O Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, definiu-se como sionista durante uma conversa na televisão norte-americana NBC esta semana. “Não é preciso ser judeu para ser sionista. Eu sou sionista. Se não existir Israel, não haverá um único judeu seguro no mundo”, afirmou.
Não é a primeira vez que o Presidente norte-americano se define assim. Biden sempre foi um grande defensor de Israel, repetindo várias vezes a importância de uma visita que fez ao Estado hebraico em 1973 e a conversa que teve com a então primeira-ministra, Golda Meir. Há quem veja esta defesa também como fruto da sua geração: Biden conheceu Israel como um país frágil e ameaçado por todos os vizinhos; uma geração mais jovem vê um país forte a controlar e ocupar outro povo.
No fundo, o que Biden quis dizer é que apoia a existência do Estado de Israel.
No seu livro A mais Breve História de Israel e da Palestina (Ed. Ideias de Ler), o historiador Michael Scott-Baumann diz que “o sionismo é a crença em que os judeus representam uma comunidade nacional e têm direito ao seu Estado independente próprio”.
No presente, há quem use a definição passando da ideia do movimento internacional para a criação de uma nação para os judeus (que tem um marco na proposta do judeu secular Theodor Herzl n'O Estado Judaico, de 1896) para significar apoio ao actual Estado de Israel.
Para os palestinianos, o sionismo significou a criação de um Estado de Israel num território que era habitado por eles, e cujas forças expulsaram cerca de 750 mil palestinianos (ainda de acordo com Scott-Baumann) na altura em que foi criado o Estado de Israel, em 1948.
Um regime colonialista?
O historiador Rashid Khalidi sublinhou, numa entrevista ao PÚBLICO, que “alguns dos primeiros líderes do movimento sionista disseram isso: ‘O nosso objectivo é transformar a terra da Palestina na terra de Israel’”.
Assim, para Khalidi, o sionismo implicou um regime colonial de povoamento, “que Israel começou por ser e que ainda é”, já que, como outros regimes, “tem regimes jurídicos diferentes para a população indígena e para os colonos”, os palestinianos e os israelitas, argumenta.
Recentemente tem havido uma tendência de fazer equivaler as críticas ao sionismo ao anti-semitismo, que tem como base uma definição da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA, sigla em inglês), feita em 2016, e que considera anti-semita “aplicar um critério diferente a Israel ou esperar do país um comportamento diferente do esperado de outros países democráticos”.
Esta definição leva a que seja possível dizer que o Tribunal Penal Internacional abrir uma investigação a potenciais crimes israelitas (e palestinianos) é anti-semita; ou que uma organização não governamental de monitorização dos colonatos judaicos que diga que em Israel e nos territórios ocupados há “um regime de apartheid” é também anti-semita.
A definição é polémica e há um grupo de académicos, a grande maioria judeus, a propor uma definição alternativa, justamente com espaço para permitir críticas a Israel.
Ultra-ortodoxos que são anti-sionistas
Se Joe Biden disse que não é preciso ser judeu para ser sionista — o que é verdade —, também é certo que nem todos os judeus são sionistas.
Já desde a emergência do movimento sionista, no tempo de Herzl, que houve (e ainda há) oposição à criação de um Estado judaico da parte de judeus religiosos ultra-ortodoxos, para quem o Estado só deveria ser criado após a chegada do Messias.
Por outro lado, se muitos judeus de esquerda, mais velhos, podem ser críticos da viragem à direita dos últimos anos em Israel, mas continuam a achar a existência do país essencial para a vida judaica, muitos judeus mais jovens estão cada vez mais ligados aos movimentos anti-racismo e anticolonialismo e menos centrados na ideia de Israel como garante da vida judaica no mundo, escreve o New York Times num artigo recente sobre o anti-sionismo e o anti-semitismo.
A associação americana Anti-Defamation League argumenta, ainda, que muitas críticas ao Estado de Israel são feitas frequentemente com linguagem anti-semita (acusando os israelitas de comportamentos associados a preconceitos antigos sobre judeus, por exemplo de ganância, sede de sangue ou poder) e alega que, muitas vezes, o uso de “sionistas” em vez de “judeus” é apenas um modo de fazer críticas de modo mais aceitável.
Por outro lado, há ainda quem seja pró-Israel e anti-semita, como algumas figuras da direita extrema e radical na Europa, como o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, pró-Israel, mas que leva a cabo uma campanha anti-semita contra George Soros, ou, anteriormente, Geert Wilders, dos Países Baixos, que mostrava anti-semitismo, mas via em Israel um aliado contra uma ameaça comum, que, para ele, era o islão.