Na serra da Lousã, veados ajudam a dispersar sementes de espécies nativas

Tese de doutoramento comprova que cada veado pode dispersar mais de seis mil sementes por dia. A população deve ser vigiada, de forma a não impactar negativamente os ecossistemas.

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Nas 265 amostras de excrementos recolhidas, não foram encontradas sementes de espécies invasoras Reuters/TOBY MELVILLE
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Um projecto de doutoramento da Universidade de Coimbra concluiu que os veados assumem um papel na dispersão de sementes de espécies nativas arbustivas pelo território, podendo cada animal dispersar mais de seis mil sementes por dia.

A tese de doutoramento, realizada por Fernanda Garcia, investigadora do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra, procurou analisar os impactos dos veados na Serra da Lousã, reintroduzidos no território entre 1995 e 2004. Defendida em Dezembro, a tese apresenta como uma das principais conclusões a forma como os veados assumem um papel importante na dispersão de sementes de espécies nativas de arbustos e herbáceas por toda a serra da Lousã.

Importava ainda perceber se os veados também dispersavam sementes de espécies exóticas, como as acácias ou os eucaliptos, que estão cada vez mais presentes na serra da Lousã. "Sendo o veado uma espécie que tem uma área vital muito grande, que percorre quilómetros e quilómetros por dia, era importante perceber se dispersavam [sementes] invasoras ou não", disse Fernanda Garcia à agência Lusa.

Nesse sentido, a investigadora recolheu 265 amostras de excrementos de veados, recolhidas na Serra da Lousã ao longo de cerca de um ano. "Registámos 3403 sementes e não encontrámos sequer uma semente de invasora", notou. Apesar disso, Fernanda Garcia constatou que os veados "comem acácia", apesar de não ser a sua espécie favorita, levantando a hipótese de estes animais mastigarem as sementes de acácia, por terem alguma dimensão, em vez de as engolirem inteiras.

Se esta hipótese se confirmar, o contributo dos veados para a conservação dos ecossistemas da Serra da Lousã será ainda mais positivo, “porque não só não dispersariam sementes como as destruiriam", notou, salientando que "as acácias têm um gigante banco de sementes". Segundo Fernanda Garcia, nas sementes recolhidas, foram encontradas 21 espécies diferentes de herbáceas e arbustos que fazem parte de matos "nativos e característicos de zonas mediterrânicas".

No seu projecto de investigação, estimou que cada indivíduo pode dispersar mais de seis mil sementes por dia, uma vez que o veado tem uma taxa de defecação de 25 vezes por dia. A maioria das fezes analisadas continha, pelo menos, uma semente. Destas sementes analisadas e recolhidas, 48 delas acabaram por germinar.

Apesar de uma relação baixa entre a quantidade de sementes dispersada e aquelas que poderão germinar, a população de veados na serra da Lousã, face à estimativa da sua densidade, terá capacidade para dispersar mais de três milhões de sementes por dia, conclui a investigadora.

Para além deste impacto positivo na dispersão de sementes de espécies nativas, Fernanda Garcia mostrou também que os níveis de densidade de veados na serra da Lousã estão num nível intermédio e, portanto, não têm um aparente impacto negativo na compactação do solo, registando-se uma média de 8,9 indivíduos por quilómetro quadrado, nos 60 pontos de amostragem analisados, na zona central da serra.

O estudo conclui também que, face à densidade existente na serra da Lousã, há um equilíbrio entre as plantas presentes naquele território e os veados, não existindo "uma alteração ao nível dos atributos das plantas". Segundo Fernanda Garcia, "não foi identificado nenhum impacto negativo" no decorrer da tese, que realça os serviços que os veados prestam ao ecossistema onde estão inseridos.

No entanto, a investigadora salientou que parte desse contributo positivo está também relacionado com uma "densidade intermédia" da população, sendo necessário acompanhar a evolução e a dinâmica da população de veados na serra da Lousã, já que "densidades muito elevadas poderão ter efeitos negativos".