Marcelo apela ao voto com “atenção ao que se passa lá fora”, dos EUA à Ucrânia
Pela terceira vez em vésperas de legislativas, o Presidente da República falou ao país. Marcelo sublinhou o contexto de instabilidade internacional em que se realizam as eleições de domingo.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, apelou esta noite à participação nas eleições legislativas de domingo, declarando que "ninguém, pessoa ou instituição, pode substituir ou condicionar o sentido final da vontade popular", reconhecendo também que "é possível encontrar semelhanças entre o que dominou as eleições de 2022 e o que domina as eleições de 2024".
"Hoje, as três grandes preocupações são muito semelhantes às que dominaram 2022", considerou, duas delas "claramente expressas" e outra "tratada a meia voz." "As claramente expressas eram a recuperação de economia depois de dois anos de covid-19 e os efeitos dessa recuperação na vida das pessoas, em particular no seu poder de compra e na saúde, que tinha tido de adiar cuidados pela urgência do combate à pandemia", apontou.
Agora, as duas grandes preocupações voltam a ser "a urgência de acelerar a recuperação da economia, sacrificada pela guerra em 2022, reiniciada em 2023, mas agora à espera do que se passe no mundo e na Europa", e "os efeitos desse compasso de espera na saúde, na habitação, na educação, noutras áreas sociais — para os mais jovens, sobretudo o desemprego; para os menos jovens, sempre a garantia futura das pensões e das reformas", sublinhou.
A preocupação "quase silenciada ou falada a meia voz", "pensada por todos, mas falada por muito poucos", agora como há dois anos, "acaba por determinar tudo o mais": é "o que se passará lá fora, nas eleições americanas, nas eleições europeias, no que significarão para a guerra na Ucrânia, o Médio Oriente, as tensões no Mar Vermelho, a economia mundial — e novamente a subida dos preços e o custo dos juros", assinalou Marcelo, num discurso proferido a partir do Palácio de Belém.
"No fundo, aquilo que é decisivo para o arranque da economia, para a vida de todos, especialmente os mais pobres, os mais excluídos e os mais dependentes. Mas também para a defesa nacional, a segurança e outras instituições soberanas como a justiça. Em tempos de guerra e de insegurança, olhar também para estas áreas mais expostas ao ambiente vivido e aqueles de que os portugueses esperam mais certeza e previsibilidade, é muito importante", afirmou.
"Portugueses, em tempos assim, nos quais as guerras vieram lançar guerras económicas e sociais, que esperaríamos ultrapassadas pelo fim da pandemia, é nesses tempos que importa mais votar", apelou o Presidente da República. "Mesmo para aqueles que nos últimos meses não prestaram atenção ao que se passa lá fora, até porque já vivem suficientemente apreensivos com o seu dia-a-dia, é nesses instantes que mais importa votar. Tal como para os muitos que se afastaram, que se cansaram e desiludiram, é em momentos mais graves como estes que mais importa votar", sublinhou.
"Só o vosso voto é a palavra final"
O Presidente recordou ainda as efemérides que se assinalam neste ano de múltiplas eleições: a Revolução dos Cravos há meio século e, no ano seguinte, a realização do primeiro voto directo em democracia por mulheres e homens a partir dos 18 anos. "Fecha-se um ciclo de meio século da nossa história. Abre-se outro, com novos desafios, novas exigências e novas ambições, mas sempre com os mesmos valores: democracia, liberdade e igualdade. Porque os tempos são mesmo muito difíceis lá fora e, por isso, cá dentro", destacou o chefe de Estado.
Em tempos assim, "baixar os braços é sempre a pior solução", alertou Marcelo: "Porque um voto desperdiçado, quando mais fazia falta, nunca é compensado por outro voto mais tarde, porque o tempo não pára e muito menos volta para trás. Porque só o vosso voto decide, só o vosso voto escolhe, só o vosso voto é a palavra final. Não é a vontade de mais ninguém: é a vossa vontade, é o vosso voto".
"Por tudo isto, e ainda por ser este o momento de dar nova vida em estabilidade e segurança, à nossa liberdade, igualdade e democracia, apelo ao vosso voto. A pensar no vosso futuro, no futuro dos vossos filhos dos vossos netos, a pensar no futuro de Portugal", concluiu o chefe de Estado.
O terceiro discurso em véspera de legislativas
Este é já o terceiro discurso do Presidente da República ao país em vésperas de eleições legislativas. Em 2022, Marcelo disse que as eleições desse ano eram "verdadeiramente diferentes", por serem as primeiras em pandemia e as primeiras a ocorrer antecipadamente, em tempos de democracia, por rejeição de um Orçamento do Estado. Além disso, disse o chefe de Estado, as eleições de então trouxeram à tona o "relevo do voto antecipado", a "reponderação do dia de reflexão" e a confirmação da "falta de uma lei de emergência sanitária", numa altura de audiências "sem precedente" dos debates e entrevistas aos candidatos.
"Confirmámos, numa época de emoção incontida, mesmo em democracias mais antigas, [um] evidente civismo, efectivo respeito pela diversidade, e até calorosa solidariedade, em situações e episódios mais sensíveis", elogiou a 29 de Janeiro de 2022 o chefe de Estado: "Numa palavra, nelas, confirmámos o apego de todos nós à democracia, que é o regime da liberdade, do pluralismo, da aceitação do outro e dos outros".
O Presidente da República, que desta vez votou antecipadamente, no fim-de-semana passado, assegurava há dois anos que, no dia seguinte ao discurso, a 30 de Janeiro de 2022, iria às urnas para dizer o que pensava "sobre os próximos anos para Portugal" — anos que seriam "de saída de uma penosa pandemia, de urgente reconstrução da economia, da sociedade, do ambiente, da vida das pessoas, de difíceis desafios europeus e de tensão mundial como já não existia há quase 20 anos".
Num apelo ao voto, que vem repetir este sábado, Marcelo Rebelo de Sousa argumentava então que "votar é também uma maneira de dizermos que estamos vivos e bem vivos, e que nada, nem ninguém, cala a nossa voz". Há dois anos, no entanto, e ainda numa fase activa da pandemia, garantia aos mais receosos que, apesar da covid-19, a ida às urnas podia acontecer "sem temores, nem inibições", "em consciência e em segurança", a "pensar em Portugal".
Em 2019, o discurso do chefe de Estado coincidiu com o feriado de 5 de Outubro. Horas depois das celebrações da Implantação da República, Marcelo dirigiu-se aos portugueses e sublinhou que "não votar é entregar a outros uma decisão que é nossa": "Por convicção, por confiança, por rejeição, por realismo, por exclusão de partes – seja qual for a razão do vosso voto, não deixem de votar amanhã", apelou na altura.
O Presidente da República afirmava então que "os sinais económicos e políticos preocupantes, no mundo e na Europa, são hoje mais claros do que em Maio [de 2019]", quando Marcelo Rebelo de Sousa também fez um apelo à ida às urnas no âmbito das eleições europeias. Numa altura em que o país já se debatia com temas como a quebra da natalidade, as alterações climáticas, o combate à pobreza e a busca por um melhor sistema educacional e de saúde, o Presidente considerava que "pedir aos portugueses que votem parece justo e mesmo urgente".