes no Orçamento. “Preocupa-me como é que vão ser aprovadas medidas fundamentais”, atirou, acenando com um eventual voto contra. “Vou deixar já claro. Se não houver nenhuma negociação, isso é humilhar o Chega. E então eu votarei contra o Orçamento”, disse.
Para André Ventura, o país podia ter dado uma maioria à AD, mas optou por dar “a capacidade de criar essa maioria”. “O que estão a dizer é 'governem os dois e entendam-se'”, acrescentou. “Mas para isso é preciso negociar, para isso é preciso chegar à mesa da negociação, para isso é preciso ceder”, ressalvou o líder do Chega.
Quanto à integração do Chega (actualmente com 48 deputados), num Governo liderado por Luís Montenegro, Ventura considera que “não faz sentido um partido que tem mais de um milhão de votos” seja excluído de uma solução, exigindo um acordo de Governo que assegure a “convergência de decisões quanto à composição” e sobre “as medidas principais desse Governo”, falando no plural em relação “aos objectivos que queremos alcançar”.
Embora afirme que “pessoalmente” não exige estar no Governo, Ventura quer usar o poder da sua bancada para condicionar um executivo. “O que faz sentido numa composição de Governo é serem os dois partidos a decidirem quem o compõe, por isso é que é um acordo de Governo”, que decida, por exemplo “quem é o ministro das Finanças, quem é o ministro da Educação”, declarou.
“O CDS tem dois deputados. A Iniciativa Liberal tem 5% ou 4% dos votos. O Chega teve quase 20% dos votos. Tem mais de um milhão de votantes”, sublinhou, dizendo que seria uma “humilhação” para o Chega se a AD ignorasse “o peso relativo de cada partido”.
O líder do Chega afirmou que o Presidente da República “foi muito claro” ao dizer-lhe que “não se oporia a nenhuma presença do Chega no Governo, nem a qualquer tipo de convergência”.
Quanto ao que o Chega gostaria de levar para uma eventual mesa de negociações, Ventura fala na questão das forças de segurança, no aumento de pensões e a descida de impostos. Mas Ventura, que abanou a bandeira da corrupção durante toda a campanha, recusa alinhar numa reforma da Justiça.
PPM quer entendimento com o Chega
Numa altura em que se espera que o Presidente da República convide Luís Montenegro a formar Governo, na próxima semana, o terceiro partido da AD, o PPM, defendeu um entendimento com o Chega.
"Acho que o país precisava de estabilidade, o país, considero que está um bocado à deriva, sem objectivos e sem metas. (...) Portanto, eu acho que não fazia mal nenhum, às vezes, a gente andar um passo para trás para dar dois para a frente", defendeu Gonçalo da Câmara Pereira, em entrevista à Antena 1.
O líder do partido monárquico, que em 2019 concorreu às eleições europeias com o Chega, revelou que vai pedir uma reunião a Luís Montenegro para falar sobre o futuro Governo ainda esta terça-feira. Recorde-se que o PPM não elegeu nenhum deputado e não deverá ter força negocial para entrar num Governo.
"A mim não me assustava nada uma abertura ao Chega. O que não há dúvida nenhuma é que o povo português deu-lhe 40 deputados, não é para menosprezar", afirmou sobre os resultados das legislativas de domingo em que o partido liderado por André Ventura obteve 48 lugares no Parlamento. com Lusa