Lucy criou centenas de páginas na Wikipédia sobre mulheres “esquecidas”

Escreveu sobre a vida de 532 mulheres que até então eram desconhecidas para muitos. Agora que terminou a tarefa, quer que mais pessoas façam o mesmo.

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Lucy Moore escreveu biografias sobre mais de 500 mulheres Lucy Moore/Twitter
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Lucy Moore divide-se entre a arqueologia, a curadoria e ser cuidadora informal — mas, mesmo assim, encontrou tempo para criar uma página agregadora na Wikipédia com centenas de biografias de mulheres esquecidas pela História cujas histórias quis contar.

Começou em 2019, a partir do sofá da sua casa em Leeds, no Reino Unido, e só terminou na semana passada. No total, escreveu as biografias de 532 mulheres, incluindo artistas, cientistas, activistas, escritoras, poetisas, rainhas e rostos que ficaram conhecidos em fotografias. Shabat Gula, a menina refugiada de olhos verdes do retrato Afghan Girl ("menina afegã", em tradução livre), de 1984, é uma delas.

Em entrevista ao Guardian, a arqueóloga disse, apesar de ter um percurso diferente do destas mulheres, tem muita coisa em comum com elas: “Acho isso muito tranquilizante. Posso mergulhar numa coisa que é totalmente diferente do meu dia-a-dia”, afirmou.

Decidiu escrever sobre elas porque percebeu que são mais as páginas na Wikipédia sobre homens, como jogadores de futebol, do que sobre mulheres. Neste momento, revelou ao mesmo jornal, menos de 20% das biografias em inglês são sobre mulheres, número que, apesar de pequeno, subiu desde 2014, quando era apenas 16%.

As páginas que Lucy escreveu, como qualquer uma da Wikipédia, são editáveis por qualquer pessoa. Ainda não teve muito feedback, mas por enquanto “ninguém disse nada de desagradável no Twitter”, por isso, assume que é positivo.

Na página principal está uma lista de todos os países do mundo, seguidas do nome das mulheres que neles viveram. Diz ter descoberto muitas mais, mas foi escrevendo sobre as que mais interesse lhe suscitavam.

Nos Estados Unidos incluiu Julia Chinn, uma mulher negra que foi casada com o nono vice-presidente do país, Richard Mentor Johnson, e que era, ao mesmo tempo, uma das escravas da família do marido.

“É uma pessoa muito interessante e fiquei bastante surpreendida por ninguém ter escrito sobre ela antes.” O casal teve duas filhas que foram reconhecidas por Richard. O político também tratava Julia como esposa apesar de o casamento inter-racial ser proibido no século XIX. Contudo, lê-se no texto de Lucy, nunca conseguiu que a mulher fosse libertada e deixasse de ser propriedade da família.

Em Portugal, a arqueóloga só descobriu um nome: Snu Abecassis, a fundadora da editora Dom Quixote em 1965 (conhecida por publicar obras que iam contra a vontade do regime salazarista) e que morreu num acidente de avião, em 1980, onde também seguia o na altura primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro.

A Wikipédia exige três fontes confiáveis para cada pessoa, o que dificultou o trabalho de Lucy, que nem sempre conseguiu encontrar referências sobre o percurso de vida das mulheres em jornais — especialmente se viveram ou vivem países onde ainda têm poucos direitos.

Agora que o trabalho está feito, quer que outros que lhe sigam o exemplo e escrevam mais biografias sobre mulheres: “Precisamos de ter mais mulheres a editar [páginas da Wikipédia], mas não é assim tão simples”, defende, citando os estudos que mostram que as mulheres têm menos tempo para se dedicarem a actividades de que gostam.

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