Seca: quatro câmaras do Algarve não vão aumentar preço da água

A câmara de Portimão, socialista, “para já”, também, não vai agravar as tarifas. Os aumentos, que podem chegar aos 50%, são justificados pela seca. “É sempre o mesmo a pagar”, diz a Câmara de Silves.

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O que tem chovido não é suficiente para afastar a ameaça da seca Rui Gaudencio
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Os aumentos de 15% a 50% no preço da água no Algarve, previstos num pacote de 42 medidas aprovadas pelo Governo, não vão ser aplicados em, pelo menos, quatro municípios. A decisão, em princípio, teria sido consensualizada no seio da Comunidade Intermunicipal do Algarve – Amal mas a seguir vieram as divergências.

Os três municípios sociais-democratas — Faro, Albufeira e Castro Marim — entendem que a seca em que região mergulhou não deve servir de pretexto para sobrecarregar os consumidores. No mesmo sentido, a Câmara de Silves, da CDU, foi a primeira a declarar: “Não pode ser sempre o mesmo a pagar”.

Da parte dos autarcas socialistas começam também a surgir algumas reservas. “Para já, não vamos aplicar [subida das tarifas]”, afirmou ao PÚBLICO a autarca da Câmara de Portimão, Isilda Gomes, defendendo acreditar que “vai haver uma consciência colectiva para a poupança”, sem necessidade de agravar os preços

As chuvas da última semana, informou a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), permitiram um reforço nas seis barragens da região de 14,2 hm3, quase tanto como a produção da prevista dessalinizadora, que é 16 hm3. As barragens do Algarve estão com um volume de água armazenada de 33%. Comparado com o mesmo período do ano passado, existem menos 54 hm3 disponíveis. O Algarve gasta, em média, 75 hm3 no consumo doméstico.

Assim, no curto prazo, resta o corte dos consumos que as obras para a central de dessalinização, no valor de 240 milhões de euros previstos no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), não se fazem de um dia para o outro. Nem resolvem o problema de toda a região. Sem colocar causa a importância dessa infra-estrutura no litoral, o presidente da Câmara de Alcoutim, Osvaldo Gonçalves, lembra as necessidades do interior. “Temos que ter maior capacidade de armazenamento na bacia hidrográfica do Guadiana”. A barragem da Foupana, defende, “é imprescindível para a sustentabilidade da região”.

A Resolução do Conselho de Ministros sobre a seca, publicada nesta terça-feira, determina que são necessárias “medidas e acções extraordinárias que promovam uma maior eficiência, poupança e racionalização das reservas de água”, obrigando a que haja uma redução de 15% nos gastos do consumo urbano, onde se inclui o sector turístico. “Não podemos controlar o tempo que turista está debaixo do chuveiro”, argumenta o presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), Helder Martins, embora reconheça a necessidade de “imediatas medidas de poupança”. Por isso, o Turismo de Portugal vai ter um milhão de euros de apoio para lançar campanhas a chamar a atenção dos visitantes para a “situação particularmente critica” em que o Algarve se encontra.

Uma das medidas preconizadas é o aumento do preço da água. A presidente do Município de Portimão, que é também vice-presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, diz: “Já adoptámos as medidas necessárias para ver se conseguimos poupar os tais 15%. Para já, não vamos aumentar tarifas, mas os nossos consumidores têm que nos ajudar, também, a poupar”. Para isso, anuncia uma campanha de sensibilização, através de outdoors espalhados pela cidade. As fontes urbanas, exemplifica, só funcionam 15 minutos de manhã e igual período na parte da tarde para evitar colagem dos motores. “Vamos reduzir as regas ao mínimo possível”, acrescenta.

Em Silves, também não se irá aumentar preços. Porque, entre 2022 e 2023, já “reduzimos em 12% os consumos públicos e continuamos a investir para cumprir as metas que nos foram propostas”, diz a presidente da Câmara de Silves, Rosa Palma. O segundo escalão, justifica, é aquele que abrange o maior número de famílias. “Não vamos agravar mais a situação difícil das pessoas com um aumento de 15%”, que poderá chegar aos 50%.

O autarca de Castro Marim, Francisco Amaral, por seu lado, declara: “Não é justo cobrar à população um erro do Governo: a falta de investimento para tornar a região mais resiliente à seca”. Já o presidente do Município de Faro apresenta outro argumento: “Não vou aumentar tarifas porque já tenho a água mais cara do Algarve”. Isto deve-se ao facto da tabela em vigor reflectir os custos operacionais levados a cabo pela empresa municipal Fagar. O que o leva a apontar que “há algumas câmaras que não transferem para os munícipes o verdadeiro custo da água”.

"Não vou aplicar novos aumentos, porque objectivamente não se traduzem em poupança de água", afirma José Carlos Rolo, autarca de Albufeira. O que vai ser criado, diz, é "um sistema de controlo interno para monitorizar as gastos, principalmente dos grandes consumidores". Em simultâneo garante que vai cortar na rega dos espaços verdes. <_o3a_p>

O autarca de Alcoutim, vice-presidente da Amal, estranha a mudança de atitude dos colegas: “Tínhamos consensualizado os aumentos”, enfatizou, reconhecendo que a CDU foi a excepção.

Dos golfes aos jardins

A resolução do Conselho de Ministros propõe uma redução de pressão de água na rede, bem como a suspensão de utilização de água potável para regar espaços verdes ou jardins públicos. Já no que diz respeito aos espaços relvados dos empreendimentos turísticos e vivendas particulares, estabelece-se a “proibição da utilização de água da rede pública ou da água potável extraída de outras origens de água natural”. A excepção vai para a necessidade de “assegurar a sobrevivência de árvores de carácter singular ou monumental”.

A recomendação do Governo é que os espaços verdes sejam regados a partir das estações de tratamento de águas residuais (ETAR) mas, de acordo com as Águas do Algarve, os efluentes tratados apenas regam 3,4% dos espaços verdes.

Também os campos de golfe vão sofrer um corte de 18% na rega com água proveniente das barragens em relação ao ano passado. A recomendação é que passem a utilizar as águas residuais tratadas mas, nesse caso, o custo passa dos actuais 13 cêntimos/m3 para 24 cêntimos.

A lavagem dos carros, com água da rede, também fica proibida entre 1 de Junho e 30 de Setembro.

Chegar ao fim do Verão sem rupturas no abastecimento é o objectivo das medidas preconizadas pela APA, a entidade que fará a monitorização, de forma periódica, das reservas disponíveis. Se as medidas aprovadas em Conselho de Ministros não se revelaram eficazes, depois de uma reavaliação em Junho, o Governo admite “medidas adicionais mais gravosas”, podendo chegar à situação de vir a ser declarada situação de “emergência ambiental”. Nesse cenário, a empresa Águas do Algarve poderá socorrer-se da utilização de águas superficiais ou subterrâneas, “pertencentes a entidades públicas ou privadas”, para garantir o abastecimento doméstico.