Deep Rising: estreia-se em Portugal documentário que alerta para a exploração das profundezas dos oceanos
Com a narração de Jason Momoa, o documentário Deep Rising traz à superfície os perigos da exploração dos recursos do fundo marinho. A estreia em Portugal é neste sábado na Casa do Comum, em Lisboa.
O mote do documentário Deep Rising é lançado por John F. Kennedy (1917-1963): “Os mares que nos rodeiam representam os nossos recursos mais valiosos.” Nesta intervenção filmada em 1963, o então Presidente dos Estados Unidos mencionava como era determinante uma acção conjunta para defender os oceanos e como eram cruciais os esforços científicos.
A voz de Kennedy é seguida pela de Jason Momoa. Num tom misterioso e intenso, o actor vai desvendando os objectivos do documentário: “O que está debaixo da superfície sempre ficou muito tempo fora do nosso olhar e, no geral, fora da nossa mente.” À medida que Momoa narra o documentário, vão aparecendo imagens de seres das profundezas do oceano, desde os mais gelatinosos aos mais fluorescentes.
O narrador relembra como, cada vez mais, os laços da humanidade e do fundo oceânico estão a ficar mais estreitos. “A quem pertence realmente o oceano profundo? E quem deve beneficiar mais dele? Pode ele salvar-nos da crise climática?”, questiona Momoa.
O documentário Deep Rising é isso mesmo: um documentário de 85 minutos que questiona e mostra a beleza das profundezas dos oceanos paralelamente à destruição que os humanos estão a fazer do planeta quando extraem demasiados recursos. O documentário estreia-se neste sábado (17 de Fevereiro) em Portugal, na Casa do Comum, no Bairro Alto (Lisboa), às 21h30. No final, haverá uma conversa com Ricardo Serrão Santos, investigador da Universidade dos Açores, que foi ministro do Mar, a convite da associação Sciaena, da ANP/WWF Portugal e da Aliança Oceânica Sustentável (Sustainable Ocean Alliance). A entrada no evento é livre.
O realizador Matthieu Rytz diz ao PÚBLICO que o grande objectivo deste documentário é trazer à superfície os tesouros naturais dos fundos dos oceanos. “O significado do Deep Rising está na sua capacidade em desvendar tesouros escondidos do oceano profundo e, simultaneamente, expor a tragédia que se pode enfrentar, estando ele nas mãos de quem tem como prioridade os lucros em vez do frágil equilíbrio ecológico do nosso planeta”, afirma.
A certa altura, no documentário, Jason Momoa indica a imensidão do que não sabemos sobre o fundo oceânico. “O maior espaço vital da Terra está no oceano profundo. Mais de 95% da biosfera da Terra é formada pelas profundezas marinhas e sabemos muito pouco sobre elas”, informa o actor norte-americano, que é embaixador das Nações Unidas para a vida marinha. É esse mundo inexplorado que Matthieu Rytz diz querer mostrar no documentário.
Ao mesmo tempo alerta para a destruição que se estará a causar quando se explora estes habitats marinhos prístinos em nome da designada “revolução verde”. “O Deep Rising defende que não nos podemos dar ao luxo de extrair mais recursos para termos mais produção de energia e que devemos procurar outros métodos de energia renovável que não envolvam uma extracção destrutiva”, avisa o realizador canadiano.
Um planeta em colapso
Ao longo do documentário, são várias as indicações à mineração em mar profundo. Assiste-se a momentos de discussão na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar ou sobre o caminho de Gerard Barron, director-executivo da empresa The Metals Company, para conseguir explorar o fundo do oceano Pacífico para os recursos daí retirados serem usados na produção de energia. Há ainda a explicação de um cientista, Sandor Mulsow, que mostra como no solo do deserto do Atacama um dia esteve um oceano.
Mas nem só o oceano é abordado no documentário. A certo momento, aparecem imagens de florestas devastadas na Indonésia, nas Filipinas, no Congo, no Chile, na China ou no Zimbabué. Em toda essa desflorestação há um ponto em comum: a exploração de recursos para a produção de energia, tal como já se tinha indicado para o oceano. A propósito dessas imagens, aparece uma voz da consciência, a de Jason Momoa, que também é produtor executivo do filme, para dizer: “O nosso sistema planetário está em colapso. Os humanos transformaram-se num superorganismo consumidor de energia.”
O mesmo alerta é deixado por Matthieu Rytz ao PÚBLICO, que destaca a importância da interligação entre todos os sistemas terrestres. “A maioria dos ecossistemas está prestes a entrar em colapso e alguns deles, infelizmente, já passaram o ponto de não retorno”, assinala, referindo a importância dos oceanos como um dos grandes reservatórios de carbono da Terra, que trabalha em conjunto com outros sistemas terrestres. “O Deep Rising é um filme que chama a atenção para as ligações planetárias e as suas vulnerabilidades. Infelizmente, parece que os humanos perderam o conhecimento dessa interligação vital.”
O grande desejo de Matthieu Rytz é que as pessoas façam uma pausa nas suas vidas para ouvirem o “murmúrio das profundezas do oceano” no seu documentário. “Estamos a causar a sexta extinção em massa da vida na Terra e, como tal, é urgente voltarmos a pensar na nossa ligação ao oceano, bem como nos métodos que usamos para extrair os recursos que são finitos”, alerta o realizador.
A ligação de Matthieu Rytz ao tema da mineração no fundo oceânico aconteceu após um outro trabalho que realizou, o documentário Anote’s Ark, que relata as alterações climáticas no Kiribati. Em 2018, a própria administração do Kiribati o alertou para os perigos da mineração nas profundezas oceânicas. Foi aí que decidiu avisar mais pessoas para esses riscos.
Agora, o realizador considera que o Deep Rising é único. “Este documentário dá um grande relevo à questão da mineração no fundo oceânico e à complexidade das profundezas do oceano”, afirma, indicando que será o primeiro desse género, que tenha conhecimento. “Além disso, tem cenas nunca antes vistas da beleza dos ecossistemas das profundezas do oceano.”