Migrações. Políticas da UE negam segurança e protecção e promovem violência
Médicos sem Fronteiras denunciam casos de violência contra migrantes em países da UE como Polónia, Grécia, Bulgária e Hungria. Organização acusa países europeus de negarem segurança a refugiados.
As políticas da União Europeia (UE) dentro e além das suas fronteiras negam segurança e protecção aos refugiados e migrantes, promovendo também violência sistemática, denuncia um relatório da organização não governamental Médicos sem Fronteiras (MSF).
“Morte, desespero e indigência: os custos humanos das políticas de migração da UE ilustram uma adopção chocante de tácticas violentas, sancionadas pelas políticas da UE e pelos Estados-membros da UE, e encorajadas pela retórica política cada vez mais desumanizante dos líderes europeus”, sublinhou esta ONG, em comunicado.
O relatório da MSF contém detalhes das “consequências angustiantes da crise política da Europa nas suas fronteiras e além-delas”, através de relatos em primeira mão de pessoal médico e pacientes, de mais de 20 mil consultas médicas, de saúde mental e de emergência nas fronteiras da UE e de mais de 8400 pessoas resgatadas no mar em 2023.
“A decisão de permitir e promover políticas de violência e privação contra refugiados e migrantes, em vez de procurar soluções políticas humanas, deveria chocar a consciência colectiva”, realçou Julien Buha Collette, líder da equipa operacional de MSF.
A MSF sublinhou, na nota de imprensa, que desde a chamada “crise migratória” de 2015 tem apelado à UE para que assuma “a responsabilidade na resposta às necessidades urgentes de assistência e protecção para migrantes e refugiados”, apontando que tem registado uma degradação nestas políticas.
“Longe de melhorar, a normalização da violência contra refugiados e migrantes criou raízes, com investimentos significativos das instituições da UE em países terceiros, como o Níger e a Líbia, onde as pessoas são frequentemente bloqueadas ou para onde são encaminhadas à força, e confrontadas com tratamento desumano”, denunciou esta organização.
A ONG apontou como exemplo a guarda costeira líbia, que “intercepta rotineiramente pessoas no mar e as leva para centros de detenção na Líbia”. “As equipas dos MSF trabalharam em alguns desses centros de detenção, de 2016 a 2023, onde testemunharam e documentaram condições de vida deploráveis, permitindo a fácil propagação de doenças transmissíveis”, sublinhou.
Este organismo referiu ainda como “padrões semelhantes de violência terceirizada” por parte da UE situações no Níger, Sérvia e Tunísia. A organização garantiu que “esta violência também é clara e bem documentada dentro das fronteiras da UE”, alertando para “retrocessos em países como Polónia, Grécia, Bulgária e Hungria”.
“Com mais de 2000 quilómetros de muros fronteiriços e vedações concebidos para manter as pessoas fora da UE, muitas vezes cobertos com arame farpado e reforçados por câmaras de vigilância e drones”, a arquitectura física das políticas de dissuasão da UE “causa lesões”, salientou a ONG, apontando situações nas fronteiras polaco-bielorrussa e servo-húngara.
Além das barreiras físicas, as autoridades de aplicação da lei actuam com “resistência violenta contra aqueles que procuram segurança, incluindo tratamento degradante, que resultam em lesões físicas e perturbações de stress pós-traumático”.
A MSF vincou que em Palermo, Itália, entre os 57 pacientes assistidos entre Janeiro e Agosto de 2023, 61% relataram ter sido torturados na Líbia, enquanto 58% relataram ter sido submetidos a tortura num centro de detenção.
Os Estados-membros da UE são também acusados de se “retiraram da sua obrigação de prestar assistência às pessoas em perigo no mar”. “A externalização das responsabilidades de salvamento para guardas costeiras de países terceiros e a cessação da capacidade europeia de busca e salvamento no Mediterrâneo tornaram os naufrágios e as mortes evitáveis quase tragédias diárias no Mediterrâneo Central”, sublinhou ainda a MSF.