A “arca de Noé” das sementes faz 16 anos: lá guarda-se trigo e feijão-frade portugueses

Esta semana, o cofre-forte do Árctico recebeu sementes de novos depositantes da Indonésia e do Quénia. Em Junho, vai voltar a receber de Portugal.

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Banco Português de Germoplasma Vegetal, em Braga, também enviou sementes para o Cofre-Forte de Sementes Global de Svalbard Nelson Garrido
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No Árctico, há um cofre-forte construído para preservar culturas agrícolas e salvaguardá-las do perigo da extinção. Esta semana, chegaram ao Cofre-Forte de Sementes Global de Svalbard, na Noruega, sementes de novos contribuidores, como do Quénia ou da Indonésia. Essas amostras juntam-se às muitas já enviadas por Portugal nos últimos anos, como as de trigo ou de feijão-frade.

Lançado em 2008, o banco mundial de sementes está localizado no arquipélago de Svalbard, na Noruega, a pouco mais de mil quilómetros do pólo Norte, e a sua origem surge de um esforço para proteger espécies vegetais da guerra, de doenças ou das alterações climáticas. Neste cofre-forte estão sementes duplicadas de bancos de sementes de todo o mundo, ou seja, existem nos bancos nacionais ou regionais e em Svalbard. Completa este ano o seu 16.º aniversário.

Este cofre-forte já mostrou a sua grande utilidade quando, entre 2015 e 2019, contribuiu para a reconstituição de colecções de sementes devastadas durante a guerra na Síria.

Nesta terça-feira, “depositantes” deste banco transportaram caixas de sementes para a entrada do cofre, uma estrutura alongada que se destaca numa encosta coberta de neve. Esses contribuidores representavam 23 bancos de sementes, sendo que nove deles estavam a depositar sementes pela primeira vez no cofre-forte de Svalbard — este é o maior número de novos membros a guardarem sementes de uma só vez, de acordo com a Crop Trust, a organização internacional que gere este banco, em conjunto com o ministério norueguês da agricultura e alimentação e o NordGen — Centro de Recursos Genéticos Nórdicos, com sede na Suécia.

Pela primeira vez, foram enviadas para Svalbard sementes de bancos da Bósnia e Herzegovina, Camarões, Indonésia, Quénia, Madagáscar, Nigéria e da Zâmbia. Os depósitos contêm culturas de feijões, cevada, milho, arroz, milhete ou sorgo. Muitas destas amostras estão incluídas num projecto global ligado à biodiversidade, o Bold, que foi desenvolvido para assegurar a segurança alimentar mundial.

“A preservação da diversidade genética neste cofre-forte do Árctico assegura a resiliência das culturas, garantindo assim a segurança alimentar das próximas gerações”, afirma Stefan Schmitz, director-executivo da Crop Trust.

Milhares de sementes portuguesas

Com estes últimos depósitos, já são 111 os bancos de sementes de 77 países que têm sementes guardadas em Svalbard, refere o Ministério norueguês da Agricultura e Alimentação. O banco mundial abre à volta de três vezes por ano e o envio tem de ser feito com vários dias de antecedência. Em algumas dessas vezes, o cofre-forte abriu para dar entrada a sementes portuguesas.

Desde 2018 que o Banco Português de Germoplasma Vegetal — uma “arca de Noé” das sementes portuguesa — contribui com sementes para o cofre de Svalbard. Actualmente, estão conservados no Cofre-Forte de Sementes Global de Svalbard 1054 acessos — o que inclui milhares de sementes, de acordo com Ana Maria Barata, coordenadora do Banco Português de Germoplasma Vegetal, em Braga. Um acesso corresponde ao número que uma amostra recebe quando entra no banco, ou seja, é o número da conta. Cada acesso tem, pelo menos, 500 sementes.

Portugal tem em Svalbard sementes duplicadas (isto é, irmãs de outras que estão em Braga) de quatro culturas: 787 acessos de milho, 92 acessos de trigo, 161 acessos de feijão comum e 14 acessos de feijão-frade. “Um novo lote de duplicados de sementes com 501 acessos está a ser preparado para ser enviado ao Cofre-Forte de Sementes Global de Svalbard em 2024, o que inclui 71 de cevada, 299 de milho e 131 de centeio”, indica Ana Maria Barata. Esse envio deverá ocorrer em Junho.

Além dos envios regulares de sementes, Portugal participa num projecto para estudar a longevidade das sementes conservadas em Svalbard. Também está num outro trabalho, com algumas variedades de milho que foram multiplicadas durante três anos consecutivos e deram entrada em Svalbard em três anos consecutivos, para que seja avaliada a sua taxa de germinação e se perceba a sua conservação por um período de 100 anos.

“Portugal está seriamente envolvido nesta missão de duplicar material em Svalbard”, nota Ana Maria Barata ao PÚBLICO. “É uma missão nacional!”